Plástico já chegou a 92% dos recifes de corais oceânicos, revela estudo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O plástico já atinge cerca de 92% dos recifes de corais rasos do planeta, revela um novo estudo publicado nesta quarta-feira (12) no periódico científico Nature, um dos mais importantes do mundo.

De acordo com a pesquisa, que foi coordenada pelo brasileiro Hudson Pinheiro, do Cebimar (Centro de Estudos de Biologia Marinha) da USP, e com a participação de pesquisadores de 30 países e territórios, a quantidade de plástico presente nos oceanos afeta organismos que vivem tanto em ambientes próximos às regiões costeiras, onde há alta densidade populacional, mas também naqueles distantes e em regiões remotas, como ilhotas isoladas no meio do Pacífico.

“Ao fazer um levantamento das espécies presentes em muitos desses corais mesofóticos [como são chamados os de profundidade até 150 m], resolvemos também quantificar a quantidade de lixo plástico encontrado, e vimos dejetos em 77 dos 84 (91,7%) locais estudados”, disse o biólogo, que também é pesquisador associado da Academia de Ciências da Califórnia em São Francisco, à Folha.

“São restos de rede, linhas de pesca e espinhel que preocupam por mostrar que esses ecossistemas, embora mais distantes da costa e de maior profundidade, não estão salvos da sobrepesca e da atividade humana”, explica.

Ainda, o estudo identificou quatro fatores de risco associados a uma maior exposição ao plástico, sendo eles: maior profundidade; maior densidade populacional a um raio de dez quilômetros do local; proximidade com zonas de atividade pesqueira (mercados); e proximidade às unidades de proteção marinha.

Recentemente, um outro estudo indicou que aves marinhas que fazem migração no período reprodutivo e acessam ilhas isoladas estão sob risco de encontrarem o lixo plástico nos oceanos.

O problema do lixo plástico nos oceanos é crescente e faltam políticas públicas globais que tentem contornar o despejo inadequado do resíduo, avalia o pesquisador.

Embora a maioria do lixo plástico encontrado no estudo nos locais mais fundos do oceano tenha origem na atividade pesqueira (73%), há uma alta concentração também de plástico em áreas costeiras associado ao consumo humano, como embalagens plásticas.

“São restos de rede, linhas de pesca e espinhel que preocupam por mostrar que esses ecossistemas, embora mais distantes da costa e de maior profundidade, não estão salvos da sobrepesca e da atividade humana”, disse Hudson Pinheiro, biólogo, pesquisador do Cebimar (USP) e Academia de Ciências da Califórnia.

A ideia de medir a extensão do plástico encontrado nos oceanos ocorreu por acaso, explica Pinheiro. Desde 2014, ele e colegas faziam pesquisas sobre a biodiversidade presente nos recifes mesofóticos nas Filipinas, quando viram que havia um acúmulo muito grande de dejetos nestas áreas.

Mapearam então 84 zonas recifais em 25 locais nos oceanos Atlântico, Pacífico e Índico e fizeram linhas de exploração que se estendiam por 20 metros (chamadas transectos). No final, tinham uma espécie de grade onde era possível extrapolar a concentração de plástico por quilômetro quadrado na área explorada. Os recifes também foram avaliados segundo a sua distância de regiões densamente povoadas na costa (em população por km2).

Dentre os locais com maior concentração estão as Filipinas, as ilhas Comores e a região oceânica do Brasil. Nas ilhas Comores foi observada a maior concentração de lixo, com 520 dejetos plásticos encontrados em uma área equivalente a um campo de futebol (1,08 ha).

Pinheiro explica que as Filipinas são um dos lugares mais diversos de vida marinha no mundo, onde são conhecidas dezenas de espécies de peixes, corais, anêmonas, e outros organismos que só vivem lá, mas a região da costa amazônica, como no recife da foz do Amazonas, pode abrigar uma diversidade ainda desconhecida.

“Existem áreas que deveriam ser consideradas para uso [exploração] e áreas prioritárias para conservação, e a foz do Amazonas deveria ser prioritária para conservação”, diz, mencionando a área que está no centro da discussão de um pedido de perfuração para pesquisa de petróleo pela Petrobras.

Como os recifes corais costeiros são, em geral, sujeitos às movimentações da maré e das correntes marítimas, a deposição dos plásticos costuma não ocorrer nesses lugares com tanta frequência.

Isso explica em parte porque houve uma maior concentração de resíduo plástico em locais mais fundos no oceano e próximos aos chamados giros oceânicos, áreas de intensa atividade marítima e que acabam concentrando “bolhas” de poluição plástica.

“Existem áreas que deveriam ser consideradas para uso [exploração] e áreas prioritárias para conservação, e a foz do Amazonas deveria ser prioritária para conservação”, disse Hudson Pinheiro.

O estudo encontrou mesmo em locais remotos, onde não há uma densidade populacional significativa, o impacto da atividade humana.

“Em uma das áreas mais remotas marinhas do Brasil, no arquipélago de São Paulo, vimos um tubarão-bruxa a 130 m de profundidade com uma linha de pesca agarrada na boca. Então estamos em um local, no meio do oceano atlântico, distante da costa e com essa pressão nos ecossistemas devido à atividade humana”, finaliza.

PLÁSTICO TAMBÉM SE ACUMULA EM LAGOS

Em um outro artigo publicado também nesta quarta-feira (12) na revista Nature, pesquisadores procuraram por microplástico presente em 38 lagos e reservatórios de água doce presentes em 23 países do Hemisfério Norte.

No estudo, liderado pela pesquisadora do departamento de ciências da terra e do meio ambiente da Universidade de Milão-Bicocca (Itália), Veronica Nava, os cientistas viram que os lagos podem servir como “armadilhas” e guardar altas concentrações de resíduo plástico ao longo do tempo.

O resultado surpreendeu porque alguns dos lugares amostrados tinham concentrações de plástico maiores até do que o oceano, conhecidos por serem os mais atingidos pela poluição plástica aquática.

“É mais surpreendente o que encontramos nos grandes lagos, com altas concentrações [de microplástico] e o fato de que eles estavam presentes em todos os locais estudados”, disse a pesquisadora à Folha.

Um destes locais foi o lago Lugano, na Itália, com 11,5 partículas de plástico por milhão (ppm). Outros incluem o Maggiore (também na Itália), o Tahoe (Califórnia, Estados Unidos) e o Avery (Michigan, EUA).

A maior parte do plástico encontrado era composto de fibras (49,5%) e fragmentos (41%), que podem ter sido liberadas ou como subproduto da lavagem de roupas ou por decomposição de embalagens plásticas e tecido.

Apesar das concentrações e tipo de material terem variado de lugar para lugar, os cientistas identificaram dois padrões nos locais com maior resíduo plástico, sendo o primeiro quanto mais profundo e largo for o lago e, assim, maior o volume d’água encontrado, e o segundo o impacto da atividade humana.

Como muitos dos lugares estudados utilizam os lagos para lazer ou consumo humano, os pesquisadores fazem um apelo: esta quantidade de microplásticos pode afetar o sistema ali presente.

“Fornecer dados confiáveis sobre contaminação do plástico no meio ambiente é fundamental no sentido de entender os impactos, considerando que é uma classe muito complexa de polímeros diferentes, assim como os dados ambientais para entender em que nível os organismos estão expostos”, completa.

ANA BOTTALLO / Folhapress

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