‘O Urso’ recorre à melancolia para se consolidar como ‘dramédia’ mais nobre no ar

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Há certa estranheza no fato de a série “O Urso” ter sido laureada como uma comédia na última temporada de premiações. Quem acompanha a trama sabe que ela não é exatamente cômica. A graça dela está na habilidade de enfiar o público em meio ao caos de um restaurante para sentir angústia, refletir sobre a vida, e, quem sabe, soltar uma risada —de nervoso.

Melancolia e aflição voltam a dar o tom da série, agora na terceira temporada, que chega ao Brasil nesta quarta-feira (17), quase um mês depois da estreia nos Estados Unidos. Sobre uma constante e triste melodia de piano, o primeiro episódio mostra como foi a passagem do protagonista Carmen por Nova York, onde ele estudou gastronomia sob a batuta de chefs escrupulosos, atormentado por um cardápio de traumas, e prestes a descobrir que seu irmão se matou.

“O luto toca muitos personagens, e de formas diferentes. É um tema que atravessa toda a série, e agora cada um deles vai lidar com isso à sua maneira”, diz em entrevista coletiva Ayo Edebiri, que faz a cozinheira Sydney, papel pelo qual venceu uma estatueta de atriz coadjuvante do Emmy, o prêmio mais importante da televisão.

“É possível encontrar o riso mesmo no luto. A série transborda essa mistura de comportamentos”, acrescenta Ebon Moss-Bachrach, intérprete do também cozinheiro Richie, que foi de antagonista a bem quisto entre o primeiro e segundo ano da série. Ele também levou um troféu do Emmy para casa.

Suicídio e saúde mental não são ingredientes comuns em receitas que pretendem ser engraçadas, há de se convir. Mas “O Urso” parece saber que o melhor caminho para se firmar como a série nobre que vem tentando ser, é vender a ideia de que é uma comédia dramática —ou “dramédia”, como o mercado gosta de chamar.

E deu certo. “O Urso” se consagrou como a série que mais venceu estatuetas de comédia do Emmy numa tacada só. Em janeiro, quando foi ao ar a última edição do prêmio, foram entregues dez troféus para a produção, que superou o recorde de nove de “Schitt’s Creek”.

Há tempos o Emmy se mostra confuso com as linhas que separam as séries de comédia e de drama. Em 2014, por exemplo, “Orange Is the New Black” foi indicada aos troféus de comédia, ainda que narrasse desgraças de uma prisão feminina. No ano seguinte, porém, concorreu nas categorias dramáticas.

A bagunça fez a Academia de Televisão dos Estados Unidos mudar as regras da premiação. A partir daquela edição, o Emmy passou a considerar comédia as séries com episódios de 30 minutos, e drama aquelas com capítulos de uma hora —caso de “Orange Is the New Black”.

Mas o critério foi considerado datado porque seguia uma estrutura de produção adotada há décadas pela TV aberta, mas não necessariamente pelas plataformas streaming. Para contornar o problema, o Emmy anunciou que, a partir do ano retrasado, caberia a cada estúdio decidir se submeteria suas séries aos troféus de comédia e drama. A Academia pode solicitar uma revisão caso discorde da escolha.

A Disney, dona de “O Urso”, aproveitou a mudança. Sabendo que a série não tem o mesmo valor de produção nem é tão popular como “Succession” e “A Casa do Dragão”, que disputavam os troféus de drama neste ano, fugiu da briga de gente grande submetendo seus cozinheiros nas categorias de comédia, que tinha o páreo mais tranquilo, com “Only Murders in the Building” e “Wandinha”.

O resultado é que a Disney lambeu os beiços, não só no Emmy, como também no Globo de Ouro, onde “O Urso” monopolizou as categorias de comédia, abocanhando três estatuetas.

É difícil, portanto, ignorar tamanha expectativa que há em torno da nova leva de episódios, afirma Jeremy Allen White, que na série vive Carmen, o protagonista. “Eu estava muito ansioso. Sabia que os roteiros eram fortes, como sempre, mas ainda sinto a pressão.”

“Fomos muito sortudos com os prêmios, foi bonito e emocionante, mas tentamos não gravar com isso em mente”, complementa Edebiri, a Sydney, cozinheira que ajuda Carmen a chefiar o restaurante The Bear, em Chicago.

A relação da dupla deve ganhar um tempero diferente nos novos capítulos, com Sydney recebendo novas funções entre as panelas. “Carmen não é bom em se comunicar, mas às vezes faz gestos grandiosos para tentar se conectar com Syd. Essa é a maneira de ele tentar se aproximar”, diz Allen White.

Outra personagem que deve ganhar mais importância agora é a chef Tina, interpretada por Liza Colón-Zayas. O passado dela é contado pela primeira vez num episódio que marca também outra estreia, a de Edebiri na direção. “Me perguntaram com qual roteiro eu tinha mais me identificado, e eu respondi que doaria um filho, que ainda nem tenho, se pudesse dirigir o episódio protagonizado pela Liza”, conta Edebiri.

“O Urso” chega ao Brasil com todos os dez novos capítulos disponíveis no Disney+, após a fusão da plataforma com o finado Star+, onde antes a série era abrigada. Os atores sugerem que parte de uma quarta temporada já fora gravada. A depender do desempenho da série nas próximas premiações, as novidades não devem demorar a sair do forno.

O URSO (3ª TEMPORADA)

– Quando Estreia nesta quarta (17) no Disney+

– Classificação 16 anos

– Produção EUA, 2024

– Criação Christopher Storer

GUILHERME LUIS / Folhapress

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