PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – Quatro anos após a morte de João Alberto Silveira Freitas, homem negro assassinado por seguranças em uma unidade do supermercado Carrefour em Porto Alegre, nenhum dos seis indiciados pelo crime foi condenado. A Justiça gaúcha também negou, neste ano, a hipótese de motivação racial.
O Ministério Público classificou o crime como qualificado por racismo, posição que também foi defendida pela Polícia Civil. No entanto, no dia 19 de julho deste ano, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul rejeitou essa qualificadora. A Promotoria recorreu da decisão, e a ação seguirá para apreciação do STJ (Superior Tribunal de Justiça).
O episódio aconteceu no dia 19 de novembro de 2020, um dia antes do Dia da Consciência Negra, e foi estopim de uma série de protestos contra o racismo nos dias seguintes no Brasil.
Na noite da morte, Beto Freitas, como era conhecido por amigos, foi levado por seguranças terceirizados para fora do supermercado após um desentendimento no caixa.
No estacionamento da loja, na zona norte da capital gaúcha, foi espancado e asfixiado por seguranças. O ato foi filmado e presenciado por cerca de 15 testemunhas.
A certidão de óbito de Freitas, que tinha 40 anos, apontou asfixia por sufocação indireta, decorrente de uma compressão no tórax, como a causa da morte.
Os seis réus pelo assassinato aguardam a definição da data para o júri popular, determinado pela justiça em dezembro de 2023.
Entre os indiciados estão os seguranças Magno Braz Borges e Giovane Gaspar da Silva, que foram gravados agredindo a vítima, e a fiscal Adriana Alves Dutra, que presenciou a ação e é suspeita de intimidar uma pessoa que gravava o ataque.
Os três estão presos preventivamente. Adriana cumpre prisão domiciliar, por motivos de saúde. Segundo a Justiça gaúcha, ela teria coordenado o ataque.
A defesa de Magno alega que não houve dolo na ação. Já os advogados de Giovane argumentam que ele agiu em legítima defesa e que Beto teria iniciado o conflito. Entretanto, as versões foram refutadas pela juíza Lourdes Helena Pacheco da Silva, da 2ª Vara do Júri do Foro Central da Comarca de Porto Alegre.
A defesa de Adriana pediu absolvição e disse que a ré não tinha posição hierárquica, o que também foi negado pela juíza.
Respondem em liberdade pelo crime o segurança Paulo Francisco da Silva, que é suspeito de ter impedido a aproximação da esposa da vítima para conter a violência, e os funcionários Kleiton Silva Santos e Rafael Rezende, que teriam se unido aos seguranças durante a agressão.
A defesa de Paulo diz que ele estava ausente no momento do crime. Já a defesa de Kleiton diz que ele foi induzido a erro por terceiros –no caso, a fiscal Adriana. Os dois, além de Rafael, pediram que o caso não fosse a júri, sem sucesso.
Com a retirada da qualificadora de racismo, uma das pautas das defesas dos réus, os seis acusados responderão pela acusação de homicídio duplamente qualificado, por meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima.
O assassinato ocorreu meses depois da morte do americano George Floyd em junho de 2020, que desencadeou protestos nos Estados Unidos e pautou discussões sobre racismo dentro de instituições de segurança.
No ano seguinte ao assassinato de Beto Freitas, o Carrefour fechou um acordo de R$ 115 milhões com instituições de justiça, com o valor destinado a ações de combate ao racismo. A assinatura do TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) impede que o Carrefour seja acionado judicialmente em relação ao caso.
A rede também implementou políticas internas, como uma cláusula de tolerância zero contra racismo em contratos com fornecedores e prestadores de serviços.
CARLOS VILLELA / Folhapress