SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Declarado vencedor em uma eleição marcada por acusações de fraude e seguida por meses de protestos, Daniel Chapo tomou posse como presidente de Moçambique nesta quarta-feira (15).
A cerimônia foi realizada na praça da República da capital, Maputo, sob rigorosas medidas de segurança. Segundo relatos, afora os policiais e militares que monitoravam a área, o lugar estava praticamente deserto.
A vitória de Chapo representou a continuidade do partido Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), de centro-esquerda, no poder. A legenda de centro-esquerda governa o país há 50 anos, desde a independência de Portugal, em 1975 o presidente eleito a princípio soma a eles mais cinco anos.
Mas observadores independentes dizem que a votação, ocorrida em 9 de outubro, não foi livre ou justa. Atos populares, entre manifestações, greves e bloqueios de rodovias mobilizam o país desde então, afetando empresas estrangeiras que atuam no país e o comércio transfronteiriço.
A ONG Plataforma Decide, centrada no monitoramento eleitoral, afirmou que confrontos entre manifestantes e forças de segurança já mataram 300 pessoas. Sete dessas mortes teriam ocorrido na própria quarta, em manifestações em Maputo e em Nampula, no norte. Questionado pela agência AFP, um porta-voz da polícia disse que a organização ainda não tinha nada a dizer sobre os eventos.
Felipe Nyusi, que deixa o cargo após cumprir o limite de dois mandatos, abordou os protestos em seu discurso na cerimônia desta quarta. “Moçambique precisa de paz e de reconciliação nacional”, disse.
Mas a crise estava em certa medida refletida no evento. Dois dos principais partidos de oposição boicotaram a posse por não reconhecerem o presidente eleito.
Além disso, praticamente não havia líderes estrangeiros presentes as exceções eram os presidentes Cyril Ramaphosa, da África do Sul, Umaro Sissoco Embaló, da Guiné-Bissau.
A lacuna pode ser uma indicação de que mesmo a nível regional há um certo receio em apoiar Chapo. O presidente de Ruanda, Paul Kagame, não compareceu a despeito da atuação de seu Exército em combates contra grupos armados jihadistas no norte de Moçambique. Portugal enviou seu ministro das Relações Exteriores, que descreveu como uma “representação adequada” para as “circunstâncias atuais”.
O Frelimo nega as acusações de fraude, e sustenta que seu candidato obteve 65% dos votos, resultado endossado em dezembro pelo tribunal máximo do país. O partido permaneceu no poder inclusive durante uma guerra civil que matou um milhão de pessoas e durou de 1977 a 1992.
Seja como for, Chapo assume um país cindido. Especialistas sugerem que ele poderia anunciar um grupo de trabalho para propor reformas eleitorais, uma forma de ganhar tempo, ou angariar mais apoio convidando a oposição e a sociedade civil para compor seu governo.
Em seu discurso de posse, o líder afirmou que a estabilidade social e política seria prioridade em seu mandato. Ainda prometeu reduzir o tamanho do governo, diminuir o número de ministérios, combater o desemprego entre os jovens e investir em saúde e educação.
No dia anterior, seu rival nas eleições, Venâncio Mondlane, apontado como o presidente eleito pela oposição e por parte da população, tinha urgido seus apoiadores a continuaram resistindo.
“Como isso vai terminar?”, questionou o líder, que retornou a Maputo na semana passada. Ele tinha saído do país em outubro, depois do assassinato de dois de seus aliados. “Este regime não quer paz. E se não querem paz, não vamos voltar atrás. Se for necessário, nos manifestaremos todos os dias, 365 dias por ano.”
CLARA BALBI / Folhapress