Operações no exterior dificultam rastreio de lavagem de dinheiro com aeronaves

RECIFE, PE (FOLHAPRESS) – O crime de lavagem de dinheiro está na mira da Operação Integration, da Polícia Civil de Pernambuco, que apura a existência de uma suposta organização criminosa que atua por meio de jogos ilegais. A ação tem a influenciadora Deolane Bezerra e o cantor Gusttavo Lima entre os investigados —eles negam envolvimento.

A prática consiste em ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. “É nada mais do que um segundo momento do cometimento de um crime para garantir o proveito da ação criminosa”, explica o procurador Alfredo Falcão Júnior, do Ministério Público Federal.

A investigação desse crime busca saber se houve a retirada de dinheiro sem justificativa legal, como um um acréscimo de renda sem justificativa, e se esse aumento de renda foi disfarçado em uma operação jurídica para que as cifras pudessem ser usufruídas sem combate pelos órgãos do Estado.

No caso de Gusttavo Lima, a venda de uma aeronave chamou a atenção dos investigadores da Integration. O jato Cessna modelo 560XLS, de propriedade da empresa do cantor, foi vendido à JMJ Participações, de José da Rocha Neto, dono da casa de apostas VaideBet, um dos alvos da operação.

Já um Lamborghini Urus, ostentado nas redes sociais da advogada e influenciadora Deolane Bezerra, foi central para torná-la suspeita. O carro adquirido no segundo semestre de 2023 pertencia anteriormente à empresa Esportes da Sorte, apontada como principal agente no esquema, e foi revendido pouco tempo depois.

Segundo Falcão, a lavagem de dinheiro pode ser feita com qualquer bem, mas a estrutura por trás de contratos envolvendo aeronaves e outros veículos de luxo é importante para entender e decifrar esse tipo de crime.

“A facilidade que se tem para ter esses bens depende do alto poder aquisitivo do comprador. [Também tem que se observar] a facilidade que se tem para que eles sejam comprados no exterior e utilizando de mecanismos que ficam fora do radar dos órgãos de controle do sistema financeiro nacional, sobretudo o Banco Central e o Coaf”, afirma o procurador da República.

O Coaf é a unidade de inteligência de inteligência financeira do Brasil e tem entre suas atribuições a prevenção e o combate à lavagem de dinheiro.

“Pode-se comprar uma aeronave no exterior e, utilizando de mecanismos não oficiais, fazer com que esse dinheiro seja depositado no exterior sem que haja a remessa do Brasil para o exterior”, diz.

Para o procurador Cristiano Pimentel, do Ministério Público de Contas de Pernambuco, a legislação em vigor é bem formulada, e os problemas para a investigação não têm relação com ela.

“O grande problema do Brasil é a jurisprudência dos tribunais que muitas vezes tem sido muito leniente com a prática desse crime ou exigindo ao Ministério Público provas quase impossíveis para haver a condenação, porque o que vemos em outros país da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico] é que [o investigado] não comprovando a origem já está caracterizada a lavagem”, diz.

Pimentel avalia que não há uma uniformidade nos encaminhamentos jurídicos do Brasil quanto à possibilidade da polícia e do Ministério Público requisitarem relatórios ao Coaf. “Há decisões contraditórias a esse respeito.”

Em 2012, a lei 12.683 modificou as regras em vigor desde 1998 para endurecer penas por lavagem. Em caso de condenação, elas podem variar de três a dez anos de prisão, além de multa. A punição é aumentada de um a dois terços se o crime for cometido de forma reiterada ou por intermédio de organização criminosa.

Na opinião dos especialistas, o avanço das transações financeiras de forma eletrônica, como o uso maior de Pix, ajuda a reduzir as dificuldades para detectar uma eventual lavagem de capitais, na comparação com décadas anteriores.

“Quando os órgãos de controle evoluem conseguem mapear determinada forma de atuação criminosa, ela vai diminuindo e de repente surge outra forma de atuação criminosa. Por sua vez, os órgãos de controle vão tomando conhecimento”, diz Falcão, do MPF.

JOSÉ MATHEUS SANTOS / Folhapress

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