SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Brasil até pode viver uma polarização entre apoiadores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mas, nas eleições municipais deste ano, prevaleceu o pragmatismo, não a ideologia.
Partidos de centro foram os maiores vencedores no domingo (6), com 2.812 prefeituras conquistadas, 192 a mais do que em 2020. Siglas de direita, por sua vez, somaram 1.917, um recuo de 168 municípios em relação a quatro anos atrás, apesar do avanço em capitais. As de esquerda perderam 121 cidades e ficaram com a menor fatia, 742, menos de 15% do total.
Prefeituras de mais de 98 cidades ainda estão indefinidas ou com segundo turno marcado para o dia 27 de outubro ou sub judice, sendo 15 delas capitais, mas essas pendências são insuficientes para alterar o quadro geral.
Até porque a classificação dos partidos costuma deixar no campo da direita algumas agremiações que, a depender das circunstâncias, comportam-se como se fossem de centro e não recusam alianças com a esquerda.
O Republicanos talvez seja o melhor exemplo o partido mais que dobrou as cidades que controla, passando de 214, em 2020, para 430 agora, um avanço de 216 prefeituras.
Situado à direita do espectro ideológico, o partido tem em Tarcísio de Freitas seu maior nome. O governador de São Paulo é um dos principais aliados de Bolsonaro, mas isso não impede a sigla de ocupar um ministério de Lula.
O mesmo se diga do União Brasil, que, apesar de ter crescido pouco no domingo, é a quarta agremiação com mais prefeituras em todo o país. Posicionado ainda mais à direita que o Republicanos, o partido indicou três nomes para o atual gabinete petista.
À frente do Republicanos e do União Brasil no ranking de prefeitos eleitos estão três partidos de centro puro-sangue: PSD (878), MDB (847) e PP (743). Bem colocados no governo Lula, todos integraram chapas de oposição ao PT em várias cidades.
Grande vencedor do domingo, o PSD conquistou 216 prefeituras a mais do que em 2020 e conseguiu a façanha de ultrapassar o MDB em número de Executivos municipais controlados algo que nenhuma sigla tinha conseguido desde os anos 1980.
Fundado em 2011 por Gilberto Kassab com o discurso de não ser de direita, esquerda ou centro, o PSD tinha se tornado, antes desta eleição, o partido com maior número de prefeitos no país graças à migração de quadros de outros partidos.
Segundo levantamento da Folha de S.Paulo, de abril de 2024, o PSD tinha ao menos 1.040 prefeitos, um crescimento de 58% em relação ao resultado das eleições de 2020. De acordo com o mesmo levantamento, o PL, tinha passado de 344 eleitos para 371 prefeitos, crescimento de 8%.
Ainda que, por essa ótica, o PSD tenha perdido nas urnas posições que conquistou fora delas, o partido se estabeleceu como a maior força no âmbito municipal.
Logo atrás está o MDB, que tem perdido espaço ao longo dos anos, mas, nesta eleição, ganhou em 45 cidades a mais mesmo crescimento do PP.
O desempenho dessas siglas, todas elas com representantes do chamado centrão no Congresso Nacional, tende a ampliar a força delas nas negociações do Legislativo com o governo Lula, além de sinalizar dificuldades para a esquerda na corrida presidencial de 2026.
Para dirigentes de partidos do centrão, Lula se torna mais dependente dos aliados, com o desempenho fraco do PT nas capitais o partido não venceu o primeiro turno em nenhuma delas e não parte na liderança nas quatro em que vai disputar a segunda rodada de votação.
Por outro lado, o resultado do primeiro turno também mostrou o fortalecimento do bolsonarismo, nas primeiras eleições após o ex-presidente ter sido declarado inelegível. O PL obteve vitórias no primeiro turno em duas capitais e vai disputar o segundo turno em outras nove, sendo que em sete delas já larga na frente, incluindo colégios eleitorais importantes, como Belo Horizonte.
O presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, comemorou o desempenho e o creditou ao capitão reformado. “É o Bolsonaro. Bolsonaro é um fenômeno”, disse.
Ainda que Valdemar tenha ficado longe de acertar a projeção de seu partido eleger 1.500 prefeitos, a sigla venceu em 510 cidades, um avanço de 159 em relação ao 2020 crescimento inferior apenas ao do PSD e do Republicanos, o que transformou o PL na quinta força municipal.
Padrinho hesitante de Ricardo Nunes (MDB) na eleição em São Paulo, Bolsonaro agora promete mergulhar de cabeça na campanha.
O prefeito da maior cidade do país enfrentará o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), esperança do PT para a esquerda ganhar projeção.
A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, disse que o partido está tranquilo com o desempenho nas urnas. “Do ponto de vista do PT, não foi ruim. Melhorou em comparação a 2020. É preciso entender que a gente vive um processo de recuperação, reorganização”, disse.
O partido de fato conquistou 64 prefeituras a mais do que em 2020, o quarto maior avanço entre todas as agremiações. Os 248 prefeitos eleitos no domingo, contudo, não deixam a sigla nem perto de seu auge, em 2012, quando conquistou 626 cidades.
Com o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT), o partido encolheu nos municípios por duas disputas seguidas e só agora voltou a crescer, ocupando um modesto nono lugar no ranking de prefeituras.
O impeachment, porém, não vitimou somente o PT. O PSDB, arquirrival histórico do partido e segunda maior força até 2016, também despencou na lista de prefeituras. Os tucanos ainda comandam mais cidades (269) do que os petistas, mas nenhuma agremiação perdeu mais postos do que eles neste ano: são 266 municípios a menos.
UIRÁ MACHADO E DANIEL MARIANI / Folhapress