Prisão de Silvinei por PF e Moraes teve hipótese como base e vira alvo de críticas

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A prisão preventiva do ex-diretor-geral da PRF (Polícia Rodoviária Federal) Silvinei Vasques pela Polícia Federal nesta quarta-feira (9) por suspeita de interferência no segundo turno das eleições de 2022 foi decretada com base em argumentos insuficientes, segundo especialistas em direito penal ouvidos pela reportagem.

A decisão autorizando a prisão de Silvinei foi expedida pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes. O magistrado disse concordar com posicionamento da PF de que havia risco às investigações com a permanência em liberdade, já que “é muito provável que haja uma reverência de tais policiais rodoviários federais” ao ex-diretor-geral.

“A efetividade das inúmeras e necessárias oitivas de agentes da Polícia Rodoviária Federal sobre eventual determinação de Silvinei Vasques, então Diretor Geral da PRF, para realização de ‘policiamento direcionado’, pode ser prejudicada pela manutenção de liberdade do investigado, conforme já ressaltado anteriormente na representação da Polícia Federal, cujo trecho -pela importância- se repete”, afirmou Moraes.

O ministro também destacou que dois ex-subordinados são suspeitos de mentir em depoimentos sobre os fatos apurados, “indicando a presença de temor reverencial em relação à pessoa de Silvinei Vasques, a comprovar que, em liberdade, teria poder de influenciar no depoimento de eventuais testemunhas”.

Além da prisão, os agentes também cumpriram mandados de busca e apreensão em endereços ligados a Silvinei. A PGR (Procuradoria-Geral da República) se manifestou contra a prisão, por entender que bastariam a busca e o interrogatório do investigado.

Silvinei foi um dos diretores mais próximos do ex-presidente Jair Bolsonaro. No dia do segundo turno ele foi convocado por Moraes -presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral)– a dar explicações sobre a atuação da PRF.

A Folha de S.Paulo revelou à época que o órgão ampliou o número de abordagens a ônibus naquele dia, descumprindo uma decisão do TSE que havia proibido operações que envolvessem transporte público.

A advogada criminalista Marina Coelho, conselheira do Iasp (Instituto dos Advogados de São Paulo), afirma não haver dúvidas sobre a gravidade dos fatos investigados, mas que a jurisprudência brasileira não considera esse um motivo para a prisão preventiva.

Ela afirma que a decisão não está fundamentada e não traz elementos que justifiquem a medida, pois Silvinei não exerce mais nenhum cargo público e houve mudança de governo. Para ela, os argumentos de que a prisão era necessária para garantir a instrução criminal são genéricos.

“Estão prendendo o sujeito para ouvi-lo preso, o que significa fazer pressão para que ele diga. No direito brasileiro, isso não é aceito. A prisão preventiva não é uma prisão para oitiva. A pessoa que está sendo investigada tem o direito de ser ouvida e, se ela quiser, ela fala ou não”, diz.

Professor de processo penal da PUC-SP, Claudio Langroiva diz que o argumento de evitar a combinação de versões entre agentes da PRF é pouco para justificar a prisão preventiva.

“Para um prisão preventiva, teríamos que ter elementos mais concretos de que, de alguma forma, ele estivesse interferindo no bom andamento da investigação. Essa interferência poderia incidir em ameaçar testemunhas, desaparecer com provas, o que não há na decisão do ministro”, afirma.

Professora de direito e processo penal do Insper, a advogada Tatiana Stoco diz que não há dúvida sobre a necessidade da busca e apreensão no caso, mas que o mesmo não pode ser dito em relação à prisão, que precisaria atender a diversos requisitos, em especial, a presença de um perigo atual e concreto.

Diferentemente da prisão temporária, a preventiva não tem um prazo determinado.

“A decisão, no entanto, invoca fatos passados e afirma uma grande probabilidade de que o investigado combine versões com antigos subordinados, o que me parece insuficiente. Os argumentos parecem mais se adequar a um pedido de prisão temporária que, no entanto, apenas se aplica a um rol taxativo de crimes”, diz Tatiana.

Lei instituída no chamado pacote anticrime, de 2019, diz que esse tipo de prisão deve ser fundamentada com “fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada”. A inclusão desse ponto foi interpretada naquela época como uma reação de congressistas à Operação Lava Jato, que para seus críticos banalizava o volume de ordens de prisão provisórias.

Para o presidente do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), Guilherme Carnelós, os argumentos da PF destacados na decisão de Moraes não são suficientes.

“A prisão preventiva é medida cautelar extrema em processo penal e só pode ser decretada com base em elementos concretos. O mero receio de que algo possa acontecer não é motivo para prender ninguém.”

Os especialistas afirmam que outras medidas alternativas poderiam ter sido decretadas, como a proibição do investigado de falar com outros agentes da PRF, sair de casa ou frequentar determinados lugares.

O professor de direito penal da UFMG e advogado criminalista Túlio Vianna diverge e considera que o fundamento da “conveniência da instrução criminal” é suficiente para decretar a prisão preventiva.

“O fato de o agente ser ex-diretor geral da PRF gera um fundado temor que ele possa influenciar no depoimento de testemunhas e esta é uma hipótese bem típica que justifica a prisão preventiva”, diz, citando que decisões do STF sobre prisão preventiva de policiais militares.

“Se isso vale para policiais militares, com muito maior razão deve valer para um ex-diretor geral da PRF.”

A defesa de Silvinei afirmou na quarta-feira que pediria a reconsideração da prisão “em tempo e modo”. Em depoimento no Congresso, em junho, ele negou ter agido de modo ilegal à frente da Polícia Rodoviária.

GÉSSICA BRANDINO / Folhapress

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