SÃO PAULO, SP, E RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Morreu nesta quarta-feira (23) ao 88 anos Francisco Dornelles (PP), que foi senador, ministro e vice-governador do Rio de Janeiro. Ele estava internado no Hospital Pró-Cardíaco, em Botafogo, zona sul da capital fluminense. A informação foi confirmada pelo secretário da Saúde do estado, Dr. Luizinho.
Dornelles foi personagem central dos últimos dias do regime militar e dos primeiros da redemocratização do país.
Mesmo antes da confirmação oficial, sua escolha para o Ministério da Fazenda, no primeiro governo civil do país em 21 anos, motivava protestos e discursos no início de 1985 contra o risco de continuísmo da então batizada Nova República.
O PMDB, que chegava ao poder, fazia chegar aos jornais a avaliação de que Dornelles significava a permanência da política monetarista do superministro Delfim Netto. Para o posto eram sugeridos nomes como o do desenvolvimentista José Serra.
O partido fazia a primeira das muitas rebeliões por cargos que se tornaram sua marca registrada.
Dornelles não completou seis meses no cargo.
Sua trajetória, até ali e desde então, ilustra ascensões, quedas e adaptações do pensamento conservador a um ambiente político frequentemente hostil, apesar dos contornos ideológicos nem sempre nítidos.
Sobrinho de Tancredo Neves, Francisco Oswaldo Neves Dornelles nasceu em Belo Horizonte, no ano de 1935. Seu pai era primo de Getúlio (Dornelles) Vargas. O tio Ernesto Dornelles foi governador do Rio Grande do Sul, senador e ministro. O primo Aécio Neves, hoje deputado federal pelo PSDB, foi governador e senador mineiro.
A vida política era, portanto, uma opção natural. Aos 27 anos, porém, Dornelles trocou uma candidatura a deputado estadual em Minas por uma bolsa para estudar finanças públicas na França; em seguida, especializou-se em tributação internacional em Harvard, EUA.
Essa formação o credenciaria para uma das carreiras mais bem-sucedidas entre os tecnocratas forjados pela ditadura militar.
Depois de ingressar nos quadros da Fazenda pelas mãos de Delfim, assumiu o comando da Receita Federal em 1979. Naquele ano, uma campanha publicitária atribuiu pela primeira vez a imagem do leão ao fisco.
Ao longo de seis anos no cargo, o próprio Dornelles passou a ser associado ao apelido. Eram tempos em que as alíquotas do IR chegavam a 55%, o dobro do teto atual.
Foi mantido na Receita até o fim do regime autoritário, apesar do apoio declarado à candidatura vitoriosa da oposição. Após a morte do eleito Tancredo, a queda de Dornelles abriu caminho para o Plano Cruzado e a sucessão de pacotes heterodoxos fracassados do governo José Sarney.
A carreira política começou pelo antigo PFL e a vaga de deputado constituinte em 1986 pelo Rio. Presidiu a comissão encarregada do capítulo tributário da Constituição, mas foi voto vencido na defesa de teses liberais.
Já no PPB, hoje PP, Dornelles voltou ao centro das atenções em 1996, quando sua nomeação para o Ministério da Indústria e Comércio selou a apoio do partido ao presidente Fernando Henrique Cardoso, seu adversário nos tempos de Constituinte.
No segundo mandato de FHC, passou para a pasta do Trabalho, sob protesto do sindicalismo ligado ao PT.
Em 2006, venceu uma improvável eleição para o Senado, depois que Jandira Feghali (PC do B) foi ligada à defesa do aborto. Como a oponente, se manteve na base de apoio a Lula e Dilma Rousseff.
Em 2014, se elegeu vice na chapa de Luiz Fernando Pezão (então PMDB) ao Governo do Rio de Janeiro. Assumiu o comando do estado com a prisão do titular nas últimas semanas de mandato, em 2018.
Dornelles governou interinamente o Rio de Janeiro duas vezes. A primeira foi de março a outubro de 2016, quando substitui Luiz Fernando Pezão (MDB), então chefe do Executivo estadual, que se licenciou do cargo para tratar de um câncer.
Foi nesta época que decretou estado de calamidade pública no Rio de Janeiro, medida até então inédita na história fluminense. A decisão possibilitou que o Rio recebesse ajuda federal em meio à crise econômica enfrentada pelo estado.
Depois, assumiu o Palácio Guanabara no final de novembro de 2018, quando Pezão foi preso na Operação Lava Jato. Dornelles ficou pouco mais de um mês no cargo, até a posse do sucessor, Wilson Witzel (PSC).
O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) elogiou a trajetória política do ex-ministro. “Recebi com pesar a notícia de falecimento do ex-governador, ex-senador e ex-ministro, Francisco Dornelles, que teve uma longa trajetória no serviço público, inclusive como ministro da Indústria e Comércio, do presidente FHC.”
Eduardo Paes (PSD), atual prefeito do Rio, lamentou a morte do ex-governador, a quem chamou de “uma das figuras mais importantes da política brasileira dos anos 60 até hoje”.
“Tive a honra de receber seu apoio em várias eleições e, muito especialmente, ter tido a sorte de ouvir seus conselhos e causos. Nos últimos 20 anos não fiz um movimento sequer em minha trajetória política sem ouvi-lo antes”, escreveu Paes no Twitter.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), correligionário de Dornelles, disse que o colega de sigla foi “referência política nacional e um exemplo de homem que fazia a Política maior”. O ex-governador interino também foi homenageado nas redes pelos senadores Romário (PL-RJ) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP).
Romário escreveu que Dornelles “atuou vividamente em defesa dos interesses do estado fluminense em Brasília”. Randolfe, por sua vez, ressaltou os parentes políticos do ex-governador: “Sua trajetória faz jus aos parentes, Tancredo e Getúlio”.
O ex-prefeito do Rio e atual vereador Cesar Maia (PSD) chamou o ex-governador interino de um “grande homem público”.
“Faleceu hoje o deputado, ministro, senador, vice-governador e governador do RJ, enfim, o grande homem público Francisco Dornelles. Registro aqui minha tristeza com a perda de um homem desse valor, um grande brasileiro”, disse Maia.
GUSTAVO PATU E CAMILA ZARUR / Folhapress