SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Moradores da região central de São Paulo foram surpreendidos nesta terça-feira (28) com o apagamento parcial da figura gigante da mulher de punho erguido e envolta na bandeira da cidade que se tornou símbolo recente do Carnaval de rua paulistano.
O painel, chamado “A Cidade é Nossa”, fica na empena cega de 50 metros de altura num prédio da rua da Consolação, perto da praça Roosevelt. A artista Rita Wainer pintou a obra de 1.500 m² em 2017, sob encomenda do Acadêmicos do Baixo Augusta, o bloco que nos últimos cinco anos vem colocando mais de milhares de foliões para dançar no maior cortejo carnavalesco da capital paulista.
O edifício no qual o mural foi feito pertence ao Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), que autorizou a obra. A faixa de tinta branca que apareceu sobre a lateral da pintura nesta terça foi aplicada com autorização da entidade.
Em nota, o conselho disse que o imóvel é sua antiga sede e está passando por “reformas estruturais necessárias”.
Fundador do Baixo Augusta e ex-secretário de Cultura da gestão do tucano Bruno Covas (1980-2021), o gestor cultural Alê Youssef diz que o mural foi também uma resposta ao que ele classifica como uma política de apagamento da arte de rua colocada em prática no início da gestão de João Doria.
Ainda em 2017, Doria mandou apagar grafites em muros da avenida 23 de Maio sob o argumento de que estavam deteriorados e pichados. Plantas foram colocadas no lugar, mas a ausência de conservação do jardim vertical gerou uma série de críticas.
Além disso, uma decisão judicial chegou a determinar multa à gestão municipal por dano ao patrimônio cultural. Diante da repercussão negativa, Doria abandonou o embate contra grafiteiros e passou a discutir uma política de arte de rua que só ganhou fôlego na gestão Covas.
“É um emblema da cidade, tem múltiplos significados e representa a volta da arte urbana num momento em que ela estava na contramão”, diz Youssef. “O desfile de 2017 foi o que trouxe elementos de luta pelo direito à cidade, a [atriz] Alessandra Negrini foi fantasiada de parque Augusta, para lutar pelo parque que ainda não existia na época.”
Covas, de quem Youssef foi secretário, era o vice de Doria, e assumiu o comando da prefeitura depois que o titular renunciou em 2018 para disputar o governo do estado.
Então prefeito, Covas morreu em maio de 2021 devido a um câncer, antes da inauguração oficial do parque Augusta –que foi renomeado para parque Prefeito Bruno Covas e inaugurado por seu sucessor, Ricardo Nunes (MDB), que atualmente comanda a cidade. Procurada, a gestão Nunes disse que o painel está em área particular e, portanto, não cabe à prefeitura interferir na decisão do proprietário.
Então prefeito, Covas morreu em maio de 2021 devido a um câncer, antes da inauguração oficial do parque Augusta –que foi renomeado para parque Prefeito Bruno Covas e inaugurado por seu sucessor, Ricardo Nunes (MDB), que atualmente comanda a cidade.
Procurada, a gestão Nunes disse que o painel está em área particular e, portanto, não cabe à prefeitura interferir na decisão do proprietário.
Questionado sobre isso, o Cremesp não comentou se há motivação política para apagar o painel.
Na nota enviada à Folha de S.Paulo, o conselho diz que “o prédio da rua da Consolação, 753, antiga sede do Conselho, recebeu a intervenção artística em fevereiro de 2017. A concessão fazia parte do projeto MAR (Museu de Arte na Rua), encampado pela Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo.”
A nota prossegue afirmando que o “Cremesp liberou a pintura por um tempo determinado, e esse prazo expirou”.
Youssef discorda da afirmação porque o projeto MAR é uma política da sua gestão na Cultura paulistana, que surgiu anos depois da instalação do mural.
“A intervenção foi feita diretamente pelo Baixo Augusta, paga pelo Baixo Augusta, em parceria com a Rita Wainer”, diz ele. “É absurdo que usem essa desculpa de uma política cultural que nem existia.”
Wainer e Youssef também disseram à Folha de S.Paulo que não foram procurados pelos proprietários do imóvel para discutir possibilidades de restauro.
A artista diz que o painel representa uma oposição à política em curso na época.
“Pintei esse mural logo após a ação de apagamento de obras de arte pela prefeitura. Foi um ato emblemático para mim, como artista mulher, ocupar a cidade pintando uma mulher como protagonista”, afirma. “Simboliza a força feminina e o protagonismo da mulher em todas as áreas. Somos grandes e somos muitas.”
CLAYTON CASTELANI / Folhapress