Nunes planeja nova rota de campanha para atrair bolsonaristas após efeito Marçal e ex-Rota

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A pré-campanha do prefeito Ricardo Nunes (MDB) planeja um freio de arrumação para se recompor após semanas a reboque dos efeitos da entrada do coach Pablo Marçal (PRTB) na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Um dos objetivos é amarrar definitivamente o voto bolsonarista.

Seguindo sugestão do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), o emedebista chegou a conversar com outros marqueteiros políticos para ouvir diferentes opiniões sobre a mudança de cenário pós-Marçal, que ameaça tirar votos de Nunes entre eleitores de direita.

Tarcísio tem dito a aliados e a políticos alinhados com o bolsonarismo que é preciso estancar a ascensão do coach.

Para sacramentar o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que chegou a se encontrar com Marçal, Nunes aceitou ceder a vice para o ex-comandante da Rota Ricardo Mello Araújo (PL). A pré-campanha resistia ao nome por entender que o indicado de Bolsonaro associaria Nunes a um setor mais radical e prejudicaria seu desempenho com eleitores de centro.

Contemplado com a indicação, o ex-presidente solidificou seu apoio ao prefeito, desautorizou deputados bolsonaristas que se encontrariam com Marçal e disse que quem gravar vídeo com o coach também precisará pedir vídeo para ele nas eleições de 2026 —deixando claro que quem ajudar o empresário não contará com o apoio de Bolsonaro futuramente.

Ainda que tenha o endosso do ex-presidente, Nunes não é um candidato que anima os deputados bolsonaristas. Eles avaliam que o prefeito não é um legítimo representante do bolsonarismo e que não compartilha as mesmas pautas. Essa opinião é ainda mais forte entre a ala mais rebelde e menos pragmática de apoiadores de Bolsonaro.

Há dúvidas se o apoio do ex-presidente será suficiente para convencer seu eleitorado de que Nunes é a melhor alternativa. Com a vice sacramentada, agora o entorno do prefeito cobra um empenho maior de políticos associados ao campo para amarrar o voto bolsonarista. Um fator de convencimento é a avaliação de que hoje Marçal tem beneficiado Guilherme Boulos (PSOL), o principal representante da esquerda.

“Há a oportunidade de cobrar um empenho maior da ala bolsonarista, porque a campanha do Marçal hoje é literalmente um instrumento da esquerda, que só favorece um agente, o Boulos”, diz João Farias (Republicanos), um dos coordenadores da pré-campanha de Nunes. “A campanha tem legitimidade para isso hoje porque a indicação do vice [por Bolsonaro] foi aceita pelo prefeito.”

Antes da entrada de Marçal na disputa, a pré-campanha de Nunes entendia que ele precisava estar perto o suficiente de Bolsonaro para garantir o voto de seus apoiadores, mas longe o bastante para não herdar a rejeição do ex-presidente na cidade. Segundo Datafolha do fim de maio, 61% dos moradores da capital dizem que não votariam de jeito nenhum em um candidato apoiado por Bolsonaro.

Com o surgimento do coach, o cenário visualizado pela pré-campanha agora é outro: o objetivo imediato é garantir o voto da direita no primeiro turno. O entorno de Nunes também admite que é preciso fazer alguns ajustes, como melhorar a produção de conteúdo, a desconstrução dos adversários e reforçar a inteligência da pré-campanha.

Nesta quarta-feira (26), o prefeito já sinalizou um movimento de aproximação do discurso bolsonarista ao afirmar que a guarda municipal “não vai tratar com rosa” agressores e que, se alguém enfrentar o poder público, vai “tomar na testa”. A declaração vai ao encontro de uma das principais demandas de eleitores e políticos do campo, que pedem o endurecimento de ações da segurança pública e são frequentemente acusados de violar os direitos humanos.

A frase também já foi utilizada anteriormente por outros políticos que desejavam se aproximar do bolsonarismo. Em 2018, quando tentava se eleger governador de carona no movimento, João Doria (então no PSDB), afirmou que na sua gestão a polícia iria atirar para matar se bandidos reagissem.

No mesmo ano, após ter tido um a ascensão meteórica surfando a onda bolsonarista, o governador eleito no Rio de Janeiro pelo PSC, Wilson Witzel, afirmou que a polícia iria “mirar na cabecinha e fogo”.

Ainda que publicamente Nunes agora acene ao bolsonarismo, outra face do freio de arrumação será convencer a militância de que ele, e não Mello Araújo, Bolsonaro ou Tarcísio, tem controle sobre a pré-campanha.

O prefeito tentará convencer lideranças de bairros e diretórios regionais de que sua administração tem uma forte plataforma social e que não carrega o verniz da extrema-direita. Pessoas próximas do emedebista reconhecem que a escolha do vice foi “um balde de água fria” para estes grupos.

Nesse sentido, o próprio Mello Araújo, que diferentemente de Nunes não precisa provar alinhamento ao bolsonarismo, tem tentado suavizar sua imagem. Ele tem falado, por exemplo, sobre ações sociais que realizou quando comandava a Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo) durante a gestão Bolsonaro. É uma resposta, segundo ele, para os que criam narrativas e dizem que ele “tem problemas com a população mais carente”.

Em 2017, o ex-Rota chegou a defender ao UOL uma diferença de tratamento em abordagens policiais nos Jardins (área nobre de São Paulo) e na periferia. Em agenda na quarta-feira (26), o próprio Nunes expôs os argumentos de Mello Araújo de que a frase teria sido tirada de contexto.

“Ele me falou o seguinte: ‘Prefeito, eu tenho um trabalho muito forte em comunidades, faço ações sociais. Eu como presidente da Ceagesp reforcei muito a atenção de alimentos para as comunidades”, afirmou.

O movimento de Mello Araújo nas redes coincide com reuniões que ele tem participado com aliados de Nunes e com seu marqueteiro, Duda Lima. O entorno do prefeito diz que esses foram encontros de apresentação, para aproximar o indicado de Bolsonaro da pré-campanha. Segundo Nunes, o ex-Rota também vai se reunir com o ex-governador Rodrigo Garcia (sem partido), coordenador do plano de governo.

Desde que o nome de Mello Araújo foi confirmado, o trabalho dele à frente da Ceagesp segue sendo destacado como um exemplo de combate à corrupção. Sua atuação como chefe da Rota, batalhão de elite da PM conhecido por sua letalidade, não deve ser mencionada.

ANA LUIZA ALBUQUERQUE E ARTUR RODRIGUES / Folhapress

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