Projeto de lei pelo fim das cotas na residência médica chega à Câmara com pressão do CFM

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um projeto de lei pelo fim das cotas em programas de residência médica chegou à Câmara dos Deputados. O PL 3.584/2024, assinado pelo deputado Zacharias Calil (União Brasil), está na Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência desde a última terça (12) e deve ter seu relator definido nesta semana.

Segundo o texto, fica vedada a aplicação de cotas raciais, socioeconômicas ou de qualquer outra natureza em processos seletivos para residência médica ou qualquer outra forma de especialização médica.

“A presente proposição tem como objetivo garantir que os processos seletivos dependam de forma justa e meritocrática”, explica o autor.

Calil é um renomado cirurgião e muito próximo à direção do CFM (Conselho Federal de Medicina), que começou uma campanha pelo fim das cotas em programas de residência.

No dia 9 de novembro, a Justiça do Distrito Federal negou um pedido do conselho contra a reserva de 30% das vagas para pessoas com deficiência, pretos, pardos, indígenas e quilombolas no Enare (Exame Nacional de Residência), forma de ingresso em alguns dos programas de residência mais importantes do país.

O CFM argumenta que a política cria “discriminação reversa” e fomenta a ideia de “vantagens injustificáveis” na classe médica. Ele defende que a seleção para residência seja baseada somente no mérito acadêmico.

Para a 3ª Vara Cível de Brasília, a entidade não tem legitimidade para questionar a política, uma vez que ação afirmativa é inofensiva para o exercício da medicina. O conselho federal poderia recorrer da decisão, mas não quis, e membros da organização adiantaram à Folha de S.Paulo que trabalhariam pela aprovação de um projeto de lei proibindo as cotas. Dois dias depois, o texto chegou à Câmara.

Vários parlamentares de direita já abraçam a pauta, e sua tramitação na Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência pode facilitar um avanço. Dos 19 titulares, 15 são de partidos de centro-direita.

O Enare é aplicado pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, estatal ligada ao MEC (Ministério da Educação). A prova foi aplicada no dia 20 de outubro em 60 cidades, oferecendo 4.854 vagas de residência médica em 163 instituições de todo o país.

Desde o processo seletivo de 2023, o exame incluía a reserva de 10% das vagas para pessoas com deficiência. A partir deste ano, passou a contar também com cota para pessoas que se autodeclaram pretas e pardas, indígenas e quilombolas –20% das oportunidades.

Procurada, a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares diz que as cotas não implicam privilégio ou quebra da isonomia, como argumenta o conselho federal, mas são instrumentos de equidade para promover reparação histórica e corrigir desigualdades estruturais.

“A existência de políticas de cotas no ingresso às universidades públicas, por si só, não elimina as profundas desigualdades sociais que ainda afetam o acesso às especialidades médicas”, afirma a entidade. “Tendo em vista que muitos estudantes ainda enfrentam barreiras adicionais ao tentarem ingressar nos programas de residência, onde há uma acirrada competição e altos custos associados à preparação para exames específicos.”

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BRUNO LUCCA / Folhapress

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