SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), disse nesta quinta-feira (23) que a capital pode implementar a tarifa zero no transporte de ônibus aos domingos ou no período noturno a partir do ano que vem. Segundo ele, a ideia é preliminar e o formato ainda está sendo estudado na prefeitura.
O benefício deve começar a ser testado ainda em dezembro, em data ainda a ser definida. Se der certo, começará a ser aplicado em definitivo em 2024, justamente no ano da eleição municipal. À frente da prefeitura desde maio de 2021, após a morte de Bruno Covas, Nunes vai concorrer à reeleição.
A gestão municipal deve escolher entre uma das duas opções. A alternativa com mais probabilidade de escolha, por enquanto, é a tarifa zero aos domingos, de acordo com o prefeito.
“A ideia é que a gente comece dando transporte gratuito para domingo ou para o período noturno. [Será] uma das duas situações”, ele disse. “Não está definido, a gente está pensando em iniciar o processo, para sentir como vai ser o comportamento, se a tarifa zero realmente vai trazer ganho para economia, movimento econômico.”
Nunes disse, ainda, que a gratuidade deve custar entre R$ 400 milhões e R$ 500 milhões aos cofres públicos, no mínimo. Esses cálculos são preliminares. “A ideia que está mais sendo apreciada é a de domingo. É um dia que não tem tanta movimentação, o domingo [pode] ter um aquecimento da economia, fazer girar a economia.”
Ele falou sobre a tarifa zero após ser questionado sobre os aumentos no subsídio municipal às empresas de ônibus. O valor chegou a R$ 5,3 bilhões neste ano, um recorde.
A tarifa zero deve significar também um aumento de frota aos domingo, por causa do aumento de demanda.
Nunes afirmou que a prefeitura conversa com o relator do orçamento da cidade na Câmara Municipal, Sidney Cruz (Solidariedade), para incluir a previsão de gastos com a tarifa zero no ano que vem. Uma decisão deve ser tomada até a semana que vem, ele disse.
“O que eu não vou fazer é tirar dinheiro da habitação, da saúde, para colocar no transporte”, afirmou.
O prefeito disse, ainda, que a decisão sobre manter ou não a tarifa no atual valor de R$ 4,40 ainda não foi tomada. Ele ressaltou que o assunto será discutido com o governo estadual, pois o valor é o mesmo para as passagens de ônibus, metrô e trens metropolitanos.
“O aumento do subsídio é para manter a tarifa nos R$ 4,40. Era para estar em torno de R$ 8 se não fosse o subsídio”, disse Nunes. Ele mostrou-se favorável à manutenção do atual valor e disse que discutirá o assunto com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Já Tarcísio, na última terça-feira (21), ressaltou que a tarifa está congelada desde janeiro de 2020 e que a discussão envolve aumento do gasto público com o transporte. Ele também ressaltou que a decisão será tomada conjuntamente pelos governos estadual e municipal.
A reportagem apurou que a gestão Nunes não comunicou os planos ao governo estadual. O modelo de integração entre ônibus, metrô e trem é uma das barreiras para alterar a tarifa de apenas de um modal. Enquanto a prefeitura administra a operação dos ônibus, cabe ao governo estadual gerenciar o transporte sobre trilhos.
A gestão Tarcísio, porém, nunca cogitou a possibilidade de estabelecer uma tarifa zero. A reportagem enviou perguntas à prefeitura e ao governo para entender como deverá ficar modelo de integração ou, então, se o governo também pretende adotar a tarifa zero. Não houve retorno até as 17h desta quinta-feira.
Segundo Rafael calabria, coordenador de mobilidade urbana do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor), apesar da tarifa zero ser uma medida importante, há riscos de fracasso caso a medida não seja acompanhada de planejamento e investimento. Aumento da frota e, portanto, da frequência das linhas, e atenção à qualidade do serviço são essenciais para a ideia ser aprovada pela população, ele alerta.
Ele diz também que a tendência é que a tarifa zero diminua o número de passageiros que usam metrô e trem nos horários em que estiver em vigor, uma vez que a população vai preferir usar o transporte gratuito.
“Nossa preocupação é que se o processo for mal feito -se tiver lotação, se tiver fila, se tiver algum tipo de confusão com os passageiros e má qualidade- isso pode sujar a imagem do projeto de gratuidade da tarifa. Pode deixar a população irritada”, disse o coordenador.
Calabria menciona experiências em que o serviço de ônibus passou a ser criticado pela população, à medida que mais pessoas o utilizam. Em Paulínia, no interior de São Paulo, a prefeitura extinguiu a tarifa zero após oito anos de experiência e justificou que era necessário “reduzir o vandalismo” nos veículos.
O diretor de gestão da NTU (Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), Marcos Bicalho, lembra que o aumento de demanda vai obrigar as empresas a contratarem funcionários. Ele também diz que já há experiências consolidadas de tarifa zero aos domingos em várias cidades, mas adotar a medida no período noturno pode causar distorções
“Imagine que você pode ter no mesmo veículo pessoas que pagaram e outras que não pagaram pela mesma viagem, se adotar um horário a partir do qual a tarifa passa a ser zero”, disse Bicalho. “Avaliamos que a atitude do prefeito é no mínimo precavida, ao dar um passo pequeno para poder avaliar os impactos dessa medida.”
Segundo a NTU, há 103 cidades em todo o Brasil que adotam alguma modalidade de tarifa zero. A maioria -88 municípios- concedem a gratuidade em todo o sistema de ônibus e todos os dias da semana.
A maior parte dos casos ocorreu a partir de 2021, já sob efeito da diminuição na quantidade de passageiros causada pela pandemia de Covid-19.
TARIFA ZERO NA ELEIÇÃO
O passe livre nos domingos de eleição, determinado pelo STF (Supremo Tribunal Federal), deve ter um custo aproximado de R$ 7 milhões para a Prefeitura de São Paulo e de pouco mais de R$ 6 milhões ao governo do estado em cada turno, para bancar a operação do transporte municipal e de linhas de metrô, trens metropolitanos da CPTM e ônibus intermunicipais da EMTU.
Decisão do STF de outubro prevê que o poder público deve ofertar transporte urbano coletivo gratuito em todo o país nas datas das eleições -enquanto o Congresso não editar uma lei que regulamente uma política de gratuidade nesses dias.
Para a Prefeitura de São Paulo, esse gasto, após ser multiplicado pelos dois turnos, representaria 0,14% do custo anual do serviço de ônibus (R$ 10,34 bilhões) e 0,24% do montante despendido atualmente pelo município com subsídios ao sistema, incluindo todos os tipos de gratuidade.
Esses valores aproximados se referem aos padrões de movimentação de passageiros do segundo turno das eleições de 2022, quando São Paulo já adotou a tarifa zero nos dias de votação.
TULIO KRUSE E CARLOS PETROCILO / Folhapress