SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – É sempre cercado de expectativa o Draft da NBA, a noite do recrutamento de calouros da liga norte-americana de basquete. Um a um, os times vão selecionando os jovens inscritos no processo, com os olhos voltados especialmente para o dono da primeira escolha: quem será o atleta cujo nome estará no envelope número um?
Não é exatamente o caso de quarta-feira (22). A jornada é, sim, aguardada com ansiedade, mas não porque haja alguma dúvida a respeito do que fará o San Antonio Spurs. No papel entregue pelo clube texano estará escrito “Victor Wembanyama”.
O francês de 19 anos é o jogador que chega à NBA com as perspectivas mais grandiosas desde que LeBron James apareceu, há duas décadas. O pivô de 2,25 m é visto como um talento capaz de dominar o esporte, um gigante moderno, apropriado para o que se tornou o basquetebol ao longo deste século.
Wembanyama tem mobilidade incomum -para não dizer inédita- em alguém de seu tamanho. O controle de bola e a capacidade de criar situações de arremesso também chamam a atenção. O tiro de longa distância ainda apresenta inconsistências, mas os analistas o campeonato dos Estados Unidos estão certos de que ele se tornará um arremessador de elite.
Haverá, certamente, um período de adaptação, uma curva de aprendizado, particularmente no ataque. Na outra metade da quadra, com sua movimentação lateral, sua inteligência para entender ângulos e sua envergadura descomunal de 2,43 m, ele já estreará, ao que tudo indica, como um defensor de primeiro nível.
“Teve um monte de unicórnios nos últimos anos”, observou LeBron, referindo-se à expressão adotada para atletas raros no basquete, especialmente grandalhões com habilidade de armador. “Bom, ele é mais um alienígena. Nunca vi alguém tão alto quanto ele, mas, ao mesmo tempo, fluido e gracioso na quadra.”
Victor agradeceu, dizendo que não gostava de ser chamado de unicórnio. “Prefiro [alienígena], porque é simplesmente algo que não é deste mundo. É realmente o que tenho trabalhado para ser: algo único e original”, respondeu.
Este mundo não é aquele de 2003, quando James chegou à NBA -e Wembanyama ainda não tinha nascido. O alcance das redes sociais tornou “virais” as jogadas do francês na Europa. Causaram comoção lances como aquele em que tentou arremesso de três, pulando para trás, e aproveitou o próprio rebote para uma enterrada de primeira.
“A cobertura é exponencial, mais do que era mesmo para aqueles jogadores que historicamente chegaram com enorme expectativa”, disse o principal dirigente da liga, o comissário Adam Silver. “Será enorme. Eu estive com ele em Paris em janeiro. E, francamente, quando você tem 2,25 m, atrai a atenção, todo o foco. Ele está acostumado com isso.”
Antes mesmo do Draft, tradicionalmente realizado em Nova York, o aspirante a estrela da NBA experimentou os holofotes norte-americanos. Na última terça-feira (20), ovacionado no Yankee Stadium, deu o cerimonial arremesso de abertura no jogo de beisebol entre New York Yankees e Seattle Mariners.
Arremessos de basquete ele dará a partir de 3 de julho, quando o San Antonio vai estrear na NBA Summer League, série de amistosos disputada por calouros e candidatos a calouros da liga. Os Spurs jogarão em Sacramento, e já há ingressos revendidos por mais de US$ 500 (cerca de R$ 2.400), algo sem precedentes no campeonato de verão.
Victor terá nos Estados Unidos um tutor dos mais respeitados. Gregg Popovich, 74, é tido como um dos maiores treinadores de todos os tempos e tem histórico excelente no trabalho com pivôs, como David Robinson e Tim Duncan.
Pentacampeão da NBA, Popovich vinha nos últimos anos lidando com elencos de qualidade limitada. Agora, terá nas mãos uma joia gigante, filho de um atleta de salto em distância e de uma jogadora de basquete que lhe ensinou os fundamentos do esporte.
Wembanyama foi, na mais recente temporada, eleito o melhor jogador da liga francesa. Com médias de 21,6 pontos, 10,4 rebotes e 3 tocos, levou à final o Boulogne-Levallois Metropolitans 92, que não resistiu diante do mais poderoso Monaco.
Mas não foi por causa do Monaco que a organização do campeonato levou a decisão ao complexo de Roland Garros, palco tradicional do tênis em Paris. Os mais de 14 mil que pagaram ingresso foram ver a despedida do prodígio em sua jornada rumo ao palco maior do basquetebol.
Nem sempre os atletas que chegam à NBA cercados de expectativas as cumprem. Não faltam exemplos de jovens de grande potencial que fracassaram, por barreiras mentais ou físicas.
Victor tem um histórico de lesões que incluem uma fratura por estresse na canela. É provável que precise ganhar massa muscular -seus 107 kg, distribuídos por 225 kg, estão abaixo do padrão observado no principal campeonato da modalidade.
Mas estamos diante de um alienígena. E quem está falando isso é LeBron James.
MARCOS GUEDES / Folhapress