Nasa tentará lançar missão a misterioso asteroide metálico

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Nasa pretende começar nesta quinta-feira (12), com mais de um ano de atraso, a missão Psyche, primeira da agência espacial americana a ser destinada a um asteroide metálico —algo que os cientistas imaginam como o mais próximo que se pode chegar de realizar uma viagem ao centro da própria Terra.

A espaçonave será lançada a partir do Centro Espacial Kennedy, na Flórida (EUA), por um foguete Falcon Heavy, com decolagem marcada para as 11h16 (pelo horário de Brasília), em uma janela instantânea de lançamento —o que significa que, se algo impedir a partida no horário marcado, uma nova tentativa só poderá ser feita no dia seguinte. Oportunidades se estendem até o dia 25.

Selecionada em 2017 pelo programa Discovery, promovido pela Nasa para selecionar missões de baixo custo comandadas por um cientista, a Psyche originalmente voaria no ano passado, mas problemas com testes do sistema de controle de voo impediram o cumprimento do cronograma.

Foi com certa amargura que a agência espacial promoveu o adiamento. Embora resultasse em apenas um ano de atraso no lançamento em si, o movimento adicionaria três anos de viagem até o destino final. Se partisse em 2022, a nave chegaria ao asteroide Psique, localizado no cinturão entre Marte e Júpiter, em 2026. Agora, só poderá atingir o alvo em 2029.

São as agruras da mecânica celeste. A trajetória escolhida para a sonda envolve um sobrevoo de Marte, a fim de usar a gravidade do planeta como um estilingue para propeli-la até a órbita de Psique. Só que as posições relativas de Terra e Marte mudam bastante de um ano para outro, e com a nova data de lançamento o encontro só vai acontecer em maio de 2026. Com isso, se tudo correr bem, a missão deve chegar a Psique em agosto de 2029.

UM OBJETO PECULIAR

O asteroide Psique foi o 16º descoberto no cinturão de asteroides, em 1852, pelo astrônomo italiano Annibale de Gasparis. Com um formato irregular e 280 km de diâmetro em seu eixo maior, ele é um dos grandes objetos do tipo no Sistema Solar. E tem uma peculiaridade: é bem mais denso que a média dos asteroides e tem entre 30% e 60% de sua composição em metais.

De acordo com algumas estimativas, se pudesse ser explorado, ele valeria 10 quintilhões de dólares em ferro, níquel e outros materiais preciosos. Claro, esse número não faz muito sentido, primeiro porque trazer essa imensa quantidade de metais para a Terra derrubaria seu preço de mercado, e segundo porque não há tecnologia disponível para minerar nem mesmo asteroides próximos, que dirá aqueles no cinturão entre Marte e Júpiter.

“Não, a Nasa não está minerando asteroides”, explica Lindy Elkins-Tanton, líder da missão e pesquisadora da Universidade Estadual do Arizona (ASU) em Tempe. “O que a Nasa está fazendo é ciência fundamental, missões de pesquisa que vão a asteroides e tentam aprender mais sobre eles. E elas vão ajudar quaisquer esforços futuros de minerar asteroides.”

Por ora, o principal foco é explorar esses objetos para entender como os planetas se formaram. Nesse contexto, Psique surge com destaque especial.

Sabemos que os asteroides são em geral remanescentes do processo de formação planetária —em essência os tijolos que sobraram do nascimento da Terra e dos demais planetas da família solar, formados em um disco de gás e poeira que gerou objetos progenitores conhecidos como planetesimais.

A composição inusual do Psique, contudo, sugere algo mais: ele pode muito bem ser o núcleo exposto de um planetesimal, com sua grande concentração de metais. A ideia é que ele tenha sido atingido por muitos impactos —o que deve ter sido comum na época de formação do Sistema Solar, há 4,6 bilhões de anos— que ejetaram boa parte de sua camada externa, rochosa, deixando apenas o núcleo denso para trás.

Daí a noção de que visitar o Psique pode ser o mais próximo que se pode chegar de viajar até o centro da Terra —jornada infactível em razão das enormes pressão e temperatura presentes no interior profundo do planeta.

Localizado a cerca de três unidades astronômicas (450 milhões de km) do Sol, o que equivale ao triplo da distância que a Terra guarda de sua estrela-mãe, o Psique não é um alvo ideal para observações telescópicas, e pouco se sabe dele. O formato exato, por exemplo, só poderá ser determinado quando a sonda chegar lá.

E algo que a equipe da missão está pronta para lidar é com surpresas. Caso não se confirme a hipótese de que o asteroide é um núcleo de planetesimal, ele pode se revelar um objeto de tipo jamais visto antes, que obrigará a uma revisão da compreensão de como se deu a formação do Sistema Solar.

QUATRO INSTRUMENTOS E UM EXPERIMENTO

Para realizar sua missão, a espaçonave conta com dois conjuntos gêmeos de cinco painéis solares, capazes de alimentar os sistemas de bordo e os quatro propulsores de efeito Hall embarcados. São uma espécie de propulsor iônico, que funciona usando eletricidade para ionizar (tirar elétrons) de átomos de xenônio. Depois, com campos magnéticos, essas partículas são ejetadas em alta velocidade e, com isso, impulsionam a espaçonave adiante.

Não é um processo muito potente (a força de empuxo equivale ao peso de uma pilha pequena sobre a mão na Terra), mas é extremamente econômico: ganhando essa pequena aceleração por um longo período, a espaçonave acaba adquirindo muita velocidade —mais do que seria capaz com propulsão química convencional.

Será a primeira vez que propulsores desse tipo serão testados além da órbita da Lua. Os painéis solares produzirão 21 kilowatts ao deixar a Terra, mas apenas algo entre 2,3 e 3,4 kilowatts quando estiverem em órbita do Psique, muito mais afastados do Sol.

Com essa potência, a sonda alimentará os três instrumentos que farão o estudo do asteroide: um imageador multiespectral, capaz de registrar a topografia em luz visível e infravermelho próximo, além de identificar composição mineralógica; um espectrômetro de raios gama e nêutrons, para captar a composição química da superfície; e um magnetômetro, que buscará evidências de um campo magnético antigo —caso ele seja achado, será forte evidência de que Psique formou o núcleo de um corpo planetário no passado.

Um quarto instrumento, por assim dizer, é o sistema de comunicação da sonda. Embora a função das antenas seja permitir a troca de informações entre a nave e o JPL (Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa), que gerencia a missão, a análise das ondas de rádio permite investigar variações no campo gravitacional do asteroide conforme a sonda gira ao redor dele, dando pistas de como se organiza seu interior.

Por fim, a Psyche leva um experimento de carona, o DSOC, ou Comunicações Ópticas em Espaço Profundo. É a primeira tentativa da Nasa de desenvolver um sistema que permita transmissões de banda larga usando laser em vez de rádio. Estima-se que as taxas de transmissão de dados possam subir de dez a cem vezes, algo que seria muito importante para futuras missões tripuladas a Marte.

O pacote todo —Psyche, DSOC e o custo do lançamento— custou à Nasa US$ 1,2 bilhão (R$ 6,1 bilhões). Espera-se que a espaçonave, após chegar a seu destino, em 2029, opere por pelo menos 26 meses, realizando diversas órbitas em torno do misterioso asteroide.

SALVADOR NOGUEIRA / Folhapress

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