Nunes chega ao ‘Dia D’ de vice com aliados em crise, tutela de Tarcísio e Bolsonaro irredutível

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O prefeito Ricardo Nunes (MDB) chega ao dia da indicação do vice de sua chapa pela reeleição em meio a uma insatisfação generalizada no seu entorno com a escolha do coronel da reserva Ricardo Mello Araújo (PL), a qual foram obrigados a encampar.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) se manteve irredutível sobre o nome do ex-Rota, e o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) passou a endossar o padrinho político e tomar as rédeas da definição.

O anúncio deve ser feito nesta sexta-feira (21), pelo próprio governador, dois dias após jantar organizado por ele no Palácio dos Bandeirantes com dirigentes nacionais dos partidos que compõem a coligação do prefeito.

O nome de Mello Araújo foi levado a Nunes no início do ano por Valdemar Costa Neto, presidente do PL, mas ganhou força apenas após a entrada do coach Pablo Marçal (PRTB) na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Até então, o prefeito havia se mantido como o único candidato associado ao campo da direita.

Com Marçal alinhado a valores ideológicos defendidos pelo bolsonarismo e bem posicionado nas pesquisas (ele marcou entre 9% e 7% em cenários testados pelo Datafolha ao fim de maio), o apoio de Bolsonaro a Nunes ficou mais caro.

A entrada do empresário na corrida eleitoral surpreendeu a pré-campanha do prefeito, que tinha a expectativa de definir o nome do vice apenas no período das convenções partidárias, ao fim de julho.

Nunes avalia que Mello Araújo é um nome radical, que pode afastar os eleitores moderados –o presidente Lula (PT) obteve 53% dos votos na capital no segundo turno de 2022.

Para não perder o endosso do PL, cujos deputados mostraram animação com o coach, o prefeito precisou oferecer o posto ao partido.

Bolsonaro não quis falar em outra indicação e costuma se referir positivamente à gestão do ex-Rota à frente da Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo). Aliados dizem que não houve um nome forte que pudesse convencer o ex-presidente a deixar de lado Mello Araújo.

Com o surgimento de Marçal, Tarcísio, que é o principal cabo eleitoral do prefeito e tem interesse em sua reeleição, manifestou preocupação a aliados e disse que era preciso estancar a ascensão do empresário.

O governador, que antes dizia que a decisão caberia a Nunes, passou a defender publicamente o nome de Mello Araújo e cobrou agilidade na escolha. Ele avaliava que a indicação era necessária para sacramentar a aliança com Bolsonaro.

Pressionado pelo entorno do ex-presidente, que o acusava de tentar trair o padrinho político de olho na Presidência em 2026, Tarcísio pressionou Nunes. O endosso a Mello Araújo é também um aceno ao bolsonarismo –seu nome não era da preferência do governador.

Tarcísio está engajado em evitar a vitória de Guilherme Boulos (PSOL), principal adversário de Nunes. Seu entorno diz que a eleição do deputado federal atrapalharia ações em conjunto com a prefeitura e que é importante que a relação com a administração municipal esteja pacificada.

Figuras da política estadual também afirmam que o governador quer na prefeitura alguém sob sua influência –nesse sentido, tanto Boulos quanto Marçal caminhariam com independência.

Depois das manifestações de Tarcísio, a pré-campanha de Nunes reconheceu que não era mais possível adiar a decisão sobre a vice.

No jantar organizado pelo governador com líderes partidários da coligação de Nunes, Tarcísio foi o primeiro a falar sobre a vice com jornalistas que aguardavam o fim do evento. Nunes ficou ao lado e, somente após questionamento, fez um breve pronunciamento ecoando as palavras do aliado.

O clima no entorno do prefeito é de velório diante da iminente indicação de Mello Araújo, visto como alguém que trará mais ônus do que bônus à campanha pela reeleição. A insatisfação é geral e há reações muito negativas ao nome do ex-Rota.

Alguns chegaram a falar em um “fio de esperança” sobre uma eventual reviravolta de última hora, mas a maioria já estava convencida de que não haverá mudanças. Os mais resignados falavam em engolir a seco a indicação como o preço por amarrar o apoio de Bolsonaro.

