OAB-SP diz ver retrocessos na gestão Derrite e cria comissão especial de segurança pública

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Preocupada com os rumos tomados pela política de segurança pública na gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), a seccional paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) decidiu criar uma comissão especial para tentar frear retrocessos que diz ver na profissionalização das polícias de São Paulo.

A comissão será presidida pelo advogado Alberto Zacharias Toron, e terá a participação de representantes de setores da sociedade civil, ainda a serem convidados pela OAB, como do Instituto Sou da Paz, da Conectas Direitos Humanos e das próprias polícias estaduais.

Segundo Toron, a decisão de criar o grupo foi tomada após uma série de notícias que trouxeram preocupação à entidade. Entre elas o aparente fim da política de redução da letalidade policial e a interferência do secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, na cúpula da Polícia Militar.

“A Polícia Militar, antes deste governo, vinha desenvolvendo um programa para diminuir a letalidade nas ações policiais. O que a gente vê, a partir dessa reforma empreendida pelo secretário, é que se abandonou esse programa, feito a duras penas, uma verdadeira conquista, um momento de superação da própria Polícia Militar em termos de métodos de trabalho”, disse o advogado.

O criminalista critica, nesse contexto, a ideia do governo paulista de adotar um modelo de câmeras corporais nas PMs com o botão de liga e desliga, abandonando o sistema atual de gravação ininterrupta.

“Isso é muito ruim, é um indicador, uma sinalização de um retrocesso em termos da ação policial. Nos parece muito ruim, nos preocupa, e nós vamos trabalhar essas e outras questões junto a outras entidades”, afirmou Toron.

Ainda conforme o advogado, conselheiro federal da OAB, Derrite fez uma espécie de “arrastão na cúpula da PM” para colocar pessoas afinadas politicamente a ele. “É uma espécie de instrumentalização da polícia.”

Conforme reportagens da Folha, o secretário movimentou 34 coronéis da cúpula da PM, mudanças feitas em fevereiro deste ano, e rebaixou de cargo os oficiais favoráveis às câmeras corporais e à política de redução da letalidade, como o coronel José Alexander de Albuquerque Freixo, subcomandante-geral. O oficial foi para reserva nesta semana, após um período de afastamento.

Para os postos-chaves, chamados internamente de núcleo da PM, Derrite indicou apenas oficiais alinhados a ele e todos com passagem pela Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar), principal tropa de elite da corporação e com histórico de altos índices letalidade nos enfrentamentos.

“Nossa preocupação é que a Polícia Militar volte a ser uma polícia que mate muito e faça pouco policiamento. Ou seja, uma polícia mais letal, uma polícia de pior qualidade”, disse Toron.

Entre outros pontos que devem ser acompanhados pela comissão é a crise entre as polícias Civil e Militar envolvendo a elaboração do Termo Circunstanciado pelos militares, e também apurações conduzidas dentro de batalhões que deveriam ficar à cargo de delegados e investigadores.

O advogado se refere ao episódio envolvendo a morte de um aposentado na zona leste da capital, em suposto tiro acidental de um sargento, e cuja prisão em flagrante do PM foi feita pela própria corporação. O caso só foi levado para a Polícia Civil tempos depois, após o caso ser revelado pela Folha.

“Não é só um problema de eventual despreparo, que me parece estranho esse disparo, ainda mais vindo de um sargento. Mas a questão fundamental é não ter sido levado o fato à delegacia de Polícia Civil, ficando no âmbito de uma investigação, entre aspas, corporativa da Polícia Militar.”

Toron continua: “Este assunto também se imbrica com outro, que é a questão da lavratura dos termos circunstanciados de ocorrência por policiais militares. Nós entendemos que essa é uma atividade privativa da Polícia Civil”.

Outro ponto de discórdia agravada na gestão Derrite foi a predileção de PMs por parte do Ministério Público em operações de combate ao crime organizado, em detrimento dos delegados.

“Me parece equivocada a ideia de levar apenas policiais militares e não trabalhar com a Polícia Civil. O que a gente vê é uma crescente militarização da segurança pública, e isso nos parece um grande equívoco. A Civil é uma polícia importante, com métodos importantes, e ela não pode ser alijada desse processo nas operações. É preciso questionar também ao Gaeco por que ele chama a PM e não a Polícia Civil.”

GOVERNO DIZ INVESTIR EM TREINAMENTO DE POLICIAIS

Desde o início da gestão atual, a Secretaria da Segurança Pública afirma ter investido para aprimorar e modernizar as políticas de segurança. Há avanços importantes como a manutenção de uma taxa de homicídios mais baixa e reduções expressivas em crimes violentos e contra o patrimônio.

“No ano passado, houve queda nas mortes intencionais, latrocínios, lesão corporal seguida de morte e em todas as modalidades de roubos. Nos primeiros quatro meses de 2024, a tendência se manteve, com recuo nos indicadores de homicídios, estupros, e nos furtos e roubos em todas as suas modalidades”, diz o governo, em nota.

A gestão Tarcísio cita também a quantidade de droga apreendida e de pessoas presas e apreendidas. Segundo o governo, o resultado faz parte de investimentos em tecnologia, veículos e amas, concentrando esforços para combater o crime organizado.

“A pasta também investe permanentemente na capacitação dos policiais e no aprimoramento dos procedimentos e estruturas investigativas de agentes das forças de segurança”, afirma.

O governo não fez comentários sobre o suposto fim do programa de redução de letalidade policial, nem sobre as críticas a uma possível interferência de Derrite na PM.

ROGÉRIO PAGNAN / Folhapress

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