SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ministro Gurgel de Faria, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), definiu, nesta segunda-feira (16), que a 1ª Vara Federal de Três Lagoas, em Mato Grosso do Sul, será a responsável por decidir questões relacionadas à ação popular contra a venda da Eldorado Celulose pela J&F para a Paper Excellence.
A decisão, que analisa conflito de competência, é liminar, até que o mérito seja julgado, mas concentra de forma provisória as resoluções sobre o assunto em Três Lagoas, onde já existia uma ação civil pública iniciada pela Fetagri (Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Mato Grosso do Sul).
A Paper viu o despacho de Gurgel de Faria como uma vitória porque teria tirado, na visão da empresa, o poder das mãos do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), no qual o desembargador Rogério Favreto havia dado liminar impedindo a transferência das ações da Eldorado para a companhia de origem indonésia.
A J&F não entende o motivo para a comemoração da rival. A determinação vale, segundo o texto do ministro, para “decidir provisoriamente sobre questões urgentes relacionadas à ação popular” e até que o próprio STJ julgue o mérito da competência.
Gurgel de Faria negou o pedido da Paper para suspender a eficácia das decisões dadas pelo TRF-4 no caso. Entre elas, a que impede a transferência acionária.
A J&F, holding dos irmãos Joesley e Wesley Batista, aceitou vender a Eldorado para a rival por R$ 15 milhões em 2017. No ano seguinte, elas começaram a brigar e o caso se tornou um emaranhado de ações paralelas, arbitragens e discussões a respeito de terras em posse de estrangeiros.
Entre todas as disputas, a principal se tornou exatamente o conflito de terras. A ação popular em Chapecó e a ação civil pública de Três Lagoas questionam a mesma coisa: que a Paper, uma empresa brasileira de capital estrangeiro, não pode ser dona do espaço territorial que pertence ou está arrendado pela Eldorado sem autorização do Congresso Nacional.
Foi por isso que Favreto deu liminar impedindo a formalização do negócio.
Ao se manifestar contra o pedido da Paper de suspender as decisões do TRF-4, a holding dos Batista argumentou haver “risco de prejuízo irreparável à J&F, à Eldorado e à soberania nacional.”
Gurgel de Faria despachou que, enquanto o STJ não julga a questão, o melhor seria concentrar as decisões urgentes em Três Lagoas, por ter sido distribuída antes do processo catarinense. Assim se evitariam decisões conflitantes sobre o mesmo tema.
Mas determinou também que a reversão das decisões do TRF-4, como deseja a Paper, deve ser buscada “no âmbito da própria ação popular”, recusando-se a anular os efeitos da liminar de Favreto.
Pessoas da Paper disseram que essa questão é acessória. O mais importante seria mudar o foco das ações para Três Lagoas. Consideram que a questão em Chapecó foi instrumentalizada pela J&F (o que a empresa nega) na figura do ex-prefeito Luciano Buligon, autor do processo. Alegam que a Eldorado não tem nenhuma terra na região e Três Lagoas, onde está a sede da Eldorado, está a mais de mil quilômetros de distância.
A J&F ressalta que a Paper já havia pedido também a extinção da ação em Três Lagoas e perdeu. Os mesmos pedidos negados por Gurgel de Faria também não teriam sido atendidos no STF (Supremo Tribunal Federal), pelo ministro Kassio Nunes Marques.
O STF delibera desde 2015 ação da SRB (Sociedade Rural Brasileira) que busca confirmar entendimento que iguala empresas brasileiras a empresas brasileiras de capital estrangeiro, o que seria uma liberação para o investimento internacional. Não há decisão até o momento.
À reportagem o presidente da Paper no Brasil, Claudio Cotrim disse que terras não são o negócio da companhia, que se comprometeria a se desfazer delas assim que assumisse o comando definitivo da Eldorado. Este compromisso foi protocolado no Incra, na AGU (Advocacia-Geral da União) e apresentado no STF.
A confiança da J&F se apoia em artigos do contrato de compra e venda. Um deles determina que a Eldorado deve manter a quantidade de hectares explorados pela empresa, considerados os ativos florestais em 31 de dezembro de 2016. Isso significa 230.591 hectares plantados, sem contar áreas de preservação.
A Paper sempre rebateu que em nenhum momento das negociações com a J&F a questão das terras foi citada e que se tornou o foco apenas quando as divergências entre as partes começaram a aparecer. A empresa insiste que seu negócio não é ser dona ou arrendatária de terras e isso se aplica a todos os empreendimentos do grupo. Para ela, a discussão trata-se apenas de uma estratégia da rival para não entregar o comando da Eldorado.
ALEX SABINO / Folhapress