SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou, no início deste mês, a lei 14.965/2024, que prevê a realização de provas de concurso público federais de forma online. Apesar de o texto só começar a valer em quatro anos, as bancas organizadoras já se preparam para passar por essa transição.
Na prática, as grandes mudanças ainda dependem da regulamentação da modalidade, que deverá ser feita com base na realização de uma consulta pública. Apesar de outros tipos de exames e provas já seguirem o modelo, a lei eleva a discussão por passar a permitir a aplicação de prova online em concursos nacionais.
O Enem Digital, por exemplo, teve as suas condições estabelecidas por edital, sem a necessidade da criação de uma nova lei ou portaria.
A lei dos concursos federais online prevê que os concursos poderão ser feitos total ou parcialmente a distância e há previsão de garantia de acesso a ferramentas e dispositivos virtuais.
Cesgranrio, Ibade (Instituto Brasileiro de Apoio e Desenvolvimento), Cebraspe (Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos) e FGV (Fundação Getulio Vargas) Conhecimento são algumas das instituições que se preparam para a organização dos concursos no novo formato.
No entanto, professores ainda demonstram insegurança com relação à garantia de isonomia entre os candidatos.
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COMO AS PROVAS SERÃO REALIZADAS?
Carlos Augusto Costa, diretor-adjunto da FGV Conhecimento, explica que as provas digitais podem ser feitas de duas formas: em um ambiente controlado em que a banca fornece os equipamentos, a infraestrutura adequada e a presença de fiscais durante toda a execução, ou pode ser feita no ambiente do próprio candidato, com uma infraestrutura não padronizada.
“No ambiente controlado, a segurança, a acessibilidade e a equidade são garantidas de forma muito similar às provas feitas no modo tradicional, com papel e caneta. Já nas provas online, os mecanismos de segurança são diferentes e mais desafiadores”, diz.
COMO AS BANCAS ESTÃO SE PREPARANDO?
CESGRANRIO
Carlos Henrique Nogueira, superintendente de inovação e tecnologia da Cesgranrio, diz que a fundação possui ampla experiência na organização de avaliações e exames, “tanto no formato tradicional quanto digital, e está alinhada com as iniciativas do governo de incluir provas digitais em concursos públicos”.
Apesar de nenhuma das provas online realizadas até o momento pela fundação terem o mesmo tamanho de concursos públicos nacionais, a banca já organizou alguns exames similares, como o Enem Digital, que contou com cerca de 120 mil participantes em três edições.
“A experiência com provas online tem sido desafiadora, mas produtiva. Em avaliações realizadas pela Cesgranrio, milhares de candidatos já participaram, mas há variações no número dependendo da natureza do exame”, afirma
Algumas das principais dificuldades encontradas pela organização envolvem a garantia de segurança e integridade, o amplo acesso à internet e a avaliação do ambiente de prova.
“Nas avaliações feitas de forma remota, muitos candidatos realizam a prova de casa, o que exige mecanismos de controle mais rigorosos para garantir que todos estejam em condições adequadas e sem interrupções”, destaca.
Para garantir a igualdade entre os candidatos e evitar fraudes, a Cesgranrio utiliza alguns mecanismos específicos, como o monitoramento remoto via webcam e microfone; softwares de detecção de fraude; criptografia e rigoroso controle de acesso às plataformas de exames e a implementação de plataformas acessíveis que garantem a inclusão de pessoas com deficiência.
Nogueira destaca ainda que o aspecto psicológico e o preparo técnico dos candidatos para realizar provas digitais é um dos pontos a serem destacados. “Muitos ainda não estão familiarizados com o formato digital, o que pode gerar ansiedade ou dificuldades de adaptação.”
Para mudar essa situação, o especialista destaca a importância da implementação de testes preparatórios e simulados para familiarizar os candidatos.
IBADE
O Ibade terá a realização de seu primeiro processo seletivo de forma completamente online no dia 29 do próximo mês, com cerca de 700 inscritos. Até o momento, a banca já realizou algumas etapas do processo nesse formato como avaliações psicológicas, provas de títulos e cursos de formação.
“Os processos online devem ser analisados de forma a garantir a participação de todos”, afirma Marina Lutz, presidente do Ibade.
Marina diz ainda que as provas online trazem benefícios para participação de um número maior de candidatos, já que muitos concursos estaduais costumam ser realizados somente nas capitais.
“Isso reduz o custo para o candidato de participar do processo de seleção, aumentando as oportunidades”, afirma.
CEBRASPE
As primeiras provas online realizadas pela Cebraspe aconteceram em 2010 com a aplicação de exames de proficiência em espanhol. Desde então, a banca vem aumentando a presença dessa modalidade.
Claudia Griboski, diretora-executiva da Cebraspe, diz que a desigualdade social deve ser destaque nos debates sobre o novo modelo. “Sem isonomia, não há concurso público. Contudo, avanços são importantes para a modernidade do processo”, afirma.
FGV CONHECIMENTO
A FGV já realiza provas de processos seletivos nesse formato há algum tempo. Carlos Henrique Nogueira destaca que a conectividade e os requisitos mínimos são pontos importantes a serem considerados quando se utiliza a prova online em larga escala.
“Tecnologias de reconhecimento facial aliadas a elementos de visão computacional e captadores de ruídos de ambiente podem elevar o nível de segurança das plataformas, por exemplo.”
O especialista destaca também que a prova online representa uma avaliação mais completa, uma vez que verifica se o candidato tem habilidade para utilizar o computador.
A redução do uso de papel colaborando com a preservação do meio ambiente também é um ponto destacado pela instituições.
O QUE PENSAM OS PROFESSORES?
O advogado e professor do Brabo Concursos, Ivan Neto, considera positiva a realização de concursos com etapas que sejam online como já acontece na maioria dos processos hoje, mas vê riscos com relação a fraudes e aponta desafios na logística.
O professor questiona como situações específicas seriam lidadas pelas bancas, como a possibilidade de faltar internet na casa do candidato ou a necessidade de utilizar o banheiro no meio do certame. “A gente também precisa esperar a regulamentação para ver como o governo vai operacionalizar esse novo modelo”, destaca.
Eduardo Cambuy, professor do Gran Concursos, reforça a necessidade de determinação de regras claras que mantenham a economicidade e a celeridade do processo.
“É necessário estabelecer requisitos tecnológicos mínimos para participação, mecanismos de controle e bloqueio de ataques, formas de controle de ‘cola’ e fornecimento de igualdade de condições de acesso em um país tão diverso como o Brasil”, afirma.
JÚLIA GALVÃO / Folhapress