BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O mundo político tem aproveitado o grande interesse nas Olimpíadas para tentar explorar politicamente os jogos de Paris.
De um lado, aliados do presidente Lula (PT) enalteceram o fato de diversos representantes brasileiros receberem o Bolsa Atleta, programa criado pelo petista em 2005.
Do outro, bolsonaristas usaram a ida da primeira-dama, Rosângela Lula da Silva, a Janja, a Paris para criticar o governo e atacaram uma montagem do Ministério das Comunicações sobre foto da ginasta Rebeca Andrade.
Os jogos ainda serviram para reforçar pautas tradicionais da direita, com a exaltação da origem militar de Beatriz Souza, medalhista de ouro no judô, e declarações sobre identidade de gênero fomentadas por acalorado debate sobre o boxe feminino.
Aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ainda buscaram vincular o governo petista à taxação da premiação para medalhistas, embora a cobrança de imposto exista desde a década de 1970 e também tenha sido realizada na gestão Bolsonaro.
A polarização chegou às Olimpíadas logo na abertura do evento. A encenação muito parecida com uma paródia do quadro a “Última Ceia” de Leonardo da Vinci com transgêneros e drag queens foi combustível para direita, não só no Brasil.
A ultradireita francesa, liderada por Marine Le Pen, voltou-se contra a cena, e os aliados de Bolsonaro aproveitaram o embalo nas redes sociais.
O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) foi um dos primeiros a criticar e, depois, foi acompanhado por diversos outros parlamentares de seu partido.
“As Olimpíadas começaram fazendo uma zombaria demoníaca da fé cristã”, escreveu nas redes sociais.
A Igreja Católica francesa também fez críticas à apresentação. O diretor da cerimônia de abertura, Thomas Jolly, afirmou que a obra de da Vinci não foi a inspiração da cena.
Os organizadores das Olimpíadas, por sua vez, declararam que “nunca tiveram a intenção de desrespeitar qualquer grupo religioso”.
“Pelo contrário, acho que tentamos celebrar a comunidade, a tolerância. Acreditamos que essa intenção foi alcançada. Se alguém se sentiu ofendido, é claro que lamentamos muito.”
No Brasil, uma publicação do Ministério das Comunicações que trocou a imagem Rebeca no pódio da ginástica artística por um computador, para divulgar um programa de conectividade, foi criticada.
Por outro lado, postagem do Banco Central que abordou de outra forma as conquistas das atletas recebeu engajamento positivo.
A autoridade monetária compartilhou a foto em que as atletas aparecem fazendo uma selfie e é possível ver uma cédula guardada na capa de celular da ginasta Julia Soares.
“Conquistar uma medalha inédita é coisa de brasileiro. Guardar dinheiro na capinha do celular, também.”, publicou a conta.
Mas o debate de fundo político que mais dividiu as redes sociais diz respeito à participação de duas atletas no boxe feminino.
A argelina Imane Khelif e a taiwanesa Yu Ting Lin haviam sido desclassificadas do Mundial 2023 pela IBA (Associação Intenacional de Boxe), sob a justificativa de terem sido reprovadas em testes de elegibilidade para a disputa feminina -não se esclareceu exatamente quais testes foram esses.
Ambas, no entanto, foram consideradas aptas para os Jogos de Paris pelo COI (Comitê Olímpico Internacional), que acata a designação sexual impressa no passaporte dos atletas.
A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) foi uma das que abordou o tema no campo bolsonarista.
“As mulheres desportistas não deveriam ser obrigadas a aceitar esse absurdo, e nós também não devemos ficar passivos diante de tamanha injustiça”, escreveu.
O tema, inclusive, virou pauta de projeto de lei na Câmara. O deputado Daniel Freitas (PL-SC) quer aprovar uma lei para proibir em todo país que atletas transexuais participem de competições femininas.
A deputada Erika Hilton (PSOL-SP), primeira integrante da Câmara negra e transexual, por sua vez, saiu em defesa das duas atletas.
Ela afirmou que a extrema direita criou uma mentira para “deslegitimar todas as mulheres que não seguem um determinado padrão do que é ser mulher”.
“Esses grupos se uniram de vez, pra dizer que duas mulheres cis, por nasceram com hormônios e melanina demais, não são, de fato, mulheres. A distância do que eles estão fazendo pra antiga prática de dizer que negros não eram humanos, com base em medições cranianas, é mínima”, publicou nas redes sociais.
Janja, por sua vez, foi alvo alvo dos bolsonaristas devido aos gastos com sua ida aos Jogos de Paris para representar Lula. Ao todo, como mostrou a Folha, o governo gastou R$ 83,6 mil em passagens para ela acompanhar o evento.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) compartilhou uma montagem em que cita os impostos que as medalhistas irão pagar e diz que Janja “não fez nada pelo Brasil” e ainda gerou custos aos cofres brasileiros.
Lula, por sua vez, tentou lucrar politicamente com o Bolsa Atleta e anunciou reajuste do benefício, o que não ocorria havia 14 anos, pouco antes dos jogos. Em 11 de julho, o mandatário sancionou o aumento de 10,8% da bolsa.
“Ficou invisível o Bolsa Atleta para as pessoas que governaram esse país nos últimos anos” disse Lula. “Tudo na vida é reajustado, o preço da comida que a gente compra todo dia no supermercado, o preço da inflação, o salário mínimo, por que não o Bolsa Atleta?”.
MATHEUS TEIXEIRA / Folhapress