Polícia Civil confirma que torcedor morreu após ser atingido por ‘bean bag’, munição usada pela PM

Rafael fazia parte de torcida organizada | Foto: Reprodução

A Polícia Civil confirmou que o torcedor do São Paulo Rafael dos Santos Tercilio Garcia, 32, morreu por ter sido atingido na cabeça por uma “bean bag”, um tipo de munição utilizada pela Polícia Militar em substituição às balas de borrachas.

Garcia, que era surdo, morreu durante as comemorações do título da Copa do Brasil nas imediações do estádio do Morumbi, na zona oeste de São Paulo, na noite do último domingo (24).

A causa da morte foi um traumatismo crânio-encefálico, e um laudo preliminar aponta que ele foi atingido pela bean bag, segundo a chefe do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), delegada Ivalda Aleixo. A informação foi antecipada pela reportagem, que teve acesso a imagens de dentro do hospital municipal do Campo Limpo, na zona sul, enquanto Garcia era atendido.

A delegada ressaltou que o autor do disparo não foi identificado e que uma perícia conclusiva ainda deve ser feita para confirmar a causa da morte. A SSP confirmou que a munição foi utilizada por policiais militares na ocasião, mas a investigação não descarta a possibilidade de alguém de fora da corporação ter feito o disparo.

A bean bag é um tipo de saco que encobre diversas esferas de metal. Uma imagem do caso mostra sacola semelhante a essa munição, cheia de sangue e com as esferas de metal dentro. O objeto estava em um saco plástico transparente, como se estivesse sendo preservado para perícia.

Ao ser atingido, conforme um documento assinado por um médico legista, Garcia estava com um boné na cabeça, que foi perfurado. O torcedor foi encontrado desacordado por policiais militares logo após uma confusão nas imediações do estádio Cícero Pompeu de Toledo.

A Polícia Civil agora investiga de onde partiu o disparo e quem foi o autor. Segundo a delegada, foram coletadas outras três munições do tipo bean bag nos arredores do estádio, além de pedaços de madeira e garrafas de vidro.

Investigadores devem procurar registros do disparo nas imagens de câmeras de segurança e compará-las com imagens feitas com drones da polícia na última terça-feira. A primeira testemunha a ser ouvida será a mãe da vítima.

A delegada quer entender qual era o nível de surdez e de autonomia de Garcia e se ele costumava ir a estádios e a eventos eventos sozinho, por exemplo.

A SSP (Secretaria da Segurança Pública) da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), por meio de nota, confirmou que esse tipo de munição foi usado para conter o tumulto com torcedores. “Na ocasião, os policiais militares realizaram ações de controle de multidão com uso de munições de menor potencial ofensivo como bean bags, elastômero e jatos de água”, disse a secretaria.

Um inquérito policial militar foi aberto pela PM para investigar o caso. “Qualquer excesso por parte dos policiais que eventualmente seja identificado será devidamente investigado e responsabilizado”, disse a secretaria.

Para o gerente de projetos do Instituto Sou da Paz, Bruno Langeani, que a adoção de equipamentos tecnicamente menos letais não basta se “o procedimento não for respeitado, se não houver supervisão e especialmente punições contra os erros”.

“Várias destas opções menos letais podem matar se usadas incorretamente, gás lacrimogêneo, como o caso do Genivaldo com a PRF mostrou. Tonfas, cassetetes e sabres, se usadas para golpear na cabeça também podem matar, assim como elastômero e, agora, a bean bag, especialmente quando disparadas a pouca distância”, afirma.

Um oficial da reserva especialista em controle de distúrbio civil, que pediu anonimato, disse para a reportagem que, pelo cenário de crise na segurança pública a qual passa o estado, não existe munição letal ou menos letal.

Para ele, a incapacidade dos agentes de segurança pública de usar adequadamente uma munição que exige distância mínima de emprego e proíbe alvejar cabeça e órgãos vitais é um fator perigoso.

O oficial explicou que, em casos de tumultos, o agente responsável pelos disparos deve buscar atingir os membros inferiores como forma de incapacitar os agressores que invistam contra a tropa e não mirar na cabeça.

O ouvidor da polícia de São Paulo, o professor Claudio Aparecido da Silva, demonstrou preocupação com a hipótese de a munição que atingiu o torcedor ter saído de uma arma da PM. “Se isso ocorreu, o autor do disparo agiu totalmente fora dos protocolos para uso desse tipo de munição e arma, que determinam uma distância mínima para o disparo e também quais partes do corpo podem ser atingidas por esse tipo de ação.”

O CASO

Segundo o boletim de ocorrência, policiais militares estavam nas proximidades da avenida Jules Rimet com a rua Sérgio Paulo Freddi, entre os portões 6 e 7 do Morumbi, quando torcedores do São Paulo tentaram invadir a área de isolamento para acessar o estádio, onde o time disputava a final da Copa do Brasil com o Flamengo.

PMs conseguiram impedir o acesso, mas passaram a ser atingidos por diversos objetos arremessados pelos torcedores. Segundo os policiais, foi necessário o uso de munição química e explosiva, além de cassetete.

Pouco depois, o torcedor foi encontrado caído desacordado no chão. Ele foi levado para o pronto-socorro do Campo Limpo por ambulância que estava no estádio, mas não resistiu aos ferimentos.

TULIO KRUSE E PAULO EDUARDO DIAS / Folhapress

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