SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Não compre. Resgate.” Este é o slogan de um projeto batizado de Atacama Re-Commerce e que pretende enviar para todo o mundo peças de roupas hoje acumuladas no deserto do Atacama, no norte do Chile. Quem se interessar por alguma das peças paga apenas o frete para retirar a roupa do deserto.
Lançado na última segunda-feira, o projeto tem uma equipe que faz a curadoria dos itens, o que garante que estejam em boas condições para revenda. Cada peça é então higienizada, organizada e disponibilizada na plataforma digital.
A primeira leva de roupas foi toda adquirida em apenas cinco horas por pessoas de países como Brasil, França, Reino Unido e China. Outras duas toneladas de roupas já foram higienizadas e devem entrar no site em breve.
Faz anos que parte do deserto chileno foi convertido em um cemitério de lixo têxtil composto pelo descarte sistemático tanto de roupas pós-consumo, ou seja, já usadas, como também de encalhes das mais de 50 coleções que as marcas de fast fashion produzem por ano.
O fenômeno é consequência do modelo de produção acelerado da indústria da moda. Hoje, são produzidas globalmente cerca de 100 bilhões de peças de vestuário por ano o dobro em relação ao ano 2000. São 12 peças anuais por pessoa. Ou mais de 3.000 peças por segundo.
Tamanha escala de produção gerou custos mais baixos, o que mudou a relação das pessoas com suas roupas, muitas das quais são consideradas como se fossem quase descartáveis. Cada peça de roupa hoje é usada menos vezes do que 15 anos atrás e vai para descarte mais rápido, depois de apenas sete ou oito usos, segundo dados da consultoria McKinsey.
Com isso, o descarte de tecidos escalou, gerando desperdícios e danos ambientais e à saúde, já que 80% dos resíduos têxteis são incinerados, aterrados ou vão parar em lixões e no meio ambiente, segundo dados da Fundação Ellen MacArthur, ONG internacional dedicada à promoção da economia circular.
Estima-se que cerca de 39 mil toneladas de peças sejam despejadas na região anualmente. As montanhas de roupas que tomaram o cenário do deserto chileno viraram um problema ambiental. O projeto Atacama Re-Commerce quer transformar esse desperdício e os problemas que ele gera em oportunidade de dar uma segunda vida a essas peças, muitas delas de marcas renomadas como Calvin Kein, Nike, Zara e Adidas.
O projeto foi criado pela empresa de e-commerce VTEX, responsável pela plataforma digital do Re-Commerce, em parceria institucional com a Fashion Revolution, organização brasileira ligada ao ativismo da moda, e a Desierto Vestido, organização sem fins lucrativos dedicada a educar, conscientizar e incentivar a economia circular na indústria têxtil.
“Nossa missão é resgatar esses itens e dar a eles uma nova chance, promovendo um processo de conscientização sobre o consumismo exacerbado promovido pela indústria da moda atualmente”, afirma Mariano Gomide de Faria, CEO da VTEX.
“Nossa iniciativa convida à reflexão sobre os impactos do nosso atual modelo de produção, consumo e descarte desenfreado”, afirma Fernanda Simon, diretora executiva da Fashion Revolution Brasil. “Estamos vivendo uma emergência climática, e a indústria da moda precisa de compromissos mais robustos. Esta ação é uma forma de chamar atenção para o que está por trás das roupas e provocar novas formas de se relacionar com elas.”
FERNANDA MENA / Folhapress