Primeira concessão de florestas desmatadas do Brasil recebe só uma oferta

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Systemica foi a única desenvolvedora de crédito de carbono a participar da primeira concessão de florestas desmatadas do Brasil, organizada pelo governo do Pará. O resultado foi divulgado nesta sexta-feira (28), durante leilão na B3.

A partir de agora, a Systemica ficará responsável por restaurar durante 40 anos a Unidade de Recuperação Triunfo do Xingu (URTX), localizada em Altamira. A área tem 10 mil hectares de floresta desmatada e está a 150 quilômetros da região urbana mais próxima.

Em troca, a empresa venderá cerca de 3,7 milhões de créditos de carbono –um crédito equivale a uma tonelada de carbono absorvida da atmosfera.

Apesar de ser a única participante da concessão, a Systemica ofereceu o teto de alíquota para a outorga variável, de 6%. A outorga é a fatia do faturamento bruto da desenvolvedora que precisará ser repassada ao governo do Pará, dono da área concedida.

Nas estimativas dos organizadores do edital, a receita bruta da empresa ao longo dos 40 anos será de cerca de R$ 950 milhões –com isso, o valor a ser recebido pelo governo ao longo de décadas será de R$ 57 milhões. Outros R$ 40 milhões serão investidos nas comunidades locais, que também abrangem o município de São Félix do Xingu.

Já os investimentos estimados no projeto somam R$ 207 milhões, considerando Opex e Capex. Os valores, no entanto, podem variar, conforme o preço dos créditos de carbono, o modelo de venda a ser escolhido pela Systemica e o custo do crédito a ser tomado pela empresa ao longo dos anos. A desenvolvedora tem o banco BTG Pactual como sócio minoritário.

Segundo o sócio e diretor jurídico da Systemica , Tiago Ricci, a empresa espera que metade desses investimentos seja custeada por um possível empréstimo com o BNDES. Neste mês, o banco anunciou interesse em financiar o projeto, mas a quantia a ser disponibilizada e a taxa de juros ainda dependem de análises técnicas.

Conforme a Folha de S.Paulo já havia apontado, as principais desenvolvedoras de crédito de carbono do país desistiram de participar do leilão nas últimas semanas. O movimento decepcionou organizadores da concessão, já que várias dessas empresas participaram de roadshows e consultas públicas sobre o edital.

O engajamento neste edital era visto como fundamental pelo setor, uma vez que se trata da primeira concessão de restauração de florestas desmatadas do país. Até então, as desenvolvedoras de crédito de carbono operam apenas em áreas compradas ou arrendadas de proprietários rurais.

Outros estados e o governo federal também preparam concessões semelhantes para os próximos meses –alguns, aliás, enviaram representantes para acompanhar a cerimônia na B3 nesta sexta.

Segundo o governo paraense, a Amazônia tem 2,7 milhões de hectares passíveis de restauração, e esse modelo de concessão é visto por especialistas como uma das principais alternativas à falta de orçamento dos governos federal e estaduais para a preservação das áreas.

O ineditismo do modelo e as dificuldades técnicas de se operar na região paraense, no entanto, afastaram a maioria das grandes desenvolvedoras de crédito de carbono, como a Re.green, que tem os Moreira Salles e Arminio Fraga como acionistas, além de Carbonext, Mombak e Future Climate. A desenvolvedora BR Carbon anunciou nesta semana que participaria da concorrência, mas desistiu.

Segundo um executivo de uma das maiores empresas do setor, o desmatamento na URTX é recente, com árvores grossas caídas e algumas mortas em pé. Com isso, a expectativa é de grande custo logístico e operacional para limpar a área.

No ano passado, um fazendeiro foi preso em Goiânia acusado de desmatar os 10 mil hectares da APA (área de proteção ambiental) do Triunfo do Xingu. O desmatamento, segundo as investigações, aconteceu de 2019 a 2021.

Mas a Systemica já tem um projeto de conservação na região, o que tende a facilitar a operação. “Nem toda concessão tem as características que um investidor ou desenvolvedor quer, então a gente acha que cada empresa vai selecionar a que tiver as melhores características para a atividade que ela faz. E, na APA Triunfo do Xingu, a gente sempre teve essa vontade, porque para a gente faz muito sentido, por já estarmos lá”, disse Ricci.

Ainda assim, haverá ineditismos para a Systemica, já que o maior projeto da empresa até agora tem 400 hectares, 25 vezes menor do que a área concedida.

Ao final do evento, representantes do governo do Pará minimizaram a falta de disputa e disseram que já esperavam esse resultado. “A empresa vencedora é uma empresa robusta que tem experiência local e, portanto, conhece a realidade da APA Triunfo do Xingu e da Amazônia”, afirmou o governador do Pará, Helder Barbalho.

O governo pretende ainda neste ano conceder mais 30 mil hectares de áreas desmatadas na região. “No momento em que um leilão é vitorioso, absolutamente o mercado estará atento para que esse modelo de governança sobre a região possa ter aderência por aqueles que estão sintonizados na agenda. Portanto, nós viramos a chave da incerteza e passamos à escala para fazermos novas oportunidades ao mercado”, acrescentou.

PEDRO LOVISI / Folhapress

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTÍCIAS RELACIONADAS