Nova frente de batalha de privatização da Sabesp será com prefeituras e câmaras

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma nova frente de batalha se desenha após a Assembleia Legislativa de São Paulo aprovar a privatização da Sabesp: as discussões nos municípios com os quais a empresa tem contrato para operar os serviços de água e esgoto.

Com a autorização dada pelos deputados na última quarta-feira (6) para que o governo paulista se torne sócio minoritário na companhia, contratos de exploração do serviço com prefeituras pelo estado entram em xeque, já que muitos deles preveem rediscutir o acordo em caso de privatização.

É o caso de São Paulo, por exemplo. A lei que autoriza a celebração de um convênio com a empresa de saneamento estabelece que os contratos “serão automaticamente extintos se o estado vier a transferir o controle acionário da Sabesp à iniciativa privada.”

A Câmara Municipal tem se mostrado reticente, mas uma manobra do prefeito Ricardo Nunes (MDB), aliado do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), facilitou a adesão da capital à Sabesp privatizada.

Em agosto, sem anúncio e cerimônia, Nunes incluiu a cidade em uma das chamadas Unidades Regionais de Abastecimento de Água e Esgotamento (Urae), que agrupa municípios em bloco. A ideia do governo Tarcísio é negociar com as cidades em grupo, não cidade a cidade, enfraquecendo o poder de barganha de cada município.

Mas a medida vai enfrentar forte resistência na Câmara, que não concorda com a interpretação. Isso porque só a capital responde por 45% do faturamento da empresa, e os vereadores querem influir na decisão dos novos contratos.

Para isso, não descartam a criação de uma nova empresa de saneamento, diz o vereador Sidney Cruz (Solidariedade), presidente da Comissão de Estudos sobre a Privatização da Sabesp.

“Na nossa avaliação, há necessidade de passar novamente pelo crivo da Câmara. Podemos aderir ou criar uma empresa de saneamento, por que não?”, questiona. “Não é razoável acharem que a adesão da cidade [à privatização da Sabesp] será natural.”

O atual acordo de operação da Sabesp em São Paulo foi assinado em 2010, com prefeitura, estado e Arsesp (agência reguladora) em conjunto. O contrato é válido por 30 anos, ou seja, até 2040, com possibilidade de ser prorrogado.

O cálculo é que perder o contrato de São Paulo reduziria em muito o poder da empresa de atrair investidores, e é com isso que os vereadores querem jogar. A comissão que Cruz coordena, no entanto, não é deliberativa, apenas consultiva.

O presidente da Câmara, Milton Leite (União Brasil), é uma das vozes mais poderosas na cidade a questionar a privatização. Ele defende que a cidade deve receber 55% do valor da venda das ações para aceitar a prorrogação do contrato de 2040 para 2060.

Já o governo questiona o poder de decisão da Câmara. “Por que a gente está discutindo mais com o Executivo, com as prefeituras? Porque é de fato, juridicamente falando, quem é o competente legal pelos contratos. Isso aí é uma questão constitucional”, disse a secretária de Meio Ambiente, Natália Resende.

Mas a pressão não vem apenas da Câmara. O TCM (Tribunal de Contas do Município) tem feito coro à necessidade de garantir ganhos para a capital com a privatização.

No começo de novembro, o órgão enviou ofício à gestão Ricardo Nunes questionando se prefeitura tinha proposta de revisão de contratos em vigor e se havia levantado os investimentos necessários para a universalização do saneamento, entre outros pontos.

A prefeitura respondeu que recebeu da Sabesp uma proposta de alteração do atual contrato prorrogando a concessão do saneamento para 2060 e estabelecendo a antecipação da universalização do serviço de 2033 para 2029, grande promessa do governo para vender a privatização.

Na sequência, um dos conselheiros do tribunal, João Antonio, fez sete novos questionamentos à gestão Nunes, perguntando se a parcela de ações do governo estadual pode ser transferida para o município como compensação pela extensão de contrato se haverá pagamento de indenização e se o município tem estudos para eventualmente assumir a prestação de serviços de saneamento.

Cidades do interior também querem garantias de que serão beneficiadas com a privatização.

Em Franca, o prefeito Alexandre Ferreira (MDB) evitou se posicionar contra ou a favor da venda da empresa, mas apresentou uma série de exigências à companhia pós-privatização.

Uma delas é que a empresa pague outorga de R$ 300 milhões para operar o saneamento, que seria investido em saúde e em obras de recapeamento de ruas. Outra é que a empresa pague 4% de seu faturamento bruto por ano para ações de meio ambiente e prevenção de desastres naturais.

Um dos prefeitos mais ativos contra a venda da Sabesp foi Mário Pardini (PSD), de Botucatu e membro de partido da base de Tarcísio, que chegou a discursar em audiência pública na Alesp contra a privatização.

“Não é uma questão ideológica de direita ou esquerda, é a preocupação com o saneamento básico do estado de São Paulo”, afirmou ele, citando episódio durante a crise hídrica de 2014 em que a companhia socorreu a empresa privada que opera o saneamento em Itu, enviando fileiras de caminhões pipa.

THIAGO AMÂNCIO E THIAGO BETHÔNICO / Folhapress

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