SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Ministério Público realiza na manhã desta terça-feira (9) uma operação contra duas empresas de ônibus de São Paulo suspeitas de ligação com a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
A ação cumpre quatro mandados de prisão e 52 de busca e apreensão contra dirigentes das companhias Transwolff e Upbus.
As duas empresas de ônibus são responsáveis pelo transporte de ao menos 700 mil passageiros diariamente em São Paulo. Segundo o Ministério Público, o objetivo da operação é desarticular duas organizações que estariam lavando dinheiro do proveniente do tráfico de drogas, roubos e outros crimes.
Foram presos Luiz Carlos Efigênio Pacheco, dono da Transwolff, e Robson Flares Lopes Pontes, dirigente da Transwolff. Hélio Rodrigues dos Santos, secretário da empresa, foi preso em flagrante por porte ilegal de arma durante as buscas. O dono de um escritório de contabilidade também foi detido.
A Folha de S.Paulo acionou as empresas na manhã desta terça, mas até a publicação deste texto não houve manifestação. A reportagem ainda não conseguiu contato com a defesa dos presos.
A Justiça determinou o bloqueio de R$ 600 milhões em patrimônio para garantir o pagamento a título de dano moral coletivo. Também determinou que a SPTrans assuma a operação das linhas administradas pelas duas empresas na zona leste da capital.
Gilmar Pereira Miranda, secretário-executivo de Transporte e Mobilidade Urbana do município, afirmou em entrevista ao “Bom dia SP”, da TV Globo, que a operação das linhas está normal, e que a pasta vai se reunir para definir os próximos passos. Segundo o Ministério Público, as empresas receberam mais de R$ 800 milhões de remuneração da Prefeitura de São Paulo em 2023.
A Operação Fim da Linha é realizada pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público, Polícia Militar, Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e Receita Federal.
Os 52 mandados de busca e apreensão tem como alvo 39 pessoa física e 13 empresas. Do total, 41são da cidade de São Paulo e os demais são de Barueri, Cotia, Guarujá, Guarulhos, Itapecerica da Serra, Itaquaquecetuba, Itu, Mauá, Santana de Parnaíba, São Bernardo do Campo e São José dos Campos.
Segundo a Receita Federal, diante dos fortes indícios de irregularidades fiscais já identificados, o órgão deu início, durante o cumprimento dos mandados desta terça-feira, a 21 fiscalizações de pessoas físicas e jurídicas.
“Os contribuintes fiscalizados detêm, juntos, patrimônio total declarado de mais de R$ 148 milhões e movimentaram, apenas entre 2020 e 2022, mais R$ 732 milhões em suas contas correntes. A Receita Federal estima que serão lavrados autos de infração da ordem de R$ 200 milhões”, afirmou.
A Receita Federal, em investigações preliminares que subsidiaram a atuação do Ministério Público no caso, identificou a utilização de diversos esquemas tributários para lavagem de dinheiro do crime organizado.
Entre os mecanismos estão integralizações de capital social de empresas com valores sem origem lícita, movimentações financeiras atípicas e distribuições de lucro desordenadas e sem lastro financeiro.
“Mesmo em anos em que registravam prejuízos, as empresas alvo da operação distribuíam dividendos milionários a seus sócios. Por exemplo, um dos sócios recebeu mais de R$ 14,8 milhões em dividendos entre 2015 e 2022, período em que a empresa teve um prejuízo acumulado de mais de R$ 5 milhões. A distribuição de dividendos, além de ‘esquentar’ o dinheiro ilícito, possibilitava o não pagamento de tributos pelos beneficiários, uma vez que esse tipo de rendimento é isento de imposto de renda”, explicou a Receita Federal.
O órgão já identificou também que ao menos R$ 25 milhões em débitos de tributos federais foram objeto de compensações tributárias fraudulentas realizadas por uma das empresas. Após as compensações, a empresa conseguia obter Certidões Negativas de Débitos, documento indispensável para participar de licitações.
A Receita federal verificou ainda a realização de dezenas de operações de compra e venda de imóveis e de outros bens de luxo em uma complexa rede de holdings, empresas de participação e revendedoras de veículos de propriedade de terceiros relacionados aos contribuintes investigados.
“Os indícios demonstram tratar-se de uma rede de empresas interligadas por operadores principais, pessoas de confiança e ocultadores profissionais de bens, nos quais bens e valores adquiridos sem origem são ocultados das autoridades estatais”, afirmou.
Entre os bens que passaram por essas empresas, segundo a Receita, está, por exemplo, o helicóptero utilizado na morte de dois importantes líderes da facção criminosa e o apartamento da esposa de um traficante internacional. Uma revendedora de veículos de luxo, que é alvo das buscas, realizava compra e venda de carros de luxo, porém sem registrar o real proprietário dos veículos. Movimentações financeiras atípicas e inconsistências fiscais indicam que essas empresas também podem estar a serviço do crime organizado.
De acordo com a investigação, os esquemas contam com a participação de contadores experientes que viabilizam métodos complexos para lavagem de dinheiro, dissimulando a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores oriundos de atividades criminosas. Esses contadores também são alvo da Operação Fim de Linha.
Os mandados foram expedidos pela 1ª e pela 2ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital a partir de investigação do Ministério Público.
Iniciada nas primeiras horas da manhã, a operação mobiliza 64 integrantes do Ministério Público, 43 da Receita Federal, dois agentes do Cade e 340 policiais militares, além de agentes do setor de inteligência.
CRISTINA CAMARGO, FRANCISCO LIMA NETO E BRUNO LUCCA / Folhapress