SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) inicia o ano de 2025 com desafios justamente na área que fez o fez ascender na política, a trabalhista.
O MTE (Ministério do Trabalho e Emprego), liderado por Luiz Marinho -ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC assim como Lula-, tentará destravar pautas que avançaram em 2023, mas ficaram estagnadas no ano passado e esperam desfecho.
Dentre os assuntos está o projeto de lei complementar 12, que regulamenta o trabalho de motoristas de aplicativos de passageiros.
Há ainda a portaria sobre a negociação para atividade em feriados no comércio, cujo início de validade foi adiada para julho, e a definição de regra para se opor à contribuição assistencial de sindicatos após o STF (Supremo Tribunal Federal) julgar constitucional a cobrança da taxa negocial.
O relatório do PLP 12 está pronto desde julho. O texto mantém a categoria de motorista de aplicativo de transporte de passageiros como nova profissão, autônoma e sem vínculo pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), como o MTE havia proposto após dez meses de reuniões entre governo, empresas e trabalhadores em 2023.
O projeto foi enviado ao Congresso em fevereiro de 2024 e prevê alíquota de contribuição ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) em 7,5% sobre parte dos rendimentos, remuneração mínima com base no salário mínimo e direito à sindicalização. As empresas também pagarão contribuição à Previdência.
O tema está em debate no STF, que aguarda para julgar ação sobre o trabalho em aplicativos. A tendência é que os ministros entendam ser uma atividade autônoma.
O deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE), relator, propõe mudança nas alíquotas. Motoristas pagariam 5% sobre parte dos rendimentos -que correspondem a 25% da renda- e as empresas deveriam contribuir com 22%, ante os 20% anteriores.
Coutinho diz que chegou a esse percentual após reuniões com trabalhadores, representantes do setor, do MTE e da bancada dos aplicativos na Câmara. O relatório está pronto, mas pode ter ajustes. “Em tese, é a versão final, mas é um relatório que pode ser ajustado”, afirma.
De acordo com o parlamentar, não foi possível colocar o documento em votação porque o governo ainda não tem votos suficientes, mas a intenção é voltar a discutir a medida a partir de 1º de fevereiro.
Ele afirma que os motoristas querem pagar 5% de contribuição, porque querem ter o mesmo percentual do MEI (microempreendedor individual), mas diz entender que o regime especial de MEI não caberia neste caso.
“Não tenho qualquer problema em ajustar o relatório se for para a aprovação. Mas sobre aceitar ou não, não tem que aceitar. Ser for lei e for aprovado, têm que pagar”, diz ele sobre as empresas terem que custear um percentual maior para que motoristas paguem menos.
Não há acordo quanto a este ponto. “Não está acordado, não. Eles [aplicativos], inclusive, estão chiando muito.”
O deputado defende a regulamentação da categoria. “Eu tenho convicção de que hoje não existe no Brasil categoria que tenha os mesmos benefícios que a gente está colocando para motoristas de aplicativo.”
A Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), que representa as empresas do setor, discorda de algumas alterações propostas pelo relator e diz que elas podem deixar a atividade mais onerosa.
“Foi motivo de preocupação a inclusão de temas que não foram objeto de discussão no grupo de trabalho”, afirma nota enviada à reportagem.
Os apps dizem ser positiva a “discussão de uma regulação do trabalho em plataformas”, mas falam em ressalvas ao relatório.
“O último texto impõe um controle de preços dos serviços prestados pelas plataformas, o que, além de inconstitucional, levaria a um aumento de custos para o consumidor -abrindo um precedente negativo também para outras atividades econômicas”, diz nota.
Outra mudança que atende à categoria é a não limitação da quantidade de horas de trabalho, que seria de 12 horas por dia. “Não vamos limitar. A gente diz que ele tem de ter o tempo de descanso, mas esse tempo pode ser intercalado.”
O MID (Movimento Inovação Digital), que representa empresas como o Rappi, no setor de delivery, diz que é “necessário criar uma forma de incluir os motoristas de app na Previdência Social”, mas afirma que a forma da cobrança do tributo “gera uma discriminação tributária de mercado ao penalizar as empresas que cobram taxas de intermediação mais baixas e beneficiar as que possuem comissões mais altas”.
A associação afirma que, mesmo com os debates promovidos pela Câmara, não foi possível consenso, o que ainda deixará os motoristas de delivery de fora do projeto do governo.
Os motivos seriam “dificuldade de entender o novo mundo do trabalho” e “não observar a diversidade de modelos de negócio existentes na economia digital”.
“Acreditamos que em 2025 esse tema vai continuar na pauta da discussão pública, tanto pelo PLP 12/2024, quanto pelas diversas ações que estão tramitando no STF. É importante para todos que se consiga uma regulação que dê segurança jurídica, estabilidade e coloque o Brasil num caminho de desenvolvimento de tecnologia”, diz nota enviada à reportagem.
TRABALHO AOS FERIADOS E TAXA NEGOCIAL
O trabalho aos feriados é outro tema que enfrenta oposição.
Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo e da UGT (União Geral dos Trabalhadores), diz entender a intenção do ministro Luiz Marinho ao privilegiar a negociação coletiva ante acordos individuais sobre os feriados, mas afirma que não era necessário.
Marinho revogou portaria do governo de Jair Bolsonaro (PL), que dava mais autonomia para empresas definirem suas escalas de trabalho, mas sem negociar compensações aos funcionários.
No caso da taxa negocial, a contribuição foi aprovada pelo STF após a reforma trabalhista acabar com o imposto obrigatório. O que não ficou claro é como o trabalhador pode ser opor a ela, já que o Supremo também garantiu esse direito.
Para Patah, o governo tem privilegiado o consenso, por isso demora-se mais a se chegar a um desfecho.
“Na minha visão enquanto presidente dos Comerciários de SP, um dos maiores do Brasil, estamos valorizando a negociação.”
Segundo ele, a taxa negocial é necessária para que os sindicatos continuem atendendo seus sindicalizados. No Sindicato dos Comerciários, há cobrança de 1% ao mês, com direito de oposição.
“Nós nos adequamos bem, conseguimos manter os benefícios e outros direitos violados em muitas empresas”, diz ele sobre a entidade, que mantém dois prédios na capital paulista, com cursos de capacitação, assistência médica e outros benefícios.
CRISTIANE GERCINA / Folhapress