(FOLHAPRESS) – “Karatê Kid” é uma franquia bastante complicada para uma história tão simples quanto a de um jovem que aprende a lutar para vencer o bullying da escola. Desde o primeiro filme, de 1984, a série ganhou duas sequências, tentou dois reinícios com novos protagonistas e voltou a fazer sucesso com o seriado “Cobra Kai”.
Essa salada de frutas ganha um novo ingrediente com “Karatê Kid: Lendas”, sexto longa a costurar esse enredo maior. A aposta está na união de momentos distintos da franquia, nas figuras de Ralph Macchio -Daniel LaRusso, o protagonista original- e Jackie Chan -o senhor Han, mestre do personagem de Jaden Smith no filme de 2010.
Mas o longa se enrola já nos primeiros segundos, ao conectar um episódio do segundo filme, de 1986, com uma extensa cena de animação para justificar o prólogo da história em Pequim. Na primeira cena, em suma, descobrimos que o senhor Miyagi, o mestre japonês de LaRusso, teve o mesmo professor que o chinês senhor Han, cada um em seu país.
Detalhe -o personagem de Jackie Chan ensina kung-fu, um esporte com origem diferente do karatê, a arte de Miyagi, o que complica o encontro futuro com o personagem de Macchio. A bagunça afeta o resto da trama.
O novo aprendiz, o jovem Li Fong, vivido por Ben Wang, segue a trajetória típica da série. O garoto recomeça a vida em uma nova cidade, dessa vez com a mãe, papel de Ming-Na Wen, chegando a Nova York de Pequim. Por lá, Li sofre bullying de alunos de uma academia de karatê, que o hostilizam por seu envolvimento com uma garota da pizzaria local.
Como tudo nessa história é previsível, o diretor Jonathan Entwistle e o roteirista Rob Lieber apelam a uma mudança estratégica. Li Fong já vai para os Estados Unidos sabendo kung-fu. Na verdade, é um aluno prodígio da escola de Han.
A ideia seria boa, não fosse o detalhe cruel de que ela quebra a receita do bolo da série. Como o protagonista conhece o esporte, o filme precisa achar uma alternativa que dê conta do arco da personagem e da introdução do karatê na trama.
Inventa-se um drama para o pai da garota, vivido por Joshua Jackson, que vira um aprendiz de Li Fong para vencer uma luta de boxe e pagar uma dívida com os vilões. Em paralelo, o menino carrega o trauma da morte do irmão, que ocorreu após um torneio de kung-fu em Pequim.
O drama de “Lendas”, nessa hora, é que a produção nem tenta sair da fórmula, mesmo diante dessas complicações. Elas viram um ramo extra na árvore da trama, um feixe de bambu pensado ainda nos anos 1980 como uma aventura juvenil simples.
A própria participação de Ralph Macchio tem um quê de penduricalho. Ele aparece bem tarde na história, quando Li Fong já decidiu lutar em um campeonato local -e revelar a motivação aqui seria spoiler.
O sr. Han lembra do discípulo de Miyagi e vai buscá-lo na Califórnia, do outro lado do país, porque só ele teria a essência da prática esportiva para derrotar o grande adversário da vez.
Macchio parece tão ou mais perdido que Jackie Chan no filme. A química dos dois tampouco funciona, com o humor travado nas diferenças entre as práticas de luta dos dois. A presença de LaRusso é tão engessada que você até suspeita que a culpa seja de “Cobra Kai” -o fim da série até forçou o longa a adiar sua estreia em seis meses.
Para piorar, Entwistle, o diretor, mal dá conta das cenas de ação. Os combates acontecem em sequências picotadas a nível quase atômico, em tomadas que mal dão a ver os golpes.
“Lendas” tem gosto de burocracia xexelenta, que lembra uma versão deturpada do encontro dos Homens-Aranha de “Sem Volta para Casa”. Ele segue a passos tortos o molde dos super-heróis, apostando em uma embalagem mais velha e de maior nostalgia.
Mas emprestando uma analogia da trama, essa insistência pelo passado impede o filme de fluir como água, encontrando seu curso na leveza do presente. Em vez disso, afunda como uma pedra, enterrada no fundo do rio de continuações do cinema americano.
KARATÊ KID: LENDAS
Avaliação Regular
Classificação 12 anos
Elenco Jackie Chan, Ralph Macchio, Ming-Na Wen
Produção Estados Unidos, 2025
Direção Jonathan Entwistle
Onde ver Em cartaz nos cinemas
PEDRO STRAZZA / Folhapress