Primeiro Dia de Finados com cemitérios sob concessão divide opinião dos visitantes em SP

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O primeiro Dia de Finados com os cemitérios de São Paulo sob concessão dividiu a opinião de visitantes nesta quinta-feira (2). Enquanto alguns relataram melhora na limpeza e no cuidado, outros criticaram sujeira e mato alto. Eventos organizados pelas empresas que assumiram a administração dos espaços marcaram a data.

No cemitério da Vila Formosa, maior necrópole da América Latina, antigos problemas chamaram a atenção de visitantes. A falta de limpeza e o mato alto nas quadras gerais foram as principais queixas sobre a gestão da Consolare, que passou a cuidar da unidade em março, quando o Serviço Funerário de São Paulo foi entregue à iniciativa privada.

Vânia Cordeiro, 61, teve dificuldade para encontrar o túmulo da mãe, cercado pelo mato alto na quadra geral. “É um horror esse matagal, esperava um cuidado melhor”, disse a cuidadora de idosos.

Perto dali, o atendente Josimar Matias, 52, arrancava ele próprio as ervas daninhas que cresceram sobre o canteiro onde o pai foi enterrado, no início do ano. “Eu estava pagando R$ 50 por mês para um rapaz cuidar, mas ele não estava fazendo o serviço”, disse Matias, que passou a visitar o cemitério a cada duas semanas para capinar.

Sobre a mudança na administração do cemitério, ele diz que percebeu o espaço mais limpo, mas avalia que ainda há muito o que melhorar. “Não resolveu tudo, mas tinha época que era pior, em todo lugar tinha lixo e entulho jogado”, acrescentou.

Nesta quinta-feira (2), alguns pontos do cemitério tinham pedras e galhos empilhados, mas as ruas e acessos a túmulos não eram obstruídos.

Segundo a modelista de confecção Nadir Oliveira da Silva, 52, que mora na região e visita o cemitério semanalmente, a situação era outra há alguns dias. “Não vi mudança nenhuma [com a troca de administração], sempre encontro montanhas de lixo espalhadas aqui dentro”, disse. Ela visitava o túmulo da irmã mais velha, morta em janeiro.

No entorno, muitos túmulos estavam cobertos pelo mato, enquanto outros tinham valas abertas. “Se a família não paga, não tem ninguém que cuida”, acrescentou Nadir.

Em todo o cemitério, dezenas de jardineiros autônomos aproveitavam o movimento para oferecer serviços de capinagem, negociados na hora por R$ 25. Profissionais autônomos têm autorização para trabalhar nos cemitérios da cidade, desde que credenciados.

No cemitério da Consolação, na região central de São Paulo, o Dia de Finados estava diferente. Dezenas de funcionários da concessionária Consolare se agruparam no corredor central e abordavam os visitantes com formulários para cadastro das famílias, folders apresentando o trabalho da empresa e atendimento individual focado na venda de jazigos.

Quem vai ao cemitério todos os anos diz que não está acostumado com a abordagem. Os usuários notaram outras duas diferenças: limpeza fora do comum e a ausência de jovens que ofereciam serviço informal de jardinagem e zeladoria dos túmulos.

A jornalista Mariangela Zan, 44, e a funcionária pública Márcia Lopes Ferreira, 58, vêm ao cemitério ao menos duas vezes por ano para cuidar de dos túmulos: a do sanfoneiro Mário Zan, pai de Mariângela, e de Domitila de Castro, a Marquesa de Santos.

Por décadas, a família Zan esperou até que um terreno em frente à sepultura da marquesa ficasse disponível e, quando conseguiu, cuidou pessoalmente da construção de seu próprio jazigo. Mário, que morreu em 2006, tinha devoção à amante de Dom Pedro 1º e fez a filha prometer que cuidaria do túmulo histórico.

“O túmulo era preto de tanta vela que o pessoal acendia, por isso que a primeira coisa que meu pai e minha mãe fizeram foi colocar uma placa escrito ‘proibido acender velas'”, diz Zan, sobre a estrutura de mármore branco. “Está impecável [a limpeza], mas nós não sabemos se é por causa da privatização, para eles mostrarem serviço apenas no dia de hoje, ou se vai continuar”, diz Ferreira sobre a zeladoria no local.

Segundo Zan, o cemitério também teve mais visitantes nesse ano do que o costume. Ela fica que alguns moradores tinham medo de vir ao cemitério municipal no Dia de Finados por medo de assalto. “Uns meninos abordavam a gente oferecendo serviço, e a gente não sabia se era de verdade ou se queriam nos roubar, porque tinha muito relato de assalto”, conta.

Consultada no início desta semana sobre as questões de limpeza, a Consolare afirmou que contratou 32 novos colaboradores para varrição e recolha de resíduos, “número que representa o dobro de funcionários que realizavam esse trabalho no local antes da concessão”. A empresa diz que já investiu R$ 17 milhões nos seis cemitérios que administra.

A empresa também ressaltou que a responsabilidade pela conservação dos jazigos é das famílias, segundo decreto municipal de 2020, e que realiza campanha permanente “para que os munícipes mantenham seus dados cadastrais atualizados, com a finalidade de tornar efetiva a comunicação”.

Missas e pétalas

A capela do cemitério da Consolação tinha missas de hora em hora na manhã desta quinta. Pouco depois das 10h, o bispo dom Carlos Lema Garcia deu início à sua cerimônia. Ele explicou o princípio das orações aos mortos, que segunda a crença cristã, é uma forma de purificar a alma daqueles que aguardam para entrar no Céu e viver eternamente.

“O fundamento bíblico da oração pelos defuntos está no Antigo Testamento, os judeus também já tinham isso”, ele disse, citando os Livros dos Macabeus.

No sermão, dom Carlos lembrou da passagem na Bíblia em que Jesus Cristo ressuscita Lázaro, “demonstrando que tinha vitória sobre a morte”.

No cemitério do Araçá, os visitantes eram recepcionados por músicos que tocavam saxofone e violino, além de um coral e um grupo de funcionários da funerária Cortel.

Pontualmente às 11h30, um helicóptero começou a circundar a capela do Araça, despejando pétalas de rosas sobre o cemitério. O ato foi filmado por vários funcionários com celulares e alguns visitantes.

TULIO KRUSE / Folhapress

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