SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O aumento do limite de emissões de carbono para a produção de hidrogênio verde previsto no marco sancionado no início deste mês atende às características do Brasil, segundo Jörgen Sandström, chefe do programa de transformação industrial do Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês).
Ele é um dos responsáveis pelo relatório divulgado pela organização nesta quinta-feira (15) sobre a produção de hidrogênio verde na América Latina.
O relatório separa os países latinoamericanos em três categorias: 1) aqueles que querem produzir hidrogênio de baixa emissão de carbono para um determinado setor; 2) os que pretendem focar em exportações; e 3) os que privilegiarão a indústria local quando o produto estiver sendo produzido em escala.
O fórum enquadrou o Brasil na terceira categoria, com base em documentos do governo federal. Por isso, com uma menor dependência do mercado externo, o país teria condições de criar parâmetros diferentes dos internacionais para privilegiar setores da economia local como o etanol, razão para o aumento do limite de emissões de carbono por quilo de hidrogênio.
“Essa situação se alinha bastante com nossas descobertas. Os descarbonizadores locais [como é chamada a categoria três] precisam desenvolver um padrão nacional para o hidrogênio limpo. E esses padrões diferem de país para país, região para região”, diz Sandström.
“Nesse contexto, acho que é preciso reconhecer circunstâncias locais, e o mais importante é que desenvolver um padrão envia um tipo de sinal positivo ao mercado sobre o apoio do país à matéria”.
Inicialmente, o projeto de lei que instituía o marco legal do hidrogênio verde previa um limite de 4 kg de CO2 por 1 kg de H2, mas alterações de última hora subiram o teto para 7 kg. A mudança foi feita para privilegiar a produção do gás via etanol combustível em que a indústria brasileira tem expertise na fabricação. O texto foi sancionado no último dia 5, com vetos do presidente a incentivos fiscais.
Mas, provavelmente, o hidrogênio que será exportado (40% da produção brasileira até 2050, segundo o Fórum) precisará emitir menos carbono em sua etapa de produção. Isso porque a União Europeia classifica como hidrogênio verde aquele com produção menor do que 3,4 kg de CO2 para cada 1 kg de H2. A China, 4,9 kg e os Estados Unidos, 2 kg.
“Rotulamos o Brasil como um descarbonizador local porque o país tem uma indústria de petróleo e gás substancial que precisará de hidrogênio para descarbonizar, além de outros setores, enquanto outros países são mais orientados para a exportação, como o Chile e a Argentina. Mas se o país deseja vender seu hidrogênio, como tenho certeza que deseja, ela precisará garantir a conformidade com os padrões internacionais. É como qualquer outro produto no planeta”, diz Sandström.
O relatório publicado nesta quinta destaca também que a produção atual de hidrogênio no país é limitada à produção de amônia e ao refino de petróleo em 2019, o país produziu 0,4 megatonelada. Mas o fórum vê potencial de expansão a partir da produção de aço e fertilizantes e, em 2050, o país pode produzir entre 21 e 32 megatoneladas de hidrogênio e abastecer 10% do mercado mundial.
Hoje a produção de hidrogênio verde no Brasil custa entre US$ 2,87 e US$ 3,56 por kg, enquanto em 2030 a estimativa é que o custo seja de US$ 1,90. Em 2050, a previsão é de que hidrogênio verde brasileiro estará custando US$ 1,20, um dos mais baratos do mundo.
Para chegar a esses valores, porém, o WEF destaca que o Brasil e outros países da América Latina precisarão superar cinco desafios principais: a falta de padrões e certificação da produção de hidrogênio, a diferença de custos entre os hidrogênios sujo e limpo, a falta de tecnologia, o ritmo lento na construção de infraestrutura adequada e a ainda baixa demanda pelo produto.
De acordo com a Agência Internacional para as Energias Renováveis (IRENA, em inglês), a demanda global por hidrogênio vai seguir estável até 2035. O WEF, porém, aponta que até lá os países latinoamercianos precisam incentivar os setores que hoje já utilizam hidrogênio a adaptar suas estruturas para o hidrogênio limpo é o caso do refino de petróleo e da produção de amônia e metanol.
O relatório considera como limpo o hidrogênio produzido a partir da eletrólise da água via energia renovável (hidrogênio verde) e aquele produzido por meio de gás natural com captura e armazenamento do CO2 liberado (hidrogênio azul).
O WEF destaca que o Brasil tem várias políticas públicas e mecanismos financeiros para aumentar a competitividade do hidrogênio verde, incluindo alívio fiscal, condições especiais de financiamento e fundos dedicados para energias renováveis.
“Além disso, o Brasil tem aproveitado financiamentos e parcerias internacionais para superar os altos custos, incluindo um investimento de 2 bilhões (R$ 12 bi) da UE como parte da iniciativa Global Gateway, R$21 milhões de um acordo Brasil-Alemanha para projetos de hidrogênio verde e uma colaboração com o Banco Mundial para o desenvolvimento de energia solar e hidrogênio verde nos estados do nordeste”, aponta o relatório.
O relatório também destaca que o governo brasileiro se comprometeu a investir aproximadamente R$ 200 milhões por ano até 2025 em pesquisa e desenvolvimento (P&D) de hidrogênio verde, incluindo a criação de plantas-piloto em todas as regiões do país até o próximo ano.
O WEF cita, por exemplo, o acordo de cooperação entre o Senai e a agência de desenvolvimento internacional da Alemanha para a criação de um centro de excelência em hidrogênio verde em Natal.
PEDRO LOVISI / Folhapress