BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O placar apertado da votação da urgência dos primeiros projetos de corte de gastos na última quarta (4) foram um sinal de alerta para a base do governo Lula (PT) na Câmara, que irá precisar se movimentar para conquistar adesão se quiser aprovar todo o pacote.
A estratégia passará por maior atenção a PSD e União Brasil, disseram parlamentares à reportagem nesta quinta (5). As duas siglas ocupam cargos nos ministérios de Lula e foram importantes para o avanço de outras propostas do governo, mas estão insatisfeitas.
Os esforços agora estarão voltados para a negociação de mudanças em trechos dos textos que garantam votos dentro dessas duas bancadas, segundo um parlamentar do PT que atua nessa articulação.
O ministro Fernando Haddad, da Fazenda, apresentou três textos do pacote: a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) de corte de gastos, um projeto de lei complementar que limita o uso de créditos tributários e um projeto de lei ordinária que promove um pente-fino no BPC (Benefício de Prestação Continuada) e muda o reajuste do salário mínimo.
O imbróglio das emendas parlamentares, o conteúdo do pacote e a articulação política com o governo concentram as insatisfações dos parlamentares, que vêm travando o andamento da pauta.
Este cenário forçou o PT a recuar de iniciar a tramitação da PEC pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A votação da urgência dos dois outros projetos em plenário também precisou ser adiada.
A decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de impor ressalvas à liberação das emendas parlamentares, apenas dias depois da publicação de uma lei negociada com o governo, incomodou o Congresso.
Na quarta à noite, a aprovação da urgência dos projetos só foi possível, segundo dois líderes ouvidos pela reportagem sob reserva, após um apelo do presidente Arthur Lira (PP-AL). Até ali, além da oposição, as bancadas de PSD e União Brasil estavam contra o avanço das propostas.
Com a sessão já iniciada, Lira convocou os líderes para uma reunião às 19h30. De lá saiu um acordo para aprovar a urgência, mas sem compromisso com o conteúdo de cada projeto.
“Concluo parabenizando todos os líderes que permitiram que nós votássemos a urgência. A partir de segunda, terça e quarta [da próxima semana], vamos discutir o mérito, ouvir as bancadas e conversar com todo mundo”, afirmou o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).
Mesmo com a intervenção de Lira, as votações foram apertadas. Os requerimentos precisavam de 257 votos para serem aprovados e passaram com 260 (o projeto de lei complementar) e 267 (de lei ordinária). Para passar a PEC, o governo vai precisar do apoio de 308 parlamentares.
Dos 59 deputados do União Brasil, apenas 8 votaram a favor. Do PSD, foram 15 de 45.
Por outro lado, apoiaram a urgência 36 dos 50 nomes do PP e 41 dos 44 do Republicanos, partidos que são menos alinhados com o governo, mas que, por outro lado, sofrem maior influência de Arthur Lira.
Em todos casos, foi considerado o placar da urgência do projeto ordinário, que teve quórum maior.
Parlamentares disseram ter havido pouco tempo entre a reunião com o presidente da Casa e o início da votação, de modo que líderes não conseguiram conversar com as bancadas. Por isso, acreditam que é possível conquistar mais votos.
No caso de PP e Republicanos, o risco é que o apoio ao mérito não se repita, o que daria ainda mais peso à necessidade de adesão de PSD e União Brasil.
Os líderes destas duas últimas siglas são os candidatos preteridos na corrida pela sucessão da presidência da Câmara, o que ampliou a insatisfação das bancadas.
Antônio Brito (PSD-BA) votou a favor das urgências -e foi ao plenário pedir apoio de sua bancada à proposta, a que Lira agradeceu publicamente. Já Elmar Nascimento (União Brasil-BA) foi contra.
Nesta semana, o governo iniciou a liberação de R$ 7,8 bilhões em emendas e acionou a AGU (Advocacia Geral da União) para tentar fazer o ministro Flávio Dino, do STF, revisar parte das novas exigências.
Um importante aliado de Lira afirmou que essa movimentação pode ajudar a romper barreiras no União Brasil. Por enquanto, porém, o aceno não foi suficiente. Na base aliada, há a expectativa de que a sinalização de novos empenhos tenha o efeito de reduzir a resistência do Congresso.
No PSD, a insatisfação vai além das emendas ou do mérito do pacote. O partido se vê preterido na distribuições de cargos e merecedor de mais reconhecimento por parte de Lula, por ter entregue por volta de 40 de seus 45 votos nas principais pautas da Câmara até aqui.
Um dos pontos de maior reclamação dos deputados sobre o conteúdo das propostas é a possibilidade de cortes no BPC, benefício pago a idosos e a pessoas com deficiência de baixa renda. Mesmo a base do governo já fala em mudanças da PEC.
O governo Lula agora corre contra o tempo para aprovar o pacote neste ano, uma vez que os trabalhos do Legislativo vão até o dia 23 de dezembro, e também tramitam no Congresso outras pautas importantes, como a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a regulamentação da reforma tributária.
Do pacote anunciado em novembro, o governo ainda precisa enviar os projetos de revisão da aposentadoria dos militares, da ampliação da isenção do Imposto de Renda para R$ 5.000 e da taxação da renda a partir de R$ 50 mil. Esses devem ficar para 2025.
JOÃO GABRIEL E FERNANDA BRIGATTI / Folhapress