OMS quer ressignificar o uso do fórceps e promover o parto vaginal operatório

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A OMS (Organização Mundial da Saúde) lançou esforços para aumentar a oferta do parto vaginal assistido —com utilização de fórceps ou vácuo extrator— em países de baixa e média renda.

Em documento publicado recentemente no periódico Bulletin of the World Health Organization, médicos e cientistas convidados pela entidade propõem um programa de pesquisa para melhorar a frequência e os resultados do parto assistido, também conhecido como parto vaginal instrumental ou operatório.

“Nas últimas três décadas, a proporção de todos os partos por cesariana aumentou de uma média global de cerca de 6% em 1990 para 21% em 2018. Ao mesmo tempo, o uso de parto vaginal assistido é principalmente limitado a países de alta renda, nos quais de 4% a 15% de todos os partos são assistidos com fórceps ou extrator a vácuo”, apontam os pesquisadores. Em países de baixa e média renda, a taxa é ainda menor, menos de 1% dos partos.

O documento lembra que muitas vezes o parto vaginal assistido é menos arriscado do que uma cesariana de emergência e destaca circunstâncias em que a opção é indicada: quando o colo do útero está dilatado, mas não ocorre a expulsão, e se a cabeça do bebê está profundamente encaixada no canal de parto e há sofrimento fetal.

“Nessas situações, e na ausência de ação para acelerar o parto, mulheres e bebês estão em maior risco de complicações como infecção, hemorragia, comprometimento fetal, asfixia ao nascer, aspiração de mecônio, consequências adversas ao longo da vida (incluindo fístula obstétrica nas mulheres e deficiências neurológicas no bebê), ou até mesmo morte”, afirma o grupo.

Há outras ocasiões em que a medida pode ser necessária, diz Eduardo Cordioli, diretor técnico de obstetrícia do Grupo Santa Joana. Uma mãe com problemas cardíacos que corre risco no trabalho de parto prolongado, por exemplo, pode ser auxiliada com o instrumento para abreviar a saída do bebê. “O parto vaginal operatório salva vidas”, defende o médico.

Mas retomar a prática como cuidado obstétrico de emergência pode não ser tão simples. Mônica Maria Siaulys, diretora médica do Grupo Santa Joana e uma das autoras do documento, afirma que será preciso revisitar a prática a partir de um novo olhar, em um contexto que integra as gestantes nos processos de tomada de decisão e prevê intervenções no trabalho de parto somente quando necessário.

Nesse sentido, a OMS promoveu um processo em três etapas: levantamento das pesquisas publicadas sobre os riscos e benefícios dos diferentes tipos de parto; consulta com 37 especialistas técnicos, incluindo profissionais de saúde, pesquisadores, formuladores de políticas e especialistas em saúde pública, selecionados por sua experiência, perspectiva e localização geográfica; e discussão dos achados e propostas com representantes de grupos de mulheres de 27 países.

Desse trabalho saiu o documento, que estabelece três principais áreas de pesquisa e ação, a começar pela desconfiança em relação ao uso de fórceps ou vácuo extrator. “Preocupações com segurança e medo de complicações associados à prática atuam como dissuasores tanto entre as mulheres quanto entre os profissionais de saúde”, dizem os pesquisadores.

Nos workshops, as mulheres relataram falta de segurança na prática e receio de eventos adversos, e lembraram que muitos equipamentos de saúde não tem a infraestrutura e os profissionais necessários em caso de complicações. Elas também destacaram o medo de abuso e desempoderamento no momento do parto.

O segundo ponto da agenda é treinar os profissionais de saúde em habilidades clínicas, mas também em cuidados respeitosos, comunicação, tomada de decisão compartilhada e consentimento informado. “O parto vaginal assistido não está isento de riscos, especialmente se realizado de forma inadequada ou por profissionais sem habilidades”, afirma o texto.

Existem diferentes tipos de fórceps e, apesar de os profissionais com especialidade em ginecologia e obstetrícia passarem por treinamento durante a residência, muitos não se sentem preparados. Com a queda na utilização e na própria taxa de natalidade, alguns não realizam as manobras há mais de dez anos, aponta Cordioli. A redução na exposição às técnicas também prejudica o contato com atualizações, como o uso de ultrassom para auxiliar no posicionamento do instrumento.

Por fim, o documento incentiva a identificação de barreiras e facilitadores para implementação do parto vaginal assistido como opção em casos de emergência. “É preciso desmistificar e ter ciência de que ele pode ser necessário”, defende Cordioli.

STEFHANIE PIOVEZAN / Folhapress

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTÍCIAS RELACIONADAS