‘Motel Destino’, de Karim Aïnouz, vai bem, mas carece de sensualidade

FOLHAPRESS – O melhor final de um filme de Karim Aïnouz, que eu me lembre, é o de “Praia do Futuro”, com motos se afastando enquanto uma bruma carregada toma a tela. O futuro era nebuloso, era mistério.

É assim que começa “Motel Destino”, com a vida do jovem Heraldo, vivido por Iago Xavier, sendo virada pelo avesso. O desejo de sair do Ceará e vir para São Paulo é cheio de problemas. A patroa avisa que ele lhe deve dinheiro. Ele não tem. Inventa que lhe mandará assim que tiver. Ela propõe outra solução: ele e o irmão devem servir como guarda-costas para um sujeito que anda bem ameaçado. Heraldo topa.

À noite, encontra uma garota atraente e disponível e a leva para o motel. É quando seu destino parece desandar: a mulher some levando seu dinheiro e a chave do quarto em que estão. Sair de lá sem dinheiro para pagar a conta é um problema que não se resolve rápido.

Quando se resolve e ele vai ao trabalho combinado, encontra a polícia, a ambulância, o IML, todo mundo lá, no caminho. Não demora muito a constatar que seu irmão morreu, morte violenta, enquanto fazia sozinho o trabalho que deveria fazer com Heraldo a seu lado.

O rapaz tem ao menos dois problemas ao mesmo tempo. E são óbvios: a culpa pela morte do irmão e uma patroa disposta a acabar com ele. A solução é encontrar um refúgio seguro. O Motel Destino lhe parece um bom lugar.

Essa primeira parte do filme se resolve com uma direção ágil e muito segura, anunciando e de certa forma já atirando o protagonista e os espectadores nessa aventura. Sabemos que a vida do rapaz não é fácil e continuará difícil. Como?

Aceitemos todas as sugestões contidas nesse belo título: o destino e o Motel Destino têm tudo a ver um com o outro. O começo do trabalho no motel é um momento de alívio. Ele se mostra hábil em pequenos serviços e logo se transforma de hóspede incômodo em funcionário exemplar, admirado tanto por Dayana, interpretada por Nataly Rocha, a patroa, como por seu marido, Elias, vivido por Fabio Assunção.

Esse segundo momento será marcado pela capacidade de Aïnouz de criar uma ambientação forte e adequada. O motel é um lugar misterioso, onde as pessoas se encontram para atividades íntimas, sexuais em geral, mas seus bastidores podem ser interessantes: vários dos clientes têm lá suas particularidades. Como diz Dayana, tem gente com gosto para tudo, até ser esquartejada.

Aqui, Ainouz cria o clima de mistério e suspense adequado a uma situação em que, entre outras, um cliente é assassinado —pior: o finado é o mesmo sujeito que, no início, Heraldo deveria proteger. Resumindo, Elias e o novo funcionário têm de enterrá-lo num terreno baldio.

Elias não quer a polícia por perto, e seu argumento é forte: isso seria muito ruim para os negócios. Mas a partir de então percebemos que também ele representa algum perigo. Nossa impressão sobre ele se transforma em pouco tempo. Atrás do bom sujeito —nem tão bom, mas, enfim, conveniente— há um cara com temperamento agressivo e, pior, impositivo, em especial quando está bêbado.

O filme vai muito bem, em suma, seja pela ação, seja pela ambientação. O terço final, no entanto, sofre, pois gira em torno de um triângulo amoroso clássico, com marido, mulher e amante, sem grande variação em relação àquilo que já se viu às pencas, desde que o cinema é cinema.

Falta-lhe a sensualidade estonteante de, digamos, “O Nono Mandamento”, de Richard Quine, lançado em 1960, ou a dor incontornável de “A Cadela”, de Jean Renoir, de 1931, ou “Almas Perversas”, de Fritz Lang, de 1945. São hipóteses, apenas. Maneira de dizer que as soluções, até aqui vivas, tornam-se subitamente empalhadas, banais.

A filmagem continua sensível, os atores respondem bem às situações, mas as situações é que soam já vistas, de maneira que, apesar de tudo, o filme tende a interessar bem menos no final. E filme que começa mal e termina bem, o espectador pode perdoar. Quando começa muito bem e termina fraco, o início é que acaba sendo esquecido. Aqui, a impressão final não apaga o todo, mas embaça.

Motel Destino

Avaliação Bom

Onde Nos cinemas

Classificação 18 anos

Elenco Com Fábio Assunção, Nataly Rocha e Iago Xavier

Direção Karim Aïnouz

INÁCIO ARAUJO / Folhapress

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