SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O PT viu seu protagonismo junto a eleitores de baixa renda na cidade de São Paulo diminuir desde 2012. No mesmo período, a votação em vereadores do PSOL, MDB, União Brasil e PL nessa parcela da população avançou.
A Folha de S.Paulo analisou os votos que candidatos e legendas receberam à Câmara Municipal desde 2012 em todos os locais de votação divulgados pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Depois, cruzou os dados de renda dos 18.953 setores censitários da cidade disponibilizados no Censo de 2010, conforme a distância em relação aos locais de votação.
A partir do cruzamento, as áreas foram divididas em três grupos de renda com a mesma quantidade de setores censitários. De acordo com o IBGE, o rendimento médio para cidade de São Paulo era de R$ 3.289, em valores corrigidos.
Como de baixa renda foram considerados os setores com rendimento médio mensal de até R$ 1.407 por pessoa, em valores também corrigidos pela inflação.
Enquanto em 2012 o PT detinha, em média, 29,1% dos votos válidos para vereadores nessas áreas, nas eleições de outubro deste ano o partido chegou a 18,3%, queda de quase 11 pontos percentuais.
A redução mais acentuada na média de votação do PT aconteceu de 2012 para 2016, quando houve redução de sete pontos percentuais na estimativa de votos, chegando a 21,9%. De 2016 a 2020, o partido perdeu outros quatro pontos, chegando a 17,5%. Nas eleições deste ano, houve aumento de quase um ponto percentual, interrompendo a trajetória de queda do partido.
Se em 2012 o PT conseguiu eleger o então ex-ministro da Educação Fernando Haddad prefeito de São Paulo, com o então ex-presidente Lula como cabo eleitoral, nos anos seguintes o partido entraria em um período de crise.
Em junho de 2013, protestos contra a classe política fomentaram a criação de grupos de direita que anos mais tarde se engajariam em atos pelo impeachment de Dilma Rousseff em 2016.
O cientista político e professor da FGV Easp Cláudio Couto destaca que em 2016 o perfil de escolha do eleitorado mudou e isso afetou o PT no país inteiro. Em São Paulo, Haddad perdeu a disputa pela reeleição ainda no primeiro turno para João Doria.
“O desgaste do partido fica muito claro ali. O PT não conseguiu ainda se recuperar do baque de 2016. Quando você pensa na esquerda como todo, ela piorou de lá para cá”, diz.
A diminuição dos votos recebidos por candidatos do PT à Câmara Municipal aconteceu em 92,6% dos setores censitários da cidade de São Paulo, mas foi mais acentuada nos 6.121 de menor renda: em 97,4% deles a votação do partido caiu.
No distrito de Lajeado, na zona leste, onde 87% dos setores estão entre os mais pobres, a média de votos por setor no PT caiu pela metade, passando de 37% em 2012 para 18% em 2024.
Apesar do cenário, os 18,3% de média mantêm a legenda como aquela que detém a maior fatia de votos na camada de menor renda nestas eleições, puxando a representação da esquerda. O mesmo se repete na parcela com renda média (média de renda entre R$ 1.407 e R$ 2.726), em que o PT tem 12,8% dos votos.
Apenas na parcela com rendas mais altas (média acima de R$ 2.726), o PT, com 9,6%, não lidera, ficando atrás do PSOL, com 13,7%, do PL, com 11,2%, e do União Brasil, com 10%.
O partido de Guilherme Boulos cresceu em todas as faixas, especialmente na de alta renda (11 pontos percentuais desde 2012). Nos setores mais pobres, o partido foi de 2,2% de média de votos válidos para 8,2%, crescimento de seis pontos percentuais no período, o que para Couto (FGV) pode indicar uma migração de votos de eleitores do PT.
O cientista político acrescenta que o discurso que aproximava o PT do eleitorado de baixa renda não tem o mesmo efeito por causa de transformações no mercado de trabalho, com o crescimento da informalidade, e do avanço do conservadorismo, com o aumento de igrejas evangélicas nos bairros mais pobres.
Como exemplo dessa desconexão, ele cita o discurso do ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, de que o fim da escala 6×1, tema de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) apresentada pela deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), deveria ser negociado por meio de convenções e acordos coletivos, em um contexto em que sindicatos não têm o mesmo peso.
Em termos de ideologia, com base na classificação feita a partir do GPS Partidário da Folha de S.Paulo com comportamentos referentes a 2024, o eleitorado de baixa renda na cidade está dividido. Há uma ligeira vantagem da direita, com 33,7%, ante 32,7% da esquerda e 33,6% do centro. Desde 2012, a esquerda caiu 12 pontos percentuais, o centro cresceu 13 pontos e a direita diminuiu pouco menos de um ponto percentual.
No centro, o maior avanço foi do MDB. Anhanguera, que tem mais da metade dos setores entre os mais pobres da cidade (65%), foi o distrito com votação mais expressiva para o partido (40%) nestas eleições, puxado pela votação de Fabio Riva.
Na direita, o União Brasil também cresceu, enquanto o PSDB perdeu o eleitorado, que foi de 11% para menos de 1%.
O distrito mais populoso onde o União Brasil teve votação mais expressiva em 2024 foi Parelheiros, quinto distrito com mais setores entre os mais pobres (83%). O partido teve 26% dos votos no local.
Para Couto, esse crescimento está ligado ao grupo político que estava no poder na cidade, com o MDB na prefeitura com Ricardo Nunes e o União Brasil na Câmara Municipal, com Milton Leite.
“Milton Leite é uma figura influente dentro do governo e o União Brasil conseguiu carregar recursos para sua base eleitoral mais do que partidos que não estão tão alinhados ao governo”, afirmou.
Couto afirma que apesar de o voto para vereadores ser mais pragmático, considerando se o político ou partido trouxe benefícios para o distrito, a rejeição a uma ideologia também tem peso.
“Há uma combinação dessas duas coisas. A gente pode considerar a ideologia no sentido mais negativo: ‘Eu fiquei mais conservador e me recuso a votar na esquerda’. A rejeição ao PT, que cresceu a partir de 2016, é um fator que também pode pesar.”
DANIEL MARIANI, GÉSSICA BRANDINO E NICHOLAS PRETTO / Folhapress