Negra Li, Rúbia e Dina Di mostram que mulheres estão no hip hop desde o início

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As americanas Roxanne Shante, Sha-Rock, MC Lyte e Queen Latifah e as brasileiras Sharylaine, Rúbia, Dina Di e Negra Li são alguns dos nomes das mulheres pioneiras no hip hop, nos Estados Unidos e no Brasil.

Há 50 anos, o movimento ganhava as ruas, e as mulheres estavam presentes desde o início. Segundo especialistas e artistas, um dos avanços nesse período é o fato de elas ganharem maior protagonismo em um cenário dominado por homens.

“São 50 anos que o mundo inteiro comemora. Eu tenho certeza absoluta que, em cada país, há as suas pioneiras. No Brasil, não foi diferente”, afirma Lunna Rabetti, MC e fundadora da Frente Nacional de Mulheres no hip hop.

A organização, criada em 2010, tem como objetivo difundir a participação feminina no movimento. O grupo, presente em 23 estados, também atua em ações sociais. “O nosso público-alvo está na periferia. Nós trabalhamos as questões sociais dentro da periferia. Somos uma rede de fortalecimento”, afirma Lunna.

Sharylaine, que é contemporânea aos Racionais MCs, o maior grupo de rap nacional, é lembrada como uma das primeiras mulheres a adentrar este universo. “A artista foi a primeira a gravar uma coletânea em LP”, recorda Lunna. “Essa coletânea foi a que lançou os Racionais, com a música ‘Pânico na Zona Sul’. Ela é a única mulher do disco.”

Lunna questiona o fato de a cantora não ter estourado tanto quanto os Racionais na época. “É aí que a gente começa a entender a questão da invisibilidade da mulher e toda essa história ruim que há no movimento hip hop. Mas não só nele, acontece em muitos outros segmentos musicais”, afirma.

A fundadora da Frente Nacional lembra também de outros nomes importantes e pioneiros, como Rose MC, que foi uma das primeiras a formar um grupo de b-girls, dançarinas de breakdance, e depois de rap. Cita também a rapper Rúbia —que participou do grupo RPW—, MC Regina, Ieda Hills e Dina Di, que surgiu já na década de 1990.

“Dina Di conseguiu adentrar diversos locais e rádios e teve visibilidade. Ganhou muitos prêmios com a música dela. Infelizmente, veio a falecer em 2010 vítima de negligência médica, após uma infecção hospitalar pós-parto. Mas ela deixou um legado, com videoclipes e músicas”, afirma.

Outra artista que ganhou visibilidade nesse período foi Negra Li, que integrou o grupo RZO. “Quando eu cheguei e tive a oportunidade de entrar no movimento, que transformou a minha vida, eu via muitas mulheres, mas elas não tinham a visibilidade que mereciam”, afirma.

Negra Li lembra que começou no rap a convite de um amigo, que a viu cantando em sala de aula uma música da americana Whitney Houston. “Eles pararam para me ouvir e falaram: ‘Olha, tem uma back vocal que está saindo. Você quer cantar no grupo?’. Foi assim que eu entrei no rap.”

Ela afirma que no RZO sentia não ter muita voz. “Eu era uma backing vocal e fazia o que os caras sempre me propunham e achavam interessante para as gravações, shows e tudo mais. Eu não era atuante de uma forma que eu pudesse falar: ‘Vamos fazer isso’. Mas para mim, na época, era normal.”

“Não estou falando que os caras me fizeram mal, que me obrigaram. Não. Era uma cultura, que gente vem lutando para mudar. Era uma coisa com a qual estava muito habituada e que era muito difícil tirar. Eles não faziam nada pensado em me diminuir. Não era isso, pelo contrário”, completa.

A rapper afirma também que sempre achou necessário dar mais visibilidade para as mulheres no hip hop. “Há discursos que elas [público feminino] precisam ouvir e só uma mulher pode falar. Só uma mulher conhece a dor da outra.”

Para Daniela Vieira, socióloga e organizadora do livro “Racionais MCs: Entre o Gatilho e a Tempestade”, as narrativas das mulheres no rap são uma forma de letramento de gênero, por trazerem assuntos que são do cotidiano delas.

“É uma maneira de aas mulheres exigirem respeito, exigirem que elas se desloquem para um lugar que não seja da subalternização. E isso para as meninas que crescem ouvindo é extremamente importante”, afirma.

Segundo a socióloga, as mulheres têm dado o tom contra o machismo. “Elas não precisam pagar pedágio [para os homens], digamos assim, e nem pedir permissão para escolher a forma de se vestir, porque a gente lembra que, nos anos 1990, elas tinham que se vestir como os caras. Não podia ter aspectos de feminilidade.”

“Agora a gente vê Drik Barbosa, Karol Conká se apresentando. As mulheres não têm mais vergonha. Elas não vão ser menos rappers, menos musicistas, pela forma como estão se vestindo”, completa.

Além das pautas de combate ao sexismo e ao machismo e contra os problemas e as desigualdades sociais, que são comuns no hip hop, Vieira destaca que uma outra pauta que vêm sendo trabalhada pelas mulheres, na atualidade, perpassa por falar da solidão da mulher negra, do amor e da afetividade.

A DJ Sophia, que faz parte da nova geração, lembra que começou a se interessar por hip hop ouvindo mulheres. Dina Di, Sharylaine e Negra Li faziam parte da sua playlist. Por isso, ela destaca a importância das que vieram antes, para que ela se sentisse à vontade e motivada a discotecar.

“As minhas maiores referências de DJs naquela época e ainda hoje, como mulher, são as DJs Vivian Marques e Tati Laser, que foram minhas professoras”, afirma.

Para ela, uma mulher sempre vai tocar uma outra mulher e isso é o que as diferencia dos homens. “A gente toca as minas, porque a gente sente a necessidade de ser representada e representar essas minas no palco.”

Sophia diz ainda que para as mulheres terem mais visibilidade no movimento é preciso que grandes empresários se interessem pelo rap e potencializem os projetos delas. “Quantas minas são boas e não conseguem lançar música, sabe?”

PRISCILA CAMAZANO E TAYGUARA RIBEIRO / Folhapress

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