SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As mudanças climáticas agravaram em 40% as condições de seca, calor e vento no pantanal que levam aos incêndios recorde que assolam o bioma neste ano, aponta estudo divulgado nesta quinta-feira (8).
A pesquisa, realizada pela rede internacional de cientistas WWA (World Weather Attribution), concluiu também que as alterações no clima causadas pelas ações humanas aumentaram de quatro a cinco vezes as chances de ocorrerem no pantanal as queimadas catastróficas de junho, mês utilizado para a análise.
A Folha esteve em Corumbá (MS), em junho, enquanto a cidade se preparava para comemorar as festas juninas, cercada de fogo e fumaça. Um vídeo da celebração do Arraial do Banho de São João com labaredas queimando a vegetação ao fundo viralizou à época.
De acordo com Filippe Lemos Maia Santos, cientista brasileiro que participou do estudo, os incêndios massivos estão se tornando a nova realidade do bioma. A área alagada, característica da região, está diminuindo, diz ele, à medida que as temperaturas aumentam, tornando a vegetação mais seca e inflamável.
“Esses fatores combinados criaram condições perfeitas para o incêndio florestais de grandes proporções, pois a vegetação seca se torna altamente inflamável e as condições meteorológicas são favoráveis à propagação rápida das chamas”, afirma Santos.
A temporada de seca ainda não chegou no seu auge, por isso a situação crítica pode se manter nos próximos meses, ressaltam os pesquisadores. Tradicionalmente, o pico das queimadas no pantanal ocorre em setembro, mas, em 2024, a temporada de fogo está antecipada.
“A temporada atual de incêndios no pantanal geralmente ocorre entre julho e novembro e está frequentemente associada a ignições humanas. Segundo nossos estudos, somente 1% dos incêndios florestais são associados a raio”, frisa Santos.
Para frear os efeitos das mudanças climáticas, os cientistas destacam a urgência da substituição dos combustíveis fósseis por energia renovável, além reduzir o desmatamento e reforçar as proibições de queimadas controladas para enfrentar o impacto dos incêndios florestais, que afetam comunidades indígenas e agricultores.
A atribuição climática busca determinar a influência do aquecimento global em eventos climáticos extremos. O grupo WWA é pioneiro nesse campo, realizando estudos rápidos com a participação de cientistas globais. Primeiro, é verificado se o evento foi extremo comparado a registros históricos.
Depois, os cientistas usam um método revisado por pares para comparar cenários “com e sem” a influência humana no aquecimento global.
Eventos extremos fazem parte da variabilidade climática natural e sempre têm várias causas. Mas é possível montar modelos porque se sabe a quantidade exata de gases de efeito estufa que foram jogados na atmosfera pelas atividades humanas (principalmente, pela queima de combustíveis fósseis e pelo desmatamento) desde a Revolução Industrial.
Assim, basta criar um cenário com e outro sem essa variável e verificar a frequência e a intensidade com que aquele evento extremo ocorre em cada um deles. Como a única diferença entre os dois é o aumento da temperatura, pode-se apontar o tamanho da culpa das mudanças climáticas em cada caso.
Antes das mudanças climáticas que já deixaram o mundo ao menos 1,2°C mais quente em relação à era pré-industrial, as condições de clima para incêndios observadas em junho eram extremamente raras esperadas apenas cerca de uma vez a cada 161 anos.
Agora são quase cinco vezes mais prováveis, estimadas para ocorrer cerca de uma vez a cada 35 anos. Se o aquecimento global alcançar 2°C, como é previsto por estudiosos, condições semelhantes de clima para incêndios em junho se tornarão 17% mais intensas e ocorrerão em média cerca de uma vez a cada 18 anos.
“À medida que as emissões de combustíveis fósseis aquecem o clima, o pântano está esquentando, secando e se transformando em um barril de pólvora. Isso significa que pequenos incêndios podem rapidamente se transformar em devastadores”, explica a pesquisadora Clair Barnes, do Instituto Grantham do Imperial College de Londres.
Os incêndios no pantanal começaram no fim de maio, mais cedo que o normal, aponta WWA, após uma temporada de chuvas extremamente fraca.
De janeiro até esta terça-feira (6), o bioma registrou 6.655 de focos de calor, o que representa um aumento de 1.973% comparado com o mesmo período do ano passado, que teve 321, de acordo com o programa BDQueimadas, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
O acumulado atual supera também o de 2020, que somou 5.466 focos em sua temporada até agosto. O ano é considerado o mais crítico da história, quando teve 30% do total do bioma consumido pelo fogo.
Em relatório mais recente, o MMA (Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas) informou que a área queimada no pantanal, neste ano, é na faixa de 1.027.075 a 1.245.175 hectares, cerca de 6,8% a 8,3% do território total do bioma. A análise foi feita com dados do Laboratório de Aplicação de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Lasa/UFRJ).
JORGE ABREU / Folhapress