SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A nova mudança de endereço da cracolândia tem alterado a vida de quem mora e trabalha na região da estação da Luz, no centro de São Paulo –esta semana, a concentração de usuários de drogas passou a ocupar uma rua vizinha ao terminal.
Devido à presença dos novos vizinhos, a CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) fechou os acessos para a rua Mauá, exatamente a via que os dependentes químicos passaram a ocupar. Com isso, não é mais possível atravessar por dentro da estação.
A Prefeitura de São Paulo diz que a concentração de usuários químicos possui uma dinâmica própria, e que não direciona o grupo para uma rua. Frequentadores da cracolândia, porém, afirmaram à reportagem que são conduzidos diariamente por guardas-civis metropolitanos para determinados pontos.
Segundo os dependentes químicos, eles são remanejados para a Mauá entre 17h e 18h, e permanecem na rua até por volta das 6h, quando são novamente direcionados para a rua dos Protestantes, onde passam o dia. Essa dinâmica começou na terça (7), e vem se repetindo diariamente.
Por volta das 14h desta quinta (9), o grupo estava aglomerado na rua dos Protestantes, que fica a 250 metros da Mauá. Durante a tarde, houve uma ação da Polícia Civil e da GCM em busca de traficantes no local.
Lojistas da rua Mauá confirmaram que recebem avisos da polícia e da guarda momentos antes da chegada dos usuários.
Um casal de comerciantes afirmou que viu seus fregueses sumirem desde a noite de terça-feira (7), quando os primeiros usuários chegaram ao local. A proprietária, uma mulher de 42 anos, disse que o período de almoço, antes cheio, agora está vazio, sem qualquer movimento.
Ela se queixou de não conseguir dinheiro até mesmo para pagar a carne comprada. Seu marido afirmou que para ele, a região central da cidade acabou.
Por conta da presença dos usuários, o restaurante tem fechado mais cedo, por volta das 16h e não mais às 22h. O serviço de janta foi temporariamente suspenso.
A região onde fica a estação e o parque da Luz são uma área conhecida de prostituição, mas as garotas de programa que trabalham no local afirmaram que também sentiram o efeito da migração da cracolândia.
Antes, elas podiam cruzar por dentro da estação até chegar a hotéis que ficam na Mauá. Mas com os acessos fechados, agora precisam dar a volta pela rua.
Uma delas disse à reportagem que a mudança espantou os clientes, já que eles têm medo de andar pela na região. Outra garota de programa disse que o fechamento dos acessos e um transtorno. Ela também reclamou do sumiço dos clientes.
Além dos profissionais que atuam no entorno da estação, os passageiros que estavam na estação da Luz e tentavam acessar a rua Mauá se mostraram surpresos e indignados com a situação.
“Isso é um absurdo. Não é normal. Esses caras da cracolândia não têm condição de fazer isso tudo. A gente não é bobo”, disse o pedreiro Alderico Almeida, 68. Ele tentava chegar até a rua General Osório, onde pretendia comprar uma peça para a sua moto.
O desempregado Rogério Freitas, 45, não viu problemas na permanência dos usuários na rua, mas sim na ausência de comunicação por parte da CPTM. “Não tem um aviso. Ontem tive que pagar uma condução para passar para o outro lado [acessando a linha amarela do metrô]. Tive que passar por dentro.
A migração dos usuários para a rua Mauá aconteceu dias depois de a região da Santa Ifigênia voltar a registrar tensão entre comerciantes e usuários depois de um breve período de calmaria. Antes da mudança, o principal ponto de concentração era no cruzamento da rua dos Gusmões com a avenida Rio Branco, a 600 metros do novo ponto e vizinho da tradicional via de comércio eletrônico do centro.
Na noite do dia 1°, dependentes químicos saquearam uma loja especializada em conserto e venda de acessórios para celulares localizada na rua Santa Ifigênia.
De acordo com a comerciante Ângela Aparecida Alves de Oliveira, 44, esposa do proprietário da loja, foram furtados cerca de 20 celulares e um notebook de clientes, além de máquinas utilizadas para o reparo dos produtos.
“Quero terminar as aulas da minha filha para ir embora. Aqui já deu tudo o que tinha que dar. Não quero mais ficar aqui. Não sei como vamos viver. Estamos nos levantando pela segunda vez. Eu acabei de sair de uma cirurgia. Eu sou da Bahia e meu esposo é da Bolívia. Ainda não sei para qual dos dois lugares vamos mudar”, disse ela.
Momentos antes do furto, um dependente químico havia sido atingido por uma bala de borracha. A vítima procurou um comerciante e relatou ter sido baleado por um guarda-civil metropolitano na rua dos Gusmões.
Na noite de terça-feira (7), foi registrado um outro tumulto. Usuários de drogas atearam fogo em sacos de lixo e bloquearam por alguns minutos a avenida Rio Branco.
Policiais militares estiveram no local por volta das 23h e dispersaram o grupo com uso de bombas. Dependentes químicos relataram que a ação foi motivada após problemas na liberação das refeições que eles recebem diariamente.
PAULO EDUARDO DIAS / Folhapress