Mortes de mero, o peixe gigante, deixam biólogos em alerta no litoral paulista

SANTOS, SP (FOLHAPRESS) – As mortes de pelo menos 18 peixes da espécie mero no litoral paulista, entre o fim do inverno e o dia 10 de outubro, já na primavera, são alvo de investigação por biólogos especialistas no animal, que é ameaçado de extinção e tem a pesca é proibida no Brasil desde 2002.

Os casos recentes chegaram ao conhecimento do Projeto Meros do Brasil, iniciativa que, há duas décadas, pesquisa e preserva os “gigantes dos mares” ou “rei das pedras”. Eles são assim conhecidos por conta do porte avantajado, de até 400 quilos e três metros de comprimento.

“Recebemos relatos de diferentes pessoas a respeito de mortes dos meros nesta região de São Paulo em proporção que é fora do padrão. Nessa época do ano, o comum seria de quatro a cinco”, diz o biólogo e gerente de pesquisas do projeto, Matheus Oliveira Freitas, 44.

A situação deu início a uma apuração que leva em conta fotos, testemunhas e episódios compartilhados por pescadores.

Pesquisadores parceiros também colaboram. Freitas lembra que, durante o inverno, a temperatura abaixo dos 13°C a 25 metros de profundidade já costuma causar mortes de meros, mas não nessa quantidade. “Estamos estudando a correlação de temperatura com a mortandade relatada nas últimas semanas”, conta.

Os casos foram observados em Santos, Guarujá, Iguape e Peruíbe (litoral sul), além de Ubatuba (litoral norte). Um desses meros foi encontrado morto em 28 de setembro, na praia do Rio Verde, em Iguape, pelos biólogos Ed Ventura, 50, e Carlos Campos, 45.

“Já estava começando a entrar em decomposição”, descreve Ventura. “Foi a primeira vez que vi um mero, infelizmente, morto. Chegamos a pensar que era um golfinho.”

O biólogo passou seu celular para Campos que, por sua vez, fotografou o peixe ao lado do colega para dar uma ideia da dimensão do exemplar. “Tenho 1,81 metro de altura. Era o tamanho dele ou um pouco mais. E devia pesar uns 250 quilos.”

Campos conta que o achado da carcaça se deu por acaso. “A gente estava fazendo uma busca num local próximo para uma outra pesquisa e vimos de longe uma aglomeração de urubus na praia. Também foi a primeira vez que vi um mero. Depois desse encontro, eu fiquei sabendo de outros registros do tipo no litoral paulista”, lembra.

Na tarde de 10 de outubro, Ventura voltou a se deparar com outro mero morto, desta vez, na praia do Guaraú, em Peruíbe, cidade onde mora e mantém o Instituto Bioventura —voltado à conservação da mata atlântica.

“Novamente, em decomposição. Esse não era grande. Devia ter uns 50 quilos e um metro e meio. Um jovem adulto”, relata.

“Esses peixes estão aparecendo boiando, e a maré vai levando”, constata o pescador Roney Peterson, 51, que relata o encontro de meros já mortos, na baía de Santos, em 8 e 10 de outubro. “Existe uma frequência de óbitos. Alguma coisa está mudando a temperatura da água”, comenta.

Há ainda um episódio recente de mero flagrado numa embarcação em São Vicente, na divisa com Santos, em 24 de julho. O condutor foi autuado pela 5ª Companhia de Polícia Militar Ambiental Marítima em R$ 7.200.

O biólogo Eric Comin, 45, lembra que o mero é um peixe dócil, o que tende a facilitar a atuação ilegal de pescadores.

Para Rodrigo Martins, professor e oceanógrafo do Instituto do Mar da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) na Baixada Santista, as baixas temperaturas parecem ser a explicação para a mortandade.

“Minha hipótese é que algum fenômeno oceanográfico tenha baixado muito a temperatura das águas costeiras. O mero é uma espécie de distribuição tropical/subtropical e não está adaptado à baixas temperaturas”, diz.

“A literatura reporta que o limite térmico inferior para a espécie é de 15°C. Uma exposição crônica a temperaturas iguais ou próximas disso certamente deve provocar mortalidade. Como foram muitos casos em pouco tempo, acredito que essa seja uma hipótese razoável.”

Martins observa ainda que dados de satélite para a costa paulista de agosto a setembro mostram que a média da temperatura superficial do mar esteve entre 18°C e 15°C, “o que comprova que a temperatura da água estava perto do limite de tolerância térmico inferior para a espécie”.

Procurada, a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) afirmou não ter detectado nenhuma contaminação no mar que pudesse ter causado as mortes.

Quem encontrar um peixe da espécie mero já morto deve evitar contato direto com o animal em decomposição, além de acionar a prefeitura de seu município para recolhimento e descarte. Para catalogação e posterior apuração, o episódio também pode ser relatado ao Projeto Meros do Brasil pelo telefone (21) 99644-7157.

JOÃO PEDRO FEZA / Folhapress

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