BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Comissão de Infraestrutura do Senado aprovou, nesta terça-feira (10), o relatório do senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator do projeto de lei que pretende ser o novo marco regulatório das eólicas em alto-mar. Com a aprovação do texto na íntegra, o PL 576/21 segue, agora, para votação no plenário do Senado, em sessão prevista para ocorrer já nesta quarta (11).
Ao manter o texto como recebido da Câmara, os senadores decidiram manter no PL uma série de emendas parlamentares sem nenhuma relação com o texto original, atendendo aos anseios da indústria do carvão mineral e do gás fóssil.
Durante o debate realizado antes da votação, o governo argumentou que é favorável ao projeto, mas que deveriam ser retirados do texto os jabutis incluídos na Câmara, por não terem nenhuma relação com o texto original que nasceu no Senado.
O senador Otto Alencar (PSD-BA) chegou a apresentar um “destaque”, um tipo de pedido para que os artigos que atendem aos planos das usinas de carvão e gás fossem excluídos, para serem tratados em outro projeto. Sua proposta, no entanto, foi voto vencido.
Depois de a comissão aprovar o relatório do senador Weverton Rocha, os parlamentares votaram, em separado, se eram contra ou a favor da supressão dos jabutis. Por 14 votos a 3, a ideia foi derrubada, o que também significou uma derrota para o governo.
“O governo apoia a emenda supressiva do senador Otto Alencar. Não vejo sentido em colocar, ao lado de uma energia limpa, uma energia a carvão. É um ponto negativo do projeto, uma fonte que outros países estão descartando”, disse o líder do governo na casa, senador Jaques Wagner (PT-BA).
A aprovação do PL não indignou apenas boa parte dos integrantes do setor elétrico -com exceção dos beneficiados-, mas também organizações socioambientais.
“Em mais uma demonstração da realidade paralela e invertida que tem marcado grande parte do posicionamento do Congresso Nacional, a Comissão de Infraestrutura do Senado acaba de aprovar o PL sobre as eólicas offshore com um texto que tem embutido jabutis, dispositivos voltados a fomentar combustíveis fósseis, que não têm nada a ver com o tema da proposição inicial”, diz Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima.
A especialistas lembra que o Brasil precisa, com urgência, de uma lei regulando as eólicas offshore, até mesmo porque os licenciamentos ambientais no Ibama estão parados pela falta dessa regulação, mas que isso não pode ser feito ao custo de beneficiar fontes sujas e que devem ser reduzidas da matriz elétrica.
“O lobby do carvão e do gás aproveita essa situação e está nos impondo a intensificação da carbonização em plena crise climática. Se isso passar no plenário, espera-se que o Executivo vete esses jabutis integralmente. Impõe-se o afastamento total desses jabutis”, afirmou Araújo.
Originado no Senado, o PL 576/21 chegou a ter apoio do setor elétrico em sua versão original, mas ganhou emendas jabutis na Câmara, o que desfigurou a versão original. Com a nova redação, houve aumento do prazo de geração de usinas a carvão de 2028 até 2050, além da obrigação de contratação de usinas a gás fóssil, com exigência de funcionarem até 70% dos dias do ano.
Nos cálculos da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, se a proposta avançar como está, tem potencial de elevar em 25% as emissões de gases de efeito estufa oriundos do setor. As emendas obrigarão o país a emitir cerca de 252 milhões de toneladas (Mt) de CO2, ou o equivalente à média de 10 Mt de CO2 por ano, até 2050, ano em que o Brasil planeja atingir a neutralidade climática.
O impacto econômico total do PL 576/21 pode chegar a R$ 658 bilhões, ou R$ 25 bilhões por ano. Isso representa um aumento de 11% na conta de energia dos brasileiros.
Caso o PL seja aprovado pelo plenário do Senado, o texto seguirá para a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pode vetar ou não trechos do texto. Isso não significaria, porém, que os jabutis estariam banidos, porque o parlamento poderia apresentar, ainda, uma proposta de decreto legislativo, que iria à votação, para tentar derrubar o veto do presidente.
O presidente da Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais), Flávio Roscoe, disse que o PL prejudica a transição energética do Brasil, ao incluir as usinas termelétricas a carvão, o que pode gerar um acréscimo de R$ 25 bilhões anuais nas contas de energia até 2050. “Essa tentativa vai na contramão dos compromissos que o país vem assumindo em favor da descarbonização”, disse.
De acordo com a Fiemg, as termelétricas a carvão têm emissões de gases de efeito estufa 34 vezes maiores que as hidrelétricas, quando se considera o ciclo de vida das atividades. Além disso, seu custo quase duplica em relação às fontes hídricas. “Como um país escolhido pela Opep+ para liderar a transição energética pode optar por um caminho tão desalinhado com o futuro sustentável que defendemos?”, questionou Roscoe.
ANDRÉ BORGES / Folhapress