Polícia faz ronda noturna de helicóptero em Brasília e intriga moradores

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Na noite da última quarta-feira (19), um helicóptero da polícia do Distrito Federal sobrevoou por quase uma hora a Asa Norte, uma das áreas nobres do plano piloto de Brasília, em uma altura bem próxima dos prédios. Foram ao menos oito voltas pela região em menos de uma hora.

Desde janeiro, sobrevoos como esse se frequentes no bairro, sempre durante as noites, em baixa altitude, e muitas vezes em zigue-zague por um curto perímetro.

A polícia afirma que a medida faz parte de uma nova estratégia para reforçar o policiamento ostensivo no combate à criminalidade. A efetividade da ação é colocada em dúvida por especialistas em segurança pública consultados pela reportagem, que veem ineditismo no formato.

Questionada, a Secretaria da Segurança Pública do Distrito Federal e as polícias Militar e Civil não informaram o que motivou a decisão de rondas noturnas com helicópteros, o porquê de as operações serem concentradas em um bairro nem quantas já foram realizadas e qual tem sido o efeito prático.

A secretaria também não respondeu sobre o custo dessas operações.

A pasta da Segurança do governo Ibaneis Rocha (MDB) diz que as forças de segurança possuem autonomia para suas ações. A Polícia Militar afirma que utiliza as aeronaves para auxiliar nas demais modalidades de policiamento terrestre.

“[Os helicópteros] têm uma visibilidade excelente e a ostensividade de seu uso é indispensável. A Polícia Militar se faz presente para coibir esse movimento de criminosos que se infiltram nas comunidades de pessoas em situação de rua”, diz nota da PM, que também defende a maior visibilidade a partir das aeronaves.

A Polícia Civil, que também utilizou aeronaves durante a noite nos últimos dias, não se manifestou. O governo Ibaneis Rocha também não informou sobre ocorrências desbaratadas após o início dos sobrevoos.

Dados da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal indicam uma redução de 23% de delitos na região do Plano Piloto —que considera também outras áreas, além da Asa Norte.

Os dados abrangem roubos a pedestres, transporte coletivo, veículos, comércios e residências, além de furtos em veículos. No total, foram registrados 349 furtos e roubos em janeiro e fevereiro de 2025, uma queda em relação aos 456 casos no mesmo período do ano anterior.

Desde 12 de fevereiro, houve ao menos 11 sobrevoos noturnos, sempre a partir das 22h, segundo relatos em grupos de moradores em aplicativos de mensagens.

Há relatos de que a projeção de feixes de luz dos helicópteros chegam a entrar nos apartamentos —no Plano Piloto, os prédios residenciais não superam a altura de seis andares. O barulho também tem sido alvo de reclamação, por causa dos horários.

A Folha identificou algumas dessas rondas pelo site ADS-B Exchange, que reúne dados de rastreamento de aeronaves em tempo real.

No voo da última quarta, um helicóptero da Polícia Civil decolou às 22h01 e ficou no ar por quase 50 minutos. Antes de pousar, às 22h47, voou em zigue-zague sobre as quadras residenciais da Asa Norte, pelo eixão (via expressa que corta o Plano Piloto) e fez uma passagem sobre o campus da UnB (Universidade de Brasília).

Não houve deslocamento para outras áreas de Brasília, ou mesmo além do Eixo Monumental, que divide as asas Norte e Sul e onde está a Esplanada dos Ministérios e a Praça dos Três Poderes.

Pablo Feitosa, 51, síndico de um prédio no início da Asa Norte, afirma que os helicópteros não aumentaram a sensação de segurança, têm incomodado os moradores e ocorrem ao mesmo tempo em que há muitos relatos de assaltos nas proximidades.

Dono de um bar na vizinhança, ele reuniu relatos de 16 arrombamentos em prédios residenciais e comerciais na região, entre outubro e janeiro. Ele diz que um grupo de síndicos vai solicitar uma reunião com a PM na próxima semana para discutir tanto os arrombamentos quanto os constantes sobrevoos das aeronaves.

“A gente liga para o 190 quando acontece algum crime e ninguém aparece, mas fica um helicóptero circulando. A impressão é que ele não melhora a sensação de segurança, e a gente ainda fica com receio achando que algo grave está acontecendo”, disse.

O coronel reformado da Polícia Militar de São Paulo e membro do Conselho da Escola de Segurança Multidimensional da USP, José Vicente da Silva Filho afirma que o uso ostensivo de aeronaves é uma novidade.

“Os principais recursos de prevenção já estão em operação, como veículos, câmeras e policiais nas ruas. Não faz muito sentido como função preventiva, porque o avião não vai descer para capturar o bandido”, diz ele. “Sabemos que, à noite, seu uso é mais complicado, pois a visibilidade não é tão boa”, disse.

José Vicente explica que helicópteros atuam principalmente para transporte e observação, orientando a disposição do policiamento em operações.

O especialista em segurança pública Luís Flávio Sapori também afirma desconhecer outras experiências de uso de helicópteros para rondas noturnas.

“Não tem precedentes no Brasil para uso ostensivo. Por isso, é essencial realizar um estudo para avaliar sua eficácia e entender se ele aumentará a sensação de segurança ou, pelo contrário, gerará resistência por parte dos moradores”, afirmou.

RAQUEL LOPES / Folhapress

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