SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Depois do jogo contra a Argentina [na Copa de 90], tudo que acontecia de ruim no Brasil, chovia muito, dava um desastre, o dólar subia, as coisas não andavam bem economicamente no Brasil, então todo mundo aproveitava [para dizer]: ‘a era Dunga, a era Dunga’. Foram quatro anos pesados.”
Na série documental “Brasil vs Dunga: futebol em pé de guerra”, que estreia nesta quinta-feira (19) no SporTV, o capitão do tetra fala de maneira sincera sobre o peso que a eliminação para a Argentina trouxe para sua vida. Na ocasião, o volante foi eleito pela opinião pública o grande culpado pela queda precoce nas oitavas de final, ao não matar jogada de Maradona ainda no meio de campo, que acabou culminando no gol de Caniggia.
“Depois da era Dunga, um negócio estranho [aconteceu] comigo. Quando eu vejo uma câmera, uma máquina fotográfica, dificilmente eu consigo sorrir”, afirmou o ex-jogador na série.
Diretor do documentário, Fernando Acquarone diz que optou por começar o documentário relembrando a traumática eliminação na Itália por se tratar de um momento crucial na carreira do gaúcho, que saiu da pequena Ijuí, no interior do Rio Grande do Sul, para se destacar com as camisas de Internacional, Corinthians, Santos, Vasco e Fiorentina, além da seleção brasileira.
“É um momento que faz parte da formação dele, como jogador e também como pessoa”, afirma Acquarone.
A série retrata o sofrimento do jogador em sua volta ao Brasil, que ajudou a formar o personagem que daria a volta por cima quatro anos depois, levantando a taça de campeão ao bater a Itália nos pênaltis.
“Ele vai do inferno em 1990 para a glória em 1994, é uma história de superação muito forte”, acrescenta o diretor.
Segundo Acquarone, no ano em que se comemoram os 30 anos da conquista do tetra, a série busca desconstruir a imagem que ficou impressa no imaginário de muitas pessoas desde então, de um jogador raçudo dentro de campo, símbolo do futebol de resultado, mas com limitações técnicas e pouco carismático.
Ela mostra o faro artilheiro de Dunga no início da carreira no Rio Grande do Sul e a passagem de sucesso na Fiorentina, onde exerceu papel importante em um meio de campo que tinha Roberto Baggio –com quem Dunga construiu uma grande amizade, tendo dividido a casa em que moraram em Florença.
A série traz também um lado menos conhecido do capitão do tetra, como o trabalho social que ele promove em Porto Alegre, distribuindo comida para pessoas em situação de vulnerabilidade.
“Para nossa surpresa, conhecemos um Dunga superdivertido, brincalhão, que ajuda muita gente em situação de risco, tem um coração enorme. Nos deparamos com uma pessoa totalmente diferente do que se perpetua na imprensa e tenho certeza que o público vai se surpreender”, afirma Acquarone.
A série traz o depoimento de jogadores que estiveram nas Copas de 90 e 94, como Taffarel, Bebeto e Roberto Baggio, além do presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) à época, Ricardo Teixeira. “Tratando-se do Dunga, o Ricardo Teixeira fez questão de falar, até porque foi um personagem muito importante para a própria carreira do dirigente.”
Uma ausência sentida é a de Romário, peça fundamental para a conquista do tetra nos Estados Unidos. “Assim como o Dunga não apareceu na série do Romário, o Romário não aparece na do Dunga. Mas os dois se respeitam muito. O Romário fala bem do Dunga na série dele, e o Dunga fala bem do Romário na própria série”, diz Acquarone.
O documentário retrata ainda os primeiros passos no cargo de treinador, trajetória que teve início na função de consultor técnico no japonês Júbilo Iwata. E avança até a Copa de 2010, na África do Sul, na qual comandou a equipe que foi eliminada nas quartas de final pela Holanda.
“No fim da série, o Galvão Bueno faz um apelo para o Dunga voltar a ser técnico, dizendo que ele é um cara novo [61 anos], e ainda tem muito a dar para o futebol brasileiro”, afirma Acquarone.
O último trabalho como treinador foi pela seleção brasileira, que ele voltou a comandar entre 2014 e 2016.
“Ele respondeu que trabalharia novamente como treinador só se for uma oferta irrecusável”, diz Acquarone. “Acho que um dia a gente ainda vai ver o Dunga novamente na beira do campo comandando seus jogadores. Só não sei quando.”
LUCAS BOMBANA / Folhapress