SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As regras impostas nos últimos anos para tentar atenuar as desigualdades na política brasileira tiveram pouco impacto na diversidade dos legislativos municipais eleitos no domingo (6) pelo país.
Dos quase 58.422 candidatos escolhidos para o cargo de vereador, 46% se declaram pretos ou pardos, e apenas 18% são mulheres, um crescimento de apenas 1 e 2 pontos percentuais, respectivamente em relação ao pleito de 2020.
Há quatro anos, os negros somavam 45% dos eleitos e, em 2016, eram 42%. Os brancos ainda ocupam 53% do total de cadeiras, um ponto a menos do que no pleito passado, e amarelos e indígenas são 0,4% cada grupo percentual que também variou pouco em relação à última eleição.
A divisão não reflete a população do país, na qual pretos e pardos somam 56%, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Os dois grupos foram também 53% dos candidatos que tentaram uma vaga em 2024.
Existem 260 municípios em que negros são 100% da Casa. Dentre as cidades em que eles ocupam a maioria das cadeiras, a maioria se localiza no Nordeste e possui menos de 73 mil eleitores, como é o caso de Central (BA) e Araguanã (MA).
Na contramão, 626 municípios não terão nenhum vereador autodeclarado preto ou pardo em 2025, o equivalente a 11% do total. Quando levado em conta também o gênero, o fosso da desigualdade fica ainda mais profundo: as mulheres pretas ou pardas são apenas 8% dentro dos 47% negros que conquistaram uma vaga.
No total, o número de mulheres eleitas para os legislativos municipais no país subiu de 16% para 18% das cadeiras disponíveis, em comparação a 2020. Em números absolutos, são 10.644 vereadoras e 47.750 vereadores a ocupar uma cadeira.
A parcela fica longe da proporção de candidatas para esta eleição que era de 35% e ainda mais distante quando levada em conta a proporção de 51,5% de mulheres na população geral do país.
Apesar de todos os municípios do país terem registrado candidatas, 13% (738) não tiveram nenhuma eleita. Entre eles, estão Mauá (SP), Nova Iguaçu (RJ), Palhoça (SC) Sumaré (SP), e Suzano (SP), que não terão nenhuma vereadora a partir do ano que vem.
Na contramão do que acontece nessas cidades, a Câmara Municipal de São Paulo, a maior do país, será mais diversa e contará com mais mulheres e negros na legislatura que começa em 2025, se comparada com a que iniciou em 2021.
Pesquisa Datafolha realizada em julho mostrou que mais de 60% dos eleitores consideravam insuficientes os números de vereadores mulheres e negros em São Paulo, Rio, Belo Horizonte e Recife. Ao mesmo tempo, cerca de 8 em cada 10 responderam na ocasião que o gênero e a cor de um candidato não faria diferença na hora de escolher um prefeito nestas eleições.
Em 2020, decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) obrigou os partidos a dividir seu bilionário fundo eleitoral e seu tempo de propaganda de maneira proporcional ao número de candidatos negros e brancos. Na disputa de 2022, por exemplo, pretos e pardos deveriam ter recebido 50% de R$ 5 bilhões.
Mas a determinação foi descumprida generalizadamente pelos partidos, que se articularam para aprovar a chamada PEC da Anistia em agosto deste ano, em um plenário esvaziado. O texto que acabou sendo votado reduziu as cotas financeiras para negros para 30%, percentual já válido nas eleições deste ano.
Também perdoou os débitos dos partidos que não cumpriram o valor mínimo nas eleições passadas e determinou que esses recursos sejam investidos em candidaturas de negros nas quatro eleições a serem realizadas a partir de 2026.
O texto final da PEC acabou não tratando do caso das mulheres, portanto permanece a determinação de que elas devem ser 30% das candidatas e receber os recursos de campanha de maneira proporcional à sua presença.
Para o cientista político e professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia) Cloves Oliveira, o grande funil que limita o aumento de candidatos negros e mulheres nas casas legislativas deve-se ao fato de que “as variáveis gênero e raça precisam hoje rivalizar com a variável política ideológica partidária”.
Mesmo diante do aumento estatístico pequeno na proporção de negros e mulheres nas casas legislativas nesta eleição, Oliveira avalia que isso não inviabiliza e mostra a “necessidade da politização das discussões de gênero e de raça” na disputa pelas Câmaras.
“É uma política de presença. Cada indivíduo eleito desses grupos muda a simbologia desses quadros.”
ALINE MAZZO, NATÁLIA SANTOS E GÉSSICA BRANDINO / Folhapress