SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Não ter com quem ir pode ser um impeditivo para algumas mulheres na hora de decidir viajar. Além da falta de companhia, também pesam o medo de passar por situações como assédio e assalto em uma cidade desconhecida. Para não deixarem de fazer o passeio, elas têm buscado agências especializadas no público feminino. Assim, além da viagem, ainda conhecem outras mulheres na mesma situação e fazem novas amizades.
Tamires de Souza Pires, 34, psicóloga, estava incomodada por ter que viajar com a família ou o companheiro, de quem estava se separando, e tinha medo de viajar sozinha. Resolveu, então, embarcar para Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, com a agência Viaja Guria, em julho do ano passado.
“Eu me senti muito acolhida”, diz Tamires. “Recomendo muito que as mulheres tenham essa experiência de viajar sozinha. É uma sensação de liberdade, de independência, de conquista, de eu posso tudo”, afirma.
Desde então, fez três viagens com a agência e costuma encontrar as colegas do passeio para happy hours.
Letticia Gerhardt, fundadora da empresa, conta que as mulheres têm várias motivações para buscar uma agência do tipo: saída de divórcio, maior independência, novas amizades e segurança ao viajarem solo. Durante a viagem, as guias fazem dinâmicas de integração para que as passageiras se conectem. “A pessoa sai de casa sozinha, mas não permanece sozinha”, diz Gerhardt.
Patrícia Fialho Lucrécio, 51, funcionária pública, queria conhecer o Jalapão, no Tocantins, mas não tinha companhia e não sabia como acessar as atrações do parque estadual. Dentre os medos de viajar sozinha, ela menciona assédio, fechar viagem com uma empresa com a qual não possa contar, assalto e passar mal e não ser atendida.
Ela conta que que pesquisou bastante e conheceu a agência Woman Trip. Agora, está combinando a próxima viagem com amigas que conheceu no Jalapão. “No primeiro dia de viagem a gente já cria uma conexão”, diz. “Era a primeira vez de todo mundo viajando sozinha.”
Planejar um roteiro seguro é um trabalho artesanal, diz Dandara Degon, da agência Woman Trip. Muitas vezes, ela e sua irmã, Larissa Degon, com quem fundou a empresa, testam antes os destinos e conversam com a população local. Também pegam dicas da sua própria comunidade.
Por meio das redes sociais e mensagens, viajantes da empresa votam em novos destinos, alertam sobre onde não se sentiram seguras e pedem sugestões para viagens por fora da agência. “A pandemia foi o momento que mais deixou claro esse senso de comunidade”, diz Larissa.
Um levantamento feito pela Maxmilhas aponta que 6% das reservas na plataforma em 2023 foram feitas por mulheres viajando sozinhas. Mais de 94% delas viajaram pelo Brasil, com São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro no top 3 destinos nacionais entre 2020 e 2023. Entre os internacionais, estavam Lisboa, em Portugal, Buenos Aires, na Argentina e Roma, na Itália.
Gilsimara Caresia vê sua agência, GirlsGo Viagens para Mulheres, como um trampolim para viagens solo: “eu perco cliente e não estou nem aí”, disse. Para ela, viajar sozinha é sinal de liberdade financeira e emocional.
A empresa faz viagens para lugares como Índia, Marrocos e Egito, países que as clientes dizem ter mais medo de irem sozinhas.
“Tem a percepção de que uma mulher sozinha não está segura e a gente presencia isso na prática: um assédio, mais vulnerabilidade a assalto e violência”, diz Caresia. “Mas eu, que moro em São Paulo e já viajei mais de cem países, consigo listar uma infinidade de lugares em que me senti muito mais segura do que saindo aqui no meu bairro”, afirma.
Pâmela Lemos, fundadora da agência Surferinhas “só queria juntar mulheres para surfar” quando fundou a empresa em 2017. Foram 110 viagens e 30 bate-voltas desde então. Diz que o mar é um ambiente perigoso, e que é importante ter companhia na hora do surfe.
Além disso, quando entrou no esporte há 20 anos, ela não se sentiu acolhida pelo ambiente das pranchas. Não tinha referências próximas de professoras ou colegas mulheres. Criou a agência para mudar esse cenário.
O grupo de mensagens das surfistas “mais presentes” da Surferinhas tem hoje cerca de 200 pessoas. Elas fazem viagens nacionais e internacionais. O público varia de 22 a 50 anos, mas “a minha avó já fez aula”, diz Lemos.
ISABELA ROCHA / Folhapress