Presente comum no Dia dos Pais, gravata deixou de ser símbolo de poder masculino

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nas comuns listas de sugestões de presentes para o Dia dos Pais, a gravata estava sempre presente. Seja afrouxando-a no happy hour, trocando seus pedaços por dinheiro dos convidados no casamento ou estreando uma nova no primeiro dia de trabalho, o acessório costumava ser essencial no guarda-roupa masculino, especialmente em situações formais.

Isso vem mudando ao longo dos últimos anos. Os candidatos preferidos à prefeitura de São Paulo Ricardo Nunes e Guilherme Boulos, por exemplo, raramente são vistos usando gravatas em suas aparições públicas –o que não condiz com a nossa imagem de políticos que já estiveram na mesma posição em outras décadas, como Geraldo Alckmin ou Gilberto Kassab.

Em desfiles masculinos recentes de marcas como Fendi, Gucci e Prada, a gravata aparece de outra maneira: entre sobreposições, com um nó descontraído, sobre camisas coloridas. A gravata não desapareceu completamente, mas seu uso em situações formais e como um emblema de poder e status parece estar entrando em extinção.

Segundo conta a empreendedora de moda Letícia Coelho, a gravata surgiu no século 17, evoluindo dos lenços que monarquistas franceses usavam para secar o suor no calor ou se proteger do frio.

Com o passar do tempo, seu uso pela realeza passou a ser visto como um sinônimo de elegância e, no século 19, chegou ao formato de gravata tradicional que conhecemos. É aí que ela passa a fazer parte do uniforme masculino –terno, colete, camisa e gravata.

“A gravata se torna um símbolo do lugar do homem na sociedade burguesa patriarcal”, diz o pesquisador de tendências Dario Caldas. “Isso é algo que vai permanecer muito forte no século 20, numa sociedade com grandes diferenças sociais, como é o caso do Brasil. O homem que usa gravata é o homem que trabalha sério: o homem de negócios, o empresário.”

Para Caldas, existem várias versões que podem explicar porque este adorno usado no pescoço se tornou tão representativo de uma ideia de autoridade masculina; entre elas, a teoria de que a gravata traz um símbolo fálico ao visual.

Ao fim do século 20 e começo do 21, esta visão foi mudando. Assim como outros elementos formais do visual de homens e mulheres foi caindo em desuso –pense em usar saltos altos no trabalho, ou vestidos de gala para um casamento–, a gravata também foi perdendo seu lugar de destaque.

Inclusive entre os poderosos. Tente encontrar uma foto de Steve Jobs ou Elon Musk de gravata. “Eu acho que o homem de gravata parece, cada vez mais, um homem antigo. Ela, hoje, é um resquício de um jeito de se vestir”, diz Caldas.

“Vivemos uma época em que títulos importavam muito, e isso também passa a mudar. As novas gerações querem, para além de títulos, significados”, fala Coelho. Para os especialistas, a ressignificação da gravata também vem na toada de uma desconstrução da masculinidade tradicional trazida pela geração millennial e continuada pelas seguintes.

Isso significa que a gravata sumiu completamente do guarda-roupa masculino? Na verdade, significa que agora ela está presente tanto no feminino quanto no masculino, mas com outros significados.

“Hoje em dia, se usa gravata de uma maneira lúdica, até rebelde. Os punks fizeram muito isso”, pontua Caldas. Outros tipos de gravatas também têm pipocado os looks de famosos nos últimos anos. Além da já conhecida gravata borboleta, também há a gravata em laço, utilizada por Cillian Murphy no Oscar deste ano, e a gravata country, usada por Beyoncé para divulgar “Cowboy Carter.”

Além de mudar o modo de uso, também muda o consumo. Coelho diz que a primeira gravata que lançou em sua loja de roupas femininas Lestlo foi um sucesso. Ela destaca, também, o êxito do mercado vintage e das peças de segunda mão. “Está muito em evidência trazer itens antigos para o visual. Roupa é memória, e as pessoas têm buscado mais significado em suas peças”, diz a especialista.

“O homem não vai ter mais aquele armário de gravatas. Agora, está se pensando muito mais em ter durabilidade e versatilidade.”

AMANDA CAVALCANTI / Folhapress

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