Prefeituras de MG reduzem conta de água em ano eleitoral após acordo com Copasa

BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – A Copasa (Companhia de Saneamento de Minas Gerais) assinou neste ano termos aditivos nos contratos de concessão de água e esgoto com quatro municípios do estado.

Em todos os casos houve o anúncio por parte dos prefeitos de desconto na tarifa de água aos consumidores.

A prática pode ser considerada uma distribuição gratuita de benefícios por parte da administração pública em ano eleitoral, algo que pode levar à cassação dos agentes pela Justiça, de acordo com uma especialista ouvida pela reportagem.

A Copasa não celebrava novos acordos de concessão com prefeituras desde 2016, de acordo com os comunicados enviados pela empresa à CVM (Comissão de Valores Mobiliários).

Dos quatro municípios que firmaram aditivos em 2024, três são geridos por partidos que fazem parte da base de Romeu Zema (Novo) na Assembleia Legislativa.

Dois deles, Patos de Minas e Divinópolis, representam as principais prefeituras no estado sob gestão do partido do governador. Os outros dois são Visconde do Rio Branco, que tem um prefeito do Republicanos, e Rio Pomba, cujo chefe do Executivo é do PT.

No ano passado, Zema nomeou o presidente estadual do Novo, Christopher Laguna, para o cargo de assessor executivo da presidência da Copasa. Entre suas atribuições está a relação da estatal de saneamento com os Poderes, como as prefeituras.

Procurado por mensagem e ligação para explicar o motivo do acordo com os quatro municípios, o assessor não respondeu às tentativas de contato da reportagem. A companhia disse que os aditivos foram “uma decisão estratégica” da empresa a partir de acordo com os municípios.

Os aditivos contratuais foram a solução encontrada pelos municípios para escapar de uma taxa única sobre a coleta de esgoto que começou em 2021.

Foi quando a Arsae, autarquia estadual reguladora, definiu que os usuários atendidos pela Copasa teriam de pagar uma taxa de esgoto de 74% sobre o valor da tarifa de água.

Antes, aqueles que tinham acesso à coleta de esgoto e não ao seu tratamento pagavam 25% da tarifa de água, enquanto os que usufruíam do serviço completo pagavam 100%.

À época, o início da cobrança da taxa única gerou discordância de muitos municípios, que entraram na Justiça contra a medida, mas tiveram suas ações rejeitadas em instâncias superiores.

Agora, nos aditivos, a maioria das prefeituras definiu junto à Copasa que a cobrança para quem não tem acesso ao tratamento de esgoto é de 30% sobre a tarifa da água –em Divinópolis, ela é de 25%. Para quem tem acesso integral ao serviço, ela continua em 74%.

De todas que fizeram os aditivos, apenas Rio Pomba manteve a Arsae como agência reguladora. O novo marco legal do saneamento, aprovado em 2020, permitiu aos municípios a contratação, que antes era discricionária, de uma agência reguladora em casa de extensão do contrato.

A lei também deu aval para aditamento nos contratos vigentes para o cumprimento das metas de 99% da população com acesso à água potável e 90% ao tratamento e à coleta de esgoto até 2033, desde que as companhias demonstrem condições econômico-financeiras.

O impacto na conta de água dos consumidores foi imediato após os acordos. De acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), com dados de 2022, as cidades de Rio Pomba e Visconde do Rio Branco não tinham acesso ao esgoto tratado. Em Divinópolis, o índice de tratamento de esgoto era de 3,75%, enquanto em Patos de Minas essa taxa era de 59%.

Em Divinópolis e Patos, houve ainda um desconto único de 10% e 15%, respectivamente, sobre a tarifa de todos os usuários, conforme os aditivos assinados entre prefeituras e Copasa. A reportagem não teve acesso aos documentos dos outros dois municípios.

Há ainda o caso de Ubá, onde o atual prefeito, Edson Teixeira (União Brasil), anunciou em vídeo de 9 de agosto o desconto para a população no mesmo modelo das outras cidades, mas a Copasa não informou ao mercado o aditivo do contrato com o município.

A advogada Isabela Damasceno, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Minas Gerais, afirma que a concessão de benefícios à população por parte da administração pública é vedada em ano eleitoral.

“O que seriam esses benefícios? Fazer distribuição gratuita de cesta básica, consultas médicas, ou qualquer outro benefício que possa dar à população um estímulo para votar em determinado candidato”, diz a advogada, que ressaltou não opinar especificamente sobre o caso envolvendo Copasa e prefeituras.

Ela diz que a lei vale também para concessionárias de serviço público –caso da estatal de saneamento. Se a Justiça eleitoral identificar a concessão de benefícios, pode decidir pela cassação do mandato ou da diplomação do candidato.

Nos casos de Patos de Minas e Divinópolis, as prefeituras tentaram administrativamente rescindir o serviço com a Copasa, mas acabaram mantendo a empresa como concessionária depois dos acordos.

A reportagem encontrou ao menos outros cinco municípios que declararam a nulidade do contrato de concessão junto à Copasa: Alpinópolis, Bom Despacho, Arceburgo, São Sebastião do Paraíso e Extrema –neste último caso, a companhia chegou a pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) a reversão da medida. A estatal de saneamento não anunciou um acordo com nenhum deles.

Procurada, a Prefeitura de Patos de Minas afirmou que escolheu a encampação do contrato [quando o município assume a prestação de um serviço concedido] para assegurar a qualidade dos serviços de água e esgoto.

“A concessionária atual, diante da pressão pública e do risco de perder o contrato, aceitou as novas condições, incorporando todas as vantagens da nova concessão, sem que isso fosse uma decisão motivada por questões eleitorais”, disse a prefeitura, em nota.

“Quanto ao reajuste tarifário de 15%, não há vedação quanto a revisão de preços em ano eleitoral, motivo pelo qual o município não foi questionado por nenhum órgão de controle”, completou a administração.

A Arsae afirmou que aprovou novo convênio de regulação para Rio Pomba, mas disse que a tarifa foi definida pelo prestador (Copasa) e pelo município.

“É por este motivo que o município perceberá uma tabela tarifária distinta dos demais municípios sob regulação discricionária, com tarifas de 30% sobre o consumo de água para aquelas unidades que ainda não tem seu esgoto devidamente tratado”, disse a companhia, em nota.

As prefeituras de Divinópolis, Rio Pomba e Ubá não responderam. A reportagem não conseguiu contato com a administração de Visconde do Rio Branco.

ARTUR BÚRIGO / Folhapress

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