‘Procuradoria da democracia’ de Lula quer rede nacional e tenta driblar desconfiança

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Alvo de desconfiança desde que foi anunciada pelo advogado-geral da União, Jorge Messias, a PNDD (Procuradoria Nacional de Defesa da Democracia) passou o ano de 2023 com o objetivo de provar que atua coibindo desinformação, e não com patrulhamento ou censura, como temiam opositores.

Ao mesmo tempo, tenta articular a criação de uma “estratégia nacional em defesa da democracia”, com compartilhamento de informações com os estados e mesmo outros Poderes, como o Legislativo.

Segundo a procuradoria, a ideia “é criar uma rede de defesa da democracia” com essa troca de informações e a “celebração de parcerias e adoção de ações conjuntas”.

O órgão, um braço da AGU (Advocacia-Geral da União) da gestão Lula (PT), começou a funcionar em maio, com o objetivo de atender a demandas da União de resposta e enfrentamentos a informações falsas sobre políticas e agentes públicos.

A sua criação provocou críticas de que o governo atuaria para cercear opiniões. Acabou instalada em maio após receber sugestões de um grupo de trabalho que envolvia associações de jornalistas e de magistrados, advogados e acadêmicos.

Na prática, porém, a PNDD virou um setor no qual integrantes do governo ou de outros órgãos da União, como o Legislativo e tribunais, recorrem para acionar quem produz conteúdos que consideram ofensivos ou fraudulentos.

O órgão tenta filtrar essas solicitações. Em um levantamento sobre as requisições de atuação, de setembro, o órgão calculava que houve 50 pedidos. Desse total, 28 foram rejeitados, outros 10 estavam sob análise e apenas 12 tinham sido aceitos.

As justificativas para essas rejeições estão previstas na portaria que regulamentou o órgão, que aponta a necessidade de que seja demonstrado que a desinformação teve amplo alcance ou repercussão que prejudique a política ou o agente público.

“A rejeição dos pedidos ocorre quando não são cumpridos os requisitos de admissibilidade, tais como a indicação do interesse da União, a comprovação de dano efetivo ou de potencialidade de dano”, diz a AGU em nota à Folha.

“No caso de desinformações, [é requisito] que o conteúdo é intencionalmente disseminado com o objetivo de causar prejuízo ou obter vantagem indevida, bem como gerar prejuízo a política pública da União ou à legitimação da função pública.”

Na Justiça, foram apresentadas nove ações até o momento. Parte delas trata de questões relacionadas ao campo da saúde. Em uma delas, a PNDD obteve uma decisão da Justiça que retirou do ar postagens de um site que associa vacina à Aids.

Houve a apresentação de ações contra um usuário que fez uma publicação com informações falsas sobre supostos efeitos colaterais da vacina da Covid e, ainda, para derrubar canais do Telegram que vendem passaportes vacinais falsos.

Também foram acionadas pessoas que soltaram informações falsas sobre integrantes do governo.

Por exemplo, houve um processo contra um apresentador de TV que disse que o ministro Flávio Dino (Justiça e Segurança Pública) tinha relação com o crime organizado quando ele visitou o Complexo da Maré, no Rio de Janeiro.

Dino foi nomeado para o STF (Supremo Tribunal Federal) por Lula e será empossado em fevereiro.

A PNDD também apresentou ação para reivindicar a remoção de vídeo no qual um pastor pede para os fiéis orarem para “quebrar a mandíbula de Lula”. O caso foi rejeitado pela Justiça, e o órgão recorre.

A partir do relatório da CPI do 8 de janeiro, a PNDD também fez um pedido de ressarcimento de R$ 15 milhões a condenados por tentativa de atentado a bomba no aeroporto de Brasília.

Extrajudicialmente, a PNDD acabou priorizando pedidos de retiradas de conteúdos ofensivos contra autoridades públicas ou ainda de retratações por informações inverídicas. Foram quatro pedidos para retirada de conteúdo da internet. Três foram atendidos.

Um deles foi de um usuário do TikTok que disse que a Presidência da República determinou o fim da propriedade privada no país. Outro, de uma página de clube de tiros que postou Lula e o ministro Alexandre de Moraes, do STF, como alvos.

O Governo de São Paulo também removeu uma publicação da Secretaria de Segurança Pública com imagens de Lula em pacotes de drogas apreendidas. A PNDD afirma que havia “deslegitimação da função pública”.

Um quarto pedido não foi atendido pelo YouTube. Tratava de um canal que usava informações falsas sobre Moraes, sobre o comandante do Exército e sobre ministros do STM (Superior Tribunal Militar).

A Procuradoria decidiu não judiciar o caso porque o canal tem baixo alcance.

Houve, além disso, três solicitações extrajudiciais de direitos de resposta.

Uma delas foi direcionada para a Jovem Pan, por um apresentador ter dito uma informação inverídica de que o Ministério da Cultura pagaria R$ 20 milhões para levar artistas a show da cantora Beyoncé. Também foi solicitado direito de resposta à Revista Oeste, porque o jornalista Alexandre Garcia disse que o governo do PT provocou enchentes no Sul.

A partir de uma solicitação do ministro Silvio Almeida (Direitos Humanos), a PNDD também notificou os deputados Nikolas Ferreira (PL-MG) e Filipe Barros (PL-PR) para que houvesse resposta sobre a divulgação de informação falsa de que governo teria instituído banheiros unissex nas escolas brasileiras.

O caso não foi judicializado, e os deputados não concederam direito de resposta.

Segundo a PNDD, os pedidos de remoção ou direitos de resposta “são feitos quando o conteúdo disseminado causa prejuízo a políticas públicas da União ou, no caso de envolver integrantes do governo, quando afetam a própria legitimação da função pública exercida por tais integrantes”.

“Foi o que ocorreu, por exemplo, na ação em que a AGU moveu em face de apresentador que associou o ministro da Justiça, Flávio Dino, ao crime organizado”, diz o órgão.

“A PNDD apresentou na ação que o conteúdo associando o ministro à prática de ilícitos gravíssimos, em detrimento da segurança e do interesse da população, ofendeu não só a moral e a honra pessoal e subjetiva da autoridade, mas a própria função de ministro da Justiça, justamente a autoridade que, no âmbito do Poder Executivo Federal, é institucionalmente encarregada de administrar as políticas de combate ao crime organizado”, acrescentou.

JOSÉ MARQUES / Folhapress

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