PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – A Polícia Civil do Rio Grande do Sul disse nesta segunda-feira (6) que identificou a fonte do envenenamento do bolo que matou três pessoas e deixou outras duas hospitalizadas em Torres, no litoral norte do estado.
Em entrevista coletiva na delegacia de Capão da Canoa, representantes da Polícia Civil, do IGP (Instituto-Geral de Perícias) e da Secretaria de Segurança Pública, que participam da investigação, disseram que indícios apontam para uma tentativa de homicídio doloso (com intenção de matar) motivada por uma desavença familiar.
De acordo com a investigação, a fonte de contaminação foi uma farinha encontrada com resquícios de arsênio em um mandado de busca no município de Arroio do Sal. Dentre 89 amostras de produtos analisados, a farinha apresentou média de concentração da substância venenosa de 65 g por 1 kg de farinha, quantidade 2.700 vezes maior do que a encontrada no bolo.
Na noite de domingo (5), a polícia prendeu temporariamente uma mulher suspeita de envolvimento com as mortes.
Deise Moura dos Anjos é nora da mulher que fez o bolo, Zeli dos Anjos, 61, que segue internada com quadro estável.
As vítimas que morreram são duas irmãs de Zeli: Maida Berenice Flores da Silva, 59, e Neuza Denize Silva dos Anjos, 65, além de Tatiana Denize Silva dos Anjos, 47, filha de Neuza. Uma criança de dez anos que também comeu o bolo chegou a ser hospitalizada, mas já teve alta.
Em nota, a defesa de Deise disse que somente se pronunciará após ter acesso integral às investigações em andamento.
A polícia trata o caso como triplo homicídio duplamente qualificado devido ao motivo fútil e ao emprego de veneno, com possibilidade de evolução para triplamente qualificado com a apuração de dissimulação. De acordo com o TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul), uma perícia em dados do telefone da suspeita encontrou buscas pelo termo arsênio e outras substâncias similares.
“São divergências que ocorreram há 20 anos, aproximadamente, divergências muito pequenas”, disse o delegado Marcus Vinícius Veloso, da Delegacia de Polícia de Torres, que conduz as investigações. “É absolutamente desproporcional o motivo para ter cometido um crime desta natureza.”
A polícia disse que pretende obter mais informações após uma oitiva com a suspeita. A investigação busca descobrir como ela teria adquirido o arsênio e se o alvo do veneno era apenas a sogra, ou também outras pessoas da família. O bolo foi servido em uma confraternização na semana de Natal, na noite de 23 de dezembro.
“É impossível tratar-se da degradação de algum ingrediente usado na receita do bolo, como, por exemplo, uma uva-passa”, disse a diretora do IGP, Marguet Mittmann. Segundo ela, a quantidade de arsênio nas vítimas chegava a 80 a 300 vezes o nível usado pela literatura científica para caracterizar uma contaminação ocupacional acidental, por exemplo.
“O pedido de prisão não foi feito só com base em desarmonia familiar. A gente tem indicativos bem concretos de que foi ela que tomou as providências e que contaminou a farinha”, disse o secretário estadual de Segurança Pública, Sandro Caron. Segundo ele, algumas informações detalhadas do caso não podem ser divulgadas no momento para preservar as investigações.
Também sem entrar em detalhes, a delegada regional do litoral Norte Sabrina Deffente disse que os mandados de busca e apreensão cumpridos nas cidades de Torres, Arroio do Sal e Nova Santa Rita, em residências ligadas a envolvidos no caso, possibilitou obter provas que o envenenamento teria sido feito pela familiar.
A polícia também confirmou que será feita a exumação do corpo do marido de Zeli, que morreu em setembro, em um caso então tratado como intoxicação alimentar. Segundo os agentes, há indícios de relação entre os casos.
Dentre os sintomas imediato de contaminação por arsênio estão náuseas, dores abdominais, diarreia e vômitos, acompanhados frequentemente de formigamento dos membros e cãibras musculares.
O arsênio é a principal matéria-prima do arsênico, um veneno de comercialização proibida no Brasil desde 2005.
CARLOS VILLELA / Folhapress