O presidente da concessionária de energia Enel, Nicola Cotugno, deixará a empresa. Ele estava à frente do braço nacional da companhia desde 2018.
A troca de comando ocorre 20 dias após um temporal que deixou 2,1 milhões de clientes da empresa, em 24 cidades da região metropolitana de São Paulo, sem energia -parte deles até por uma semana. Diante dos problemas, o prefeito paulistano, Ricardo Nunes (MDB), chegou a pedir o cancelamento do contrato com a Enel.
A decisão, porém, é anterior. A reportagem teve acesso à ata de uma reunião da empresa do dia 26 de outubro deste ano. Na ocasião, Cotugno informou aos conselheiros que estava se desligando do grupo e que iria se aposentar.
“Para apoiar o processo de substituição e as recentes contingências, o executivo prorrogou a sua saída para 22 de novembro”, diz a empresa por meio de nota. O novo presidente será Antonio Scala. Enquanto acontecem os trâmites administrativos necessários para sua nomeação, o presidente do Conselho de Administração, Guilherme Gomes Lencastre, assumirá a posição de forma interina.
“A Enel Brasil agradece a Nicola Cotugno por toda dedicação ao Grupo e seus colaboradores, além do destacado foco nos clientes e contribuição à sociedade”, diz a concessionária.
Em entrevista à Folha de S.Paulo após o apagão no início de novembro, Cotugno rebateu as críticas à demora da companhia na religação da energia argumentando que houve um evento extraordinário.
“Não é para nos desculparmos, não. O vento foi absurdo”, afirma. Ele diz que a resposta à emergência foi dificultada pela enorme quantidade de árvores que caiu, forçando a empresa a trocar postes e reconstituir quilômetros de rede.
Após a queda de energia do feriado de Finados, São Paulo voltou a registrar falta de energia no dia 15 de novembro e cerca 290 mil residência ficaram sem energia. Nesta ocasião, Cotugno voltou a comentar sobre o apagão de São Paulo, disse que foi mal interpretado e pediu desculpas.
“Não era a mensagem que eu queria passar. Eu, pessoalmente, e a empresa, fortemente, pedimos desculpas. Não usando vento, árvores como desculpas”, disse Cotugno.
Procurado para comentar a troca, o prefeito Ricardo Nunes afastou a correlação entre a saída de Nicolas Cotugno e os apagões com as chuvas no começo de novembro.
“O evento aconteceu no dia 3 de novembro, no dia 4 eu estava na Enel e, naquele momento, o Nicola já me falou: ‘Ricardo estou saindo e quero apresentar o novo presidente. [Ele disse] estou saindo porque estou indo para o setor privado, e não tem nenhuma relação com o evento do dia 3’. Já estava decidido, tinha até o substituto”, afirmou Nunes.
EMPRESA DOBROU LUCRO E REDUZIU FUNCIONÁRIOS
Como a Folha de S.Paulo mostrou, a italiana Enel assumiu a concessão da distribuição de eletricidade na região metropolitana de São Paulo em 2018. Desde 2019, primeiro ano completo de operações, dobrou o lucro e reduziu em 35% o número de colaboradores.
No Brasil, a Enel lidera o ranking das maiores distribuidoras de energia, com concessões em São Paulo, no Rio de Janeiro e no Ceará.
A líder no segmento de distribuição de eletricidade do país ocupa posições ruins no ranking de qualidade do atendimento elaborado anualmente pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).
Em 2022, a Enel São Paulo ficou na 19ª colocação entre as 29 distribuidoras de energia com mais de 400 mil consumidores no país. A Enel Rio de Janeiro e a Enel Ceará dividiram a 23ª colocação com a Cemig.
A distribuidora paulista, porém, tem mostrado evolução nos indicadores de frequência e duração de interrupções desde 2019. Em nota, a empresa destacou que investiu R$ 6,7 bilhões entre 2018 e 2022, maior marca da história da empresa.
A média de mais de R$ 1,3 bilhão por ano é superior aos cerca de R$ 800 mil investidos anualmente nos cinco anos antes da compra da distribuidora, diz a companhia.
Cotugno deixa a concessionária em meio a duas CPIs (Comissão Parlamentar de Inquérito), uma na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) e na Câmara Municipal da capital.
A da Alesp foi instaurada em maio deste ano e, no dia 16, colheu depoimento do executivo. Ele pediu desculpas e disse que foi mal interpretado em sua entrevista à Folha de S.Paulo. Também tentou explicar sobre a redução de funcionários desde quando assumiu a concessão da distribuição de eletricidade na região metropolitana de São Paulo em 2018.
“O volume da força de trabalho [nas ruas] não se reduziu, houve um equilíbrio entre interno e externo. Não é uma força de trabalho menor. No mesmo período, a gente investiu em tecnologia para obter resultado melhor”, afirmou o então presidente da empresa no dia.
Durante o depoimento de Cotugno, a Alesp sofreu com, pelo menos, duas quedas de energia com duração de poucos segundos.
Além das CPIs, a empresa é alvo de ações na Justiça. No dia 10, a juíza Laís Helena Bresser Lang, da 2ª Vara da Fazenda Pública, acatou um pedido da prefeitura e mandou a Enel apresentar dentro de cinco dias um plano de contingência para o fornecimento de energia elétrica na capital, além de medidas para evitar problemas em dias de chuva.
Nesta semana, o executivo havia sido convidado a participar de debate na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados sobre a interrupção no fornecimento de energia em São Paulo, mas alegou outro compromisso para não comparecer. O convite foi realizado no dia 11.
QUEM É O NOVO PRESIDENTE
O novo presidente, Antonio Scala, entrou na Enel em 2009 e trabalhou em diversas áreas, no início na Itália, e depois na América do Sul.
Formado em Administração de Empresas em 2002 em Roma, Scala atuou como Sócio Júnior na McKinsey & Company com foco nas áreas de energia, gás e finanças corporativas.
Desde outubro de 2020, ele é responsável pela Enel Green Power na América do Sul.
ISABELLA MENON E CARLOS PETROCILO / Folhapress