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Pesquisadores criticam resolução do CFM que barra bloqueio hormonal para crianças trans

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pesquisadores brasileiros associados à USP (Universidade de São Paulo) publicaram um artigo na revista científica Nature em que criticam a resolução 2427 do CFM (Conselho Federal de Medicina) que vetou o uso de bloqueadores hormonais em crianças e adolescentes trans.

O artigo “The Global Rollback of Transgender Care, Science and Rights” fala sobre retrocesso global na saúde, na pesquisa e nos direitos trans e é assinado pelos pesquisadores Igor Longobardi, Bruna Caruso Mazzolani, Hamilton Roschel, Bruno Gualano, que é colunista da Folha de S.Paulo, e Alexandre Saadeh.

A medida do conselho, aprovada no início de abril deste ano, proíbe o bloqueio hormonal para mudança de gênero em crianças e adolescentes e aumenta de 18 para 21 anos a idade mínima para realização de cirurgias.

Entidades já haviam se manifestado sobre o tema, se posicionando contra a nova resolução.

O artigo diz que as mudanças nas diretrizes brasileiras ecoam movimentos similares ao redor do mundo. O tema tem sido caro para a segunda gestão do presidente americano Donald Trump. Nos primeiros dias de mandato, um decreto presidencial restringiu a identificação de gênero em documentos oficias a duas opções: homem ou mulher. Relatórios do governo também questionam as evidências que sustentariam a terapia hormonal.

Antes da resolução aprovada em abril, o tema era regido por outra diretriz do CFM, de 2019, que permitia o a reposição de hormônios sexuais para feminização ou masculinização a partir dos 16 anos e a cirurgia a partir dos 18. O bloqueio dos hormônios sexuais, feito com análogos de hormônio liberador de gonadotrofinas (GnRH), estava previsto nos estágios iniciais da puberdade.

Para os pesquisadores brasileiros, o texto representa um retrocesso no acesso à saúde pela população trans. É o que pensa Alexandre Saadeh, um dos maiores especialistas do tema no país e um dos autores do artigo.

Saadeh afirma que a resolução aprovada em 2019 contou com amplos debates entre vários setores envolvidos no tema. “[A resolução de 2019] levou dois anos de preparação, ouviu outros órgãos, outros conselhos federais, como psicologia e serviço social, ouviu famílias de crianças e adolescentes trans”, diz. “Foi aprovada por unanimidade em 2019.”

Acontece que, em 2020, quando ia ser publicada, os conselheiros eram outros. “Muitos conservadores foram eleitos”, diz Saadeh. A resolução foi para votação novamente e passou com 70% dos votos.

O médico avalia que, além de restringir o acesso à saúde para a população trans, a resolução atual cria um campo minado para a pesquisa no tema. Segundo Saadeh, o percentual de pessoas trans no Brasil fica entre 1% e 2% da população, o que dificulta a criação de uma amostragem significativa. “Se publicássemos qualquer estudo com dez, 15 ou 20 casos, eles diriam que é irrelevante”, afirma.

Ele ressalta, ainda, que os ambulatórios que acompanham crianças e adolescentes trans não fazem busca ativa de pacientes e que são procurados pelas famílias.

Uma das motivações para que o CFM tenha alterado as diretriz é, segundo Saadeh, a crença de que o procedimento de transição de gênero é castrador. “Isso não tem o menor sentido. Se fosse falar disso, o bloqueio também é usado para puberdade precoce. Qual é o problema e usar para a população trans?”

É sob esse pretexto que a idade para as cirurgias subiu para 21 anos. É a idade mínima estabelecida para procedimentos como laqueadura e vasectomia.

Os possíveis impactos dessa mudança incluem prejuízos físicos e psicológicos. Os adolescentes que fazem uso do bloqueio hormonal vão precisar de mais dois anos desse tratamento, até atingir a maioridade que permite o tratamento com hormônios sexuais. Isso significa, segundo Saadeh, maior risco de desmineralização óssea, já que são os hormônios sexuais que ajudam na fixação do cálcio nos ossos.

Além disso, há o risco de adoecimento psíquico e até o uso indevido de bloqueador e de hormônios. “É fácil conseguir essas substâncias no Brasil”, diz o médico. “A população fica desesperada.”

A resolução foi judicializada. Ainda em abril, entidades LGBTQIA+ entraram com uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) no STF (Supremo Tribunal Federal) visando derrubar a norma. O ministro Cristiano Zanin foi escolhido como relator da ação. A notícia foi bem-recebida pelo CFM.

Na última quarta-feira (25), o Ministério Público Federal pediu a suspensão do texto à Justiça. A Procuradoria solicitou a aplicação de multa no valor de R$ 3 milhões ao conselho por danos morais.

BÁRBARA BLUM / Folhapress

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