SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – A ONG Innocence Project, iniciativa voltada a comprovar erros em condenações de inocentes no Brasil, pediu ao Superior Tribunal de Justiça a liberdade de um homem condenado pela morte de três pessoas, em Brasília. O crime ocorreu em 2009.
Três homens foram considerados culpados pelo crime. Leonardo Campos Alves, Francisco Mairlon Aguiar e Paulo Cardoso Santana foram condenados a penas que vão de 55 a 62 anos de prisão em julgamentos realizados pelo Tribunal do Júri entre 2012 e 2016. O trio foi acusado de matar a facadas o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral José Guilherme Villela, a advogada Maria Carvalho Villela e a empregada da família, Francisca Nascimento da Silva.
O Innocence Project alega que Paulo Cardoso Santana mudou a versão dada à Polícia Civil e inocentou Francisco Mairlon Aguiar. O argumento consta no pedido de habeas corpus impetrado no STJ nesta quinta-feira (1º) ao qual o UOL teve acesso. Os assassinatos ocorreram em 29 de agosto de 2009. O caso ficou conhecido como o Crime da 113 Sul, em alusão à quadra de Brasília onde as vítimas moravam.
Paulo Cardoso Santana deu a nova versão em depoimento à ONG, no dia 17 de janeiro, de dentro da prisão. Ele alegou que os depoimentos dados em 2010 foram feitos sob pressão da Polícia Civil do Distrito Federal.
Santana ressaltou que Mairlon não tem envolvimento com o crime. “Em nenhum momento a gente entrou em contato com Francisco Mairlon. Francisco Mairlon não tem nada a ver com isso aí. Ele é inocente, entendeu? Ele foi levado num processo a pagar por um crime que ele não cometeu. Ele tá há 14 anos inocente”, disse o homem em um vídeo exibido pelo Jornal Nacional.
No vídeo, o condenado afirma ainda que pretendia mudar a versão há anos. “Tem muitos anos que eu quero uma oportunidade dessa que eu estou tendo hoje. Até parece que foi Deus que tá trazendo isso para mim, pra dar uma vitória pra ele lá, porque ele merece. Porque ele tá pagando por um crime que ele não cometeu”, acrescentou.
ADVOGADA DIZ QUE FALTAM PROVAS PARA CONDENAR MAIRLON
A advogada Dora Cavalcanti, do Innocente Project, argumenta que a investigação foi falha. Ela defende que não houve provas técnicas que comprovassem o envolvimento de Mairlon no crime.
Sigilo do celular de Mairlon foi quebrado. A ONG argumenta que a linha telefônica atribuída a Mairlon na quebra do sigilo que antecedeu a pronúncia não era a mesma por ele utilizada em agosto de 2009.
Não há comprovação de DNA na cena do crime, diz ONG. “A perplexidade diante da ausência de confronto genético entre o DNA dos réus condenados e o material genético extraído dos diversos objetos e vestígios coletados na cena do crime só pode ser respondida com a recapitulação dos desmandos que caracterizaram a apuração das trágicas mortes desde o início”, defende Dora Cavalcanti.
No pedido de habeas corpus, a ONG diz que estudou o caso por meses. “Foram meses e meses dedicados à cuidadosa leitura das mais de 16.000 folhas dos autos, com a catalogação de todos os laudos periciais produzidos na fase de inquérito. (…)À medida que o estudo do caso avançava, ficava cada vez mais claro ter sido o paciente condenado exclusivamente com base em depoimentos colhidos na fase administrativa, que só passaram a inserir a pessoa de Mairlon no enredo criminoso depois de inúmeras mudanças de versão”, diz o documento.
Ministério Público diz que a nova versão não tem valor jurídico. O promotor Marcelo Leite Borges disse que os condenados já mudaram as versões outras vezes. “Uma alegação sem prova nenhuma, que quer fazer a gente reabrir toda a instrução de um processo transitado em julgado. Todos eles voltaram atrás nos seus depoimentos. Isso é mais uma manobra para tentar justificar a reabertura do caso”, lamentou Borges, em entrevista ao Jornal Nacional.
FILHA DO CASAL TAMBÉM FOI CONDENADA
Em 2019, o Tribunal do Júri condenou a arquiteta Adriana Villela, filha do casal, a 67 anos e seis meses de reclusão, em regime fechado. O julgamento durou 103 horas e foi o mais longo da história do Distrito Federal. Adriana Villela foi condenada por suspeitas de ter mandado matar seus pais.
Ela nega a acusação. Na época da condenação, o Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, afirmou que iria recorrer da sentença. Ela aguarda o julgamento de seu recurso pelo STJ em liberdade.
Na retratação feita à ONG, Santana também inocentou Adriana de ser a mandante. A suposta inocência dela, entretanto, não foi citada no pedido de habeas corpus impetrado no STJ.
Redação / Folhapress