Aliados se preocupam não apenas com a radicalidade que Mello Araújo pode imprimir à chapa. Outro receio é que a escolha leve o eleitor a associar a pauta da segurança pública a uma responsabilidade do prefeito, e não do governador. Como mostrou o Datafolha, para 23% dos paulistanos, o maior problema da cidade é a segurança. Nunes quer evitar ser fustigado com base no tema.

A reportagem conversou com diversos integrantes de partidos da coligação que citam, principalmente, um grande receio sobre o impacto da presença do coronel da reserva na periferia. Aliados se preocupam, inclusive, se o crime organizado permitirá que Mello Araújo faça campanha em certos locais dominados pelo tráfico.

Para criticar a chapa, a oposição usará uma declaração de Mello Araújo na qual defendeu a diferença de tratamento em abordagens policiais nos Jardins (área nobre de São Paulo) e na periferia.

“É uma outra realidade. São pessoas diferentes que transitam por lá. A forma dele abordar tem que ser diferente. Se ele [policial] for abordar uma pessoa [na periferia], da mesma forma que ele for abordar uma pessoa aqui nos Jardins [região nobre de São Paulo], ele vai ter dificuldade. Ele não vai ser respeitado”, disse o ex-Rota ao UOL em 2017.

As campanhas de Boulos e Tabata Amaral (PSB) comemoraram a escolha de Mello Araújo. Eles avaliam que a indicação amarra Nunes a Bolsonaro e ameaça os votos do prefeito entre os eleitores moderados.

Já a pré-campanha do prefeito tentará explorar o apelo da gestão do coronel da reserva à frente da Ceagesp, defendendo que ele lançou mão de ações de combate à corrupção crônica no local. Não deve ser mencionada sua atuação como chefe da Rota, batalhão de elite da PM conhecido pela alta letalidade em suas ações.

Para aliados, o oficial da reserva da Polícia Militar foi o responsável por colocar ordem no centro de distribuição durante o governo Bolsonaro. Por outro lado, sua gestão é acusada por sindicalistas de militarizar o espaço e promover abusos.

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OS CAPÍTULOS DA DEFINIÇÃO DO VICE DE NUNES

Valdemar X Tarcísio

Em 29 de janeiro, Valdemar Costa Neto, presidente do PL, indica lista com sugestão de nomes para vice, que inclui o coronel da reserva Mello Araújo, a escolha de Jair Bolsonaro. No mesmo dia, Tarcísio de Freitas reage ao afirmar que o vice é uma escolha pessoal do prefeito e que não cabe a ele ou a ninguém indicar o cargo

Fator Marçal

Em 29 de maio, Datafolha mostra Pablo Marçal entre 7% e 9%, a depender do cenário pesquisado, em um bloco intermediário da disputa. A competitividade do nome dele gera ameaça de atração de bolsonaristas

Marçal com Bolsonaro

Em 4 de junho, Marçal se encontra com Bolsonaro. Depois, afirma ao jornal O Estado de S. Paulo que não havia chances de Bolsonaro apoiar Nunes e que a candidatura do prefeito estava desidratando. No dia seguinte, Bolsonaro diz ter compromisso com Nunes, por meio da indicação de Mello Araújo para a vice

Tarcísio cobra indicação rápida

Em 10 de junho, Tarcísio afirma que, pela mudança de cenário, seria importante que Nunes fizesse o acerto da vice o mais rápido possível

Almoço e jantar

Em 14 de junho, Nunes almoça com Tarcísio, Bolsonaro e Mello Araújo na prefeitura. Ali, diz que falta aparar as arestas com partidos para a indicação do policial. É marcado um jantar para 19 de junho, organizado por Tarcísio, com Nunes e membros dos partidos, para selar o nome do oficial no posto. No entanto, confirma-se apenas que o PL indicará a vaga

Dia D

Escolha de Mello Araújo para ser vice de Nunes deve ser anunciada por Tarcísio nesta sexta-feira (21)

ANA LUIZA ALBUQUERQUE E ARTUR RODRIGUES / Folhapress

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