SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O 9 de Novembro é lembrado como o Dia Internacional contra o Fascismo e o Antissemitismo. A data evoca a Noite dos Cristais, episódio criminoso orquestrado em 1938 pelos nazistas em que judeus alemães foram assassinados. Sinagogas e lojas pertencentes à comunidade judaica também foram incendiadas ou vandalizadas na ocasião, que este ano completa 85 anos.
Por infeliz coincidência, incidentes antissemitas estão hoje em alta no plano internacional, em razão do conflito que eclodiu no último 7 de outubro entre Israel e o grupo terrorista islâmico Hamas, que controla a Faixa de Gaza.
Desde o início da guerra, França e Reino Unido registraram, cada país, mais de mil casos de crimes antissemitas; na Alemanha, foram em torno de 1.800.
Mas voltemos a 1938. Os nazistas estavam no poder havia quase seis anos e tinham transformado o antissemitismo em política oficial, com a demissão de judeus das universidades, de hospitais e de qualquer outro emprego público.
A Noite dos Cristais -assim chamada pelo estouro de vidraças de lojas ou vitrais de edifícios religiosos- foi, no entanto, o preâmbulo para aquilo que se tornaria o maior genocídio da história da humanidade, com o assassinato de 6 milhões de judeus no Holocausto.
O pretexto para os incidentes foi a morte em Paris do diplomata alemão Ernst vom Rath, assassinado por um adolescente de 17 anos, que era judeu e havia sido expulso da Alemanha para a Polônia.
O massacre da comunidade e dos bens judaicos foi comandado pelas milícias nazistas. Os bombeiros foram impedidos de combater o incêndio de lojas e sinagogas, atingidas em todo o território do país.
Na Alemanha e na então recém-anexada Áustria foram destruídas 267 sinagogas e 7.500 lojas e empresas. Os judeus assassinados foram 91, mas em seguida centenas de outros pereceram em decorrência dos ferimentos ou cometeram suicídio.
O 9 de Novembro tornou-se uma data para lembrar a luta contra o fascismo e o antissemitismo a partir de uma votação do Parlamento Europeu, seguida simbolicamente por dezenas de outros países ocidentais.
Com o conflito de Gaza, a emergência de uma nova onda do preconceito contra os judeus foi assinalada e combatida em vários países. O episódio mais eloquente ocorreu no Daguestão, província russa de maioria muçulmana. Centenas de racistas mobilizados por redes sociais irromperam em 29 de outubro em um aeroporto e tentaram linchar passageiros judeus que chegavam de Israel. Não conseguiram.
Nos Estados Unidos, estudantes judeus da Universidade Cornell precisaram ser protegidos contra a agressão de colegas hostis. Por sua vez, o diretor do FBI, Christopher Wray, alertou para os “níveis históricos” que o antissemitismo atinge no país. Os judeus são apenas 2,4% dos americanos, mas vítimas de 60% dos crimes de ódio com motivação religiosa. Constatações semelhantes chegaram de múltiplos países, como Espanha, Itália, Áustria ou até da África do Sul.
Um dos grandes historiadores do antissemitismo, o francês de origem russa Leon Poliakov, discorre sobre perseguições em que os judeus eram personagens secundários: durante as Cruzadas, a partir do século 11, o foco cristão eram os muçulmanos. Mesmo assim, a comunidade judaica foi massacrada em Colônia e em Praga, terminando com morticínio em Jerusalém.
Os judeus foram expulsos da Inglaterra no século 13, da França no final do século seguinte, mas na história desse povo nada foi tão doloroso quanto a expulsão da Espanha, em 1492. Ou saíam ou eram forçados à conversão -por iniciativa da rainha Isabel de Castela, que dizia que a Virgem lhe aparecia em sonhos, pedindo o ato extremo de suposta purificação religiosa da Península Ibérica.
O antissemitismo nunca decresceu e atingiu um de seus momentos mais eloquentes com o Caso Dreyfus. O capitão francês Alfred Dreyfus foi preso em 1894, acusado por documentos apócrifos de espionagem em favor da Alemanha. Foi condenado e destituído em escandaloso complô antissemita. O caso repercutiu amplamente na Europa e em todo o mundo. Posteriormente, seu caso foi revisado, e ele, reintegrado ao Exército. No Brasil, Rui Barbosa escreveu um panfleto para defendê-lo.
JOÃO BATISTA NATALI / Folhapress