SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Governo de São Paulo concluiu nesta terça-feira (23), em uma cerimônia na B3, o processo de privatização da Sabesp, que se iniciou em fevereiro do ano passado a partir de um estudo de viabilidade pelo IFC (International Finance Corporation).
A finalização do processo com a liquidação da oferta feita no âmbito da privatização, na última segunda-feira (22), marca o início do novo contrato de concessão, assinado no dia 24 de maio, pela Urae-1 (Unidade Regional de Serviços de Abastecimento de Água Potável e Esgotamento Sanitário Sudeste).
Além do novo contrato, passa a valer também nesta terça a tarifa reduzida que havia sido anunciada. Inicialmente, o valor vai ficar 10% mais barato para as tarifas social e vulnerável (que englobam 1,3 milhão de pessoas), 1% mais baixo para a residencial e 0,5% para as demais categorias.
Durante o evento na B3 nesta manhã, a gestão Tarcísio de Freitas e empresários reforçaram em discursos o papel social da Sabesp e a continuidade do trabalho desenvolvido pela companhia de saneamento.
“É importante que, embora a Sabesp agora seja ainda do Estado, mas minoritária do Estado, ela continua sendo patrimônio de São Paulo”, disse o secretário de Parcerias em Investimentos, Rafael Benini.
“Vamos sempre estar à disposição da população para ajudar como a gente ajudou em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, com o nosso time, com nossos ativos, como nossa expertise. Esse é o espírito ‘Sabespiano’ e isso vai ser preservado, isso vai continuar”, afirmou o diretor-presidente da Sabesp, André Salcedo.
“Investidores olham a Sabesp não só para comprar e vender ações, mas para ter uma empresa de ainda mais qualidade e uma empresa que vai ser plataforma multinacional de saneamento. Esse é um projeto que vai alcançar pessoas”, disse a secretária Nátalia Resende, de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística.
“Podíamos ter escolhido diversas formas de fazer essa desestatização. E a Natália [Resende] disse: ‘escolhemos o caminho mais difícil’. Talvez, mas escolhemos o caminho mais consistente. Nós escolhemos o caminho que vai nos permitir deixar um legado”, disse o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, defendendo a escolha de um acionista de referência no processo, que se comprometa junto ao governo com seus objetivos.
Além da redução tarifária, um dos objetivos do governo com a privatização é a antecipação da universalização dos serviços de água e esgoto de São Paulo de 2033 para 2029. Para isso, a previsão é de investimento pela Sabesp de R$ 260 bilhões até 2060, sendo R$ 69 bilhões até 2029.
Com a desestatização, o governo estadual levantou R$ 14,77 bilhões, já que a ação vendida pelo Estado foi precificada em R$ 67 tanto pelo acionista de referência quanto pelo mercado. O valor é cerca de 20% inferior ao preço do papel da companhia atualmente, que encerrou a última sessão no patamar de R$ 87.
Em uma oferta sem concorrência para a escolha do investidor estratégico, a Equatorial Energia arrematou 15% dos papéis da companhia de saneamento de São Paulo.
Na semana passada, a companhia assinou acordo com o Estado paulista que prevê que a Equatorial não poderá vender as ações adquiridas na oferta pública até 31 de dezembro 2029, que é o tempo de conclusão do ciclo de universalização do saneamento pretendido pelo estado de São Paulo.
Outros 17% das ações detidas pelo Estado foram distribuídos em uma oferta pública, que contou com a participação de 17,9 mil pessoas físicas, que somaram R$ 1,5 bilhão. Entre os investidores institucionais, foram 290 fundos alocados, sendo 87% fundos de longo prazo e 50% fundos internacionais.
No total, foram vendidas 220.470.000 ações (que incluem 28.756.956 ações de lote suplementar).
Com a oferta, o Governo de São Paulo reduziu sua participação no capital social da Sabesp de 50,3% para 18%.
Sobre o valor precificado por ação, o governador Tarcísio de Freitas disse a jornalistas nesta terça que não se preocupa com as críticas de que o governo tenha aberto mão de uma quantia bilionária ao permitir que o preço de venda fosse abaixo da cotação do papel.
“É a maior ordem individual da história da ofertas públicas de ação, ou seja, um cheque de quase R$ 7 bilhões, para uma empresa que está pagando esse valor mas não tem o controle”, argumentou Freitas.
“O segundo ponto relevante é o lock-up [regra que exige que a empresa fique com as ações por um período]. É um lock-up de cinco anos. Então, era natural que tivesse um desconto em relação ao valor de tela no dia”, completou.
Ainda segundo Tarcísio, houve valorização da ação após a divulgação do acionista de referência, o que mostra que o mercado aceitou bem esse investidor estratégico. Ele questionou se o valor da ação não estaria menor ao que está hoje se o processo de privatização não passasse por essa escolha do acionista de referência.
PRÓXIMOS PASSOS
Para ser totalmente concluída a privatização, a compra da fatia de 15% pela Equatorial precisa de aprovação do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Depois disso, a nova gestão da Sabesp assumirá a empresa após a eleição do novo conselho de administração em assembleia geral dos acionistas.
Em conversa com jornalistas, Natália Resende disse que esse processo deve acontecer ainda neste ano, bem como a escolha do novo diretor-presidente da Sabesp e de outros diretores.
Pelas novas regras da privatização, o governo estadual deverá se abster de indicar o candidato a diretor-presidente, podendo apenas participar da votação para escolha do CEO, por meio de seus representantes no conselho de administração.
O novo conselho de administração após a privatização será composto de nove membros, sendo três indicados pelo Governo de São Paulo, três indicados pelo acionista de referência -que será uma espécie de parceiro do estado na Sabesp, com 15% da companhia- e três conselheiros independentes.
Pelo menos dois dos indicados pelo governo terão que ter experiência de no mínimo cinco anos no setor de utilidades (gás, saneamento e energia, por exemplo). Também ficou estabelecido que o presidente do conselho será indicado pelo investidor de referência.
Além disso, dentro da diretoria executiva, o diretor de Engenharia e Inovação e o diretor de Operação e Manutenção deverão ter pelo menos dez anos de experiência no setor de utilidades.
PROCESSO FOI CRITICADO
Ao longo do processo de privatização da Sabesp, tanto a desestatização em si quanto o modelo escolhido pelo governo foram alvos de críticas e controvérsias pelo mercado e pela população.
Em uma pesquisa Datafolha realizada no ano passado, a privatização foi rejeitada pela maior parcela dos moradores do estado de São Paulo. De acordo com o levantamento, 53% dos entrevistados disseram ser contra a transferência da empresa para a iniciativa privada, enquanto 40% eram a favor. A minoria (1%) declarou ser indiferente, e 6% não sabiam.
Além disso, especialistas criticaram as regras da privatização, argumentando que o formato escolhido para a oferta de ações privilegiava uma proposta com valor menor, não a maior -como costuma ser o critério para processos de desestatização.
Outra preocupação foi com uma cláusula que limitou a participação do acionista de referência da Sabesp em novos leilões de saneamento, diminuindo a concorrência.
Na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), a aprovação da privatização da Sabesp teve idas e vindas e foi palco de tensão, com manifestação violenta de sindicatos.
STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